“Olá, Dr. Douglas, gosto muito do seu blog e resolvi enviar minha pergunta. Tenho 38 anos e a impressão que tenho é a de que sou uma boba. Sempre faço consentimentos a todos que estão ao meu redor. Consequentemente, acabo passando por cima de mim mesma, com frequência. Estou constantemente dizendo sim para as pessoas, mesmo nos momentos em que eu não poderia ou não gostaria de dizer. Só me dei mal por agir assim até hoje. Portanto, o que eu quero saber é: por que muitas pessoas têm dificuldade em dizer não? E o que devo mudar pra conseguir fazê-lo? Um abraço, obrigada e parabéns por sua coluna. Leio todos os dias”!
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Resposta:
Querida leitora, essa é uma questão mais frequente do que você imagina. Muitas pessoas chegam ao meu consultório com esse tipo de demanda. Geralmente, estão esgotadas, por vezes depressivas, com auto-estima extremamente baixa e não cuidam bem de si mesmas. Eu não tenho a convicção de que a maior parte das pessoas que dizem sim para tudo, o fazem por ter uma alma absolutamente altruísta. Claro que existem pessoas que possuem senso de generosidade e caridade indiscutivelmente elevados. No entanto, outros motivos podem levar as pessoas a não conseguirem dizer não. Essa dificuldade estaria ancorada fundamentalmente em quatro medos:
1 – Medo de dizer não para alguém e, caso você venha a precisar desta pessoa algum dia, ter o auxílio negado;
2 – Medo de que a pessoa passe a não gostar de você e se afaste de seu convívio em virtude da negativa dada;
3 – Medo que ela passe a lhe tratar mal;
4 – Medo de que ela espalhe para os outros que você é um ser egoísta e que não se presta a ajudar pessoas em dificuldade.
Questões de ordem cultural também estão envolvidas na dificuldade de ser dizer não. Eu sinto que no Brasil, dizer não é quase um “pecado”. Digo isso porque, em outras culturas, como na norte-americana, por exemplo, esse é um procedimento normal, absolutamente assimilado pela população. E mais: eles dizem não, simplesmente, e pronto. Em nosso país, caso queiramos dizer não, às vezes temos de arrumar uma série de justificativas para aquela negativa, justamente por parecer ser quase proibido dizer não a alguém. Quando dizemos não, comumente interpreta-se isso como algo não natural e até mesmo ofensivo. É como se fizesse parte de um protocolo você ter de atender àquela demanda, sob pena de ser taxado como vilão.
Dica pra você:
O fato de você dizer que se sente boba chegou a um ponto que considero valioso. Este ponto chama-se tomada de consciência. Esse é o primeiro passo e, talvez, o mais importante. Digo isso porque existem pessoas que passam a vida inteira atendendo as demandas alheias, sendo literalmente exploradas, muitas vezes, sem se dar conta disso. A partir da tomada de consciência é que surge a possibilidade de escolha. Vou querer enfrentar meu medo de dizer não? Irei colocar limites para que não me façam de gato e sapato? Até que ponto vou me prontificar a ajudar as pessoas, sem que isso me faça mal? Essas são as perguntas que você precisa responder a si mesma.
Caso opte por começar a colocar limites nos outros, o que entendo ser o mais recomendável, prepare-se para um novo problema: as pessoas para as quais você sempre esteve solícita, a partir de suas novas condutas, podem realmente se afastar de você e, tudo que você tinha feito por ela até hoje por elas, poderá não ter valido nada. Isso não é algo raro de acontecer; alias, muito pelo contrário. Se assim for, pelo menos você poderá concluir sobre quem era verdadeiramente amigo e quem estava próximo apenas por interesse. Portanto, assim como o sim, o não deve ser interpretado por todos nós como algo natural, e não, como indelicadeza ou desconsideração.
Um abraço do
Douglas Amorim
Psicólogo clínico, pós-graduado em Psicologia Médica, mestre em Educação, Cultura e Sociedade
www.douglasamorim.com.br
Instagram: @douglasamorimpsicologo
Muito obrigado pelo elogio, Robson! A intenção do blog é exatamente essa!Grande abraço!
Sua resposta foi tão clara e objetiva que me mostrou como agir em minhas atitudes futuras. Obrigado.