por Marcelo Seabra
No verão de 1976, nada menos que 36 bombas explodiram na região central de Cleveland, Ohio. Isso dá uma ideia de como andava a disputa entre as facções da máfia local. E um homem sobreviveu a vários ataques, alimentando uma aura de imortal, indestrutível. Ele chega a ser admirado até por crianças, que querem ser duronas como ele. Apesar de cair naquele velho erro de criar um protagonista charmoso e heróico, quando na verdade ele era um homicida bem menos encantador, O Mafioso (Kill the Irishman, 2011) é bem satisfatório.
Irreconhecível no papel título, Ray Stevenson, o Justiceiro do segundo filme do anti-herói (Zona de Guerra, de 2008), vive Danny Green, um irlandês que acredita ter sangue dos guerreiros celtas e atribui a isso ter conseguido escapar da morte tantas vezes. O filme apresenta Green jovem, antes de começar sua carreira como líder sindical, posição que ele alcança tirando à força o então responsável. Ele fez o que julgava necessário, e isso virou hábito. Violência passa a ser uma constante na vida de Green, que mantém a mulher e filhos de um lado e a máfia de Cleveland do outro. Aqui e ali, eles se encontram, o que acaba afastando sua família.
Como a ação se desenrola na década de 70, a ambientação do longa chega a lembrar grandes trabalhos de grandes mestres, como Os Bons Companheiros (Goodfellas, de 1990), de Martin Scorsese, ou Serpico (1973), de Sidney Lumet. O Mafioso se mantém um primo distante, menor. É bom, não ótimo, e consegue prender a atenção com boas atuações, além da narração adequada de Val Kilmer (ao lado), ator que trabalha muito e anda pouco visto. Ele vive um policial que conhece Green desde pequeno, mas a relação dos dois nunca é realmente desenvolvida, ela não passa de alguns contatos furtivos.
Entre os rostos conhecidos que passam pelas telas, Vincent D’Onofrio (da série Law & Order: Criminal Intent) fica com o papel de maior destaque, como um mafioso amigo de Green. Christopher Walken (de A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça, de 1999), Linda Cardellini (de Scooby-Doo, de 2002), Fionnula Flanagan (de Os Outros, de 2001), Vinnie Jones (de X-Men 3, de 2006) e Paul Sorvino (de Os Bons Companheiros) são os principais nomes, e o elenco conta ainda com diversos atores ítalo-americanos que parecem ter saído direto de A Família Soprano.
O prolífico roteirista Jonathan Hensleigh, que estreou como diretor com O Justiceiro (The Punisher, de 2004), exerce aqui as duas funções. Ele demonstra estar no caminho certo e entrega um filme correto, nada inovador. Baseando-se no livro de um ex-chefe de polícia de Ohio, Rick Porrello, a obra torna-se um pouco episódica, pulando de um evento considerado importante para outro, mas nem por isso deixa de ser curiosa e divertida.
Estranha mesmo é a crise de identidade pela qual o filme passa: sempre mencionado como Kill the Irishman (nome do livro de Porrello), que seria em português “Mate o Irlandês”, o que vemos no início da exibição é Bulletproof Gangster, ou “O Mafioso à Prova de Balas”. Qualquer um dos dois títulos teria sido mais interessante que o insosso O Mafioso. Seria mais um diferencial, em meio a tantas opções nas prateleiras das locadoras.