por Marcelo Seabra
Chega esta semana aos cinemas do país um dos filmes mais aguardados do verão americano: nada menos que O Espetacular Homem-Aranha (The Amazing Spider-Man, 2012). Como muito já havia sido contado na elogiada trilogia de Sam Raimi, percebe-se aqui uma necessidade de fazer diferente. Fãs mais xiitas do personagem podem estranhar algumas novidades, como a ausência da famosa frase “Com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades”, apesar de a ideia estar lá. Mas há aspectos mais fiéis à mitologia consolidada, começando pelo par romântico do herói. Para quem não é profundo conhecedor de quadrinhos, basta encostar-se na poltrona e apreciar mais de duas horas de boa aventura e efeitos em 3D com o “amigo da vizinhança”.
Apenas uma década depois do primeiro e cinco anos após o terceiro filme, a saga do Homem-Aranha é reiniciada. Muita gente achava isso prematuro e desnecessário, mas o estúdio não via outra saída, já que elenco e equipe técnica haviam debandado. Se o que melhor funcionava era o romance entre os protagonistas, “vamos chamar alguém que entenda disso”. Marc Webb, que conta apenas com o bonitinho (500) Dias com Ela ((500) Days of Summer, 2009) no currículo, foi o escolhido. Para assessorá-lo, foram designados bons profissionais, como o do diretor de fotografia John Schwartzman (indicado ao Oscar por Seabiscuit, de 2003), além de um sem-número de técnicos e especialistas em outras áreas, como cenários, som, dublês, efeitos especiais, figurinos etc. Todos chefiados por um seleto grupo de produtores que inclui o ex-presidente dos estúdios Marvel, Avi Arad, e o co-criador do Aranha, Stan Lee (que tem a sua ponta, como de costume), além da falecida Laura Ziskin. Assim, até o 3D funciona, criando belas imagens com Nova York ao fundo, mesmo que desnecessário.
A escolha dos atores não foi menos inspirada. Era uma aposta arriscada colocar um sujeito de 29 anos, que cresceu na Inglaterra, para viver o herói adolescente americano. Andrew Garfield chamou a atenção do grande público em A Rede Social (The Social Network, 2010), mas realmente mostrou a que veio nos três policiais Red Riding (2009) e no drama Não Me Abandone Jamais (Never Let Me Go, 2010). Garfield tira de letra a tarefa – sem o seu sotaque usual – e dá ao Cabeça de Teia a dimensão certa, aquele ar sincero de nerd que passou a vida apanhando dos valentões, além de sempre remoer o sumiço nunca explicado dos pais (mistério que não cansa como o drama psicológico do Hulk de 2003).
Em meio ao lamentável dia a dia de um coitado em idade estudantil, Peter Parker passa a ser notado pela bela Gwen Stacy, vivida pela igualmente competente Emma Stone (de Histórias Cruzadas, 2011). Apesar de muito bonita, a atriz tem um ar de menina desengonçada que nos faz acreditar que ela realmente olharia para Parker. E os dois juntos funcionam muito bem, a química é palpável. Com a história de Peter e Gwen deslanchando, a ação acaba ficando em segundo plano – isso, até aparecer o Dr. Curt Connors. Rhys Ifans sempre será lembrado como o colega esquisito de Hugh Grant em Notting Hill (1999), além do vilão do idiota Little Nicky (2000), mas fica aqui com uma boa e adequada dose de caricatura. Para quem tem uma pequena ideia do que acontece nos quadrinhos, já se sabe que destino aguarda o doutor, que sempre repete que quer “melhorar a raça humana, acabando com suas fraquezas”. O efeito da criatura não é dos melhores, mas funciona bem, melhor que o Power Ranger verde do primeiro filme de Raimi.
É curioso perceber que as histórias do Homem-Aranha (ao menos, as contadas no cinema) giram em torno da ciência e de cientistas muito inteligentes, já que ele mesmo veio daí. Depois de Norman Osborn (o Duende Verde), Dr. Octopus, Venom (que vem do espaço com a NASA) e seja lá quem criou o mecanismo que transforma o Homem-Areia, chega o Dr. Connors (ao lado). Sempre deve haver alguém à altura de Peter, e essa pessoa deve ser de alguma forma fisicamente modificada, sendo párea de duas formas. A inteligência do jovem fica bem mais explícita aqui do que nos outros longas, assim como o fato de ele ainda ser um adolescente – várias cenas do filme se passam na escola. O lançador de teias, fantástica criação dele, não causa tanto estranhamento, já que é na verdade uma ideia adaptada.
Apesar de um pouco longo (137 minutos), O Espetacular Homem-Aranha não chega a cansar. A história, de James Vanderbilt (do ótimo Zodíaco, de 2007), precisa de tempo para se desenvolver, e há períodos mais lentos. Os tios (vividos pelos veteranos Martin Sheen e Sally Field – ao lado) são mais novos que os vistos anteriormente, e isso faz sentido porque também acontece com Peter. Denis Leary, da série Rescue Me (2004-2011), é um bom Capitão Stacy, correto e durão. Ainda não temos o Clarim e J.J. Jameson, mas Peter já tira suas fotos. Resumindo: todas as características marcantes dos quadrinhos estão lá, até o humor inusitado do Aranha em momentos impróprios.
Levar aos cinemas um herói como o Homem-Aranha é sempre uma jogada certa para os estúdios envolvidos, garantia de retorno financeiro, o que agilizou esse recomeço de história. Pode ser que o mesmo aconteça com Batman quando Christian Bale e companhia aposentarem a capa. Mas acabou não sendo um caça-níqueis sem graça ou alma, como poderia se esperar. Webb garante a emoção nos momentos certos sem deixar a peteca cair nas cenas de ação. E a dupla Garfield e Emma ainda será muito aguardada. Pontas soltas para uma sequência não faltam.