O Cavaleiro Solitário revisita o Velho Oeste

por Marcelo Seabra

The Lone Ranger

Quando um filme vai mal nas bilheterias no exterior, já chega por aqui com má fama. Como se o simples fato de ter levado (relativamente) poucos americanos aos cinemas atestasse a ruindade da obra. No ano passado, o grande fracasso sob esse ponto de vista financeiro foi John Carter, que deu um belo prejuízo à Disney, a mesma que agora amarga a fraca estreia de O Cavaleiro Solitário (The Lone Ranger, 2013), longa baseado em um personagem antigo, que hoje não tem apelo algum junto ao público, e que ainda é confundido com o Zorro, para piorar. Para ser justo, é preciso esclarecer que não se trata de um filme ruim: é uma aventura mediana que pode encontrar seu público. Apenas não conseguirá empatar seu orçamento megalomaníaco, na casa de US$ 250 milhões.

O personagem surgiu no rádio, em 1933, e logo ganhou livros e até um programa de televisão. Ele supostamente foi inspirado no policial federal Bass Reeves, que cuidava de territórios indígenas no final do século XIX. Com o tempo, ele foi ganhando características marcantes até chegar ao que temos hoje: um justiceiro mascarado chamado John Reid que combate o crime no velho oeste montado em um belo cavalo branco, chamado Silver, acompanhado pelo fiel amigo Tonto. O marcante tema musical é parte da ópera Guilherme Tell, de  Gioachino Rossini. Curiosamente, os mesmos George Trendle e Fran Striker, criadores do Cavaleiro, são também responsáveis por Britt Reid, ou o Besouro Verde, e estabeleceram que Dan Reid Jr., sobrinho de John Reid, seria o pai de Britt.

The Lone Ranger duo

Para o renascimento do personagem no Cinema, o superprodutor Jerry Bruckheimer chamou seu parceiro Gore Verbinski, com quem trabalhou na bem sucedida série Piratas do Caribe, e vieram também os mesmos roteiristas, Ted Elliot e Terry Rossio, com a adição de Justin Haythe (de O Acordo, 2013). A ideia, claro, era repetir a arrecadação milionária das crônicas do pirata Jack Sparrow, e nada melhor do que chamar o próprio para estrelar. Johnny Depp, então, entrou a bordo para viver Tonto, quase roubando os holofotes do protagonista, que ficou a cargo de Armie Hammer, mais lembrado como os gêmeos de A Rede Social (The Social Network, 2010) ou como o escudeiro de Hoover em J. Edgar (2011). Fica a dúvida: se o cavaleiro tem sempre o índio ao lado, como ele pode ser solitário?

O John Reid de Hammer é um advogado pacifista  que volta à sua cidadezinha natal, no meio da poeira do Texas de 1869, e se vê no olho do furacão. Os policiais federais (chamados de Rangers) se preparavam para escoltar o perigoso Butch Cavendish (William Fichtner, de O Cavaleiro das Trevas, 2008) e o índio Tonto (Depp) à forca. Dan Reid (James Badge Dale, de Homem de Ferro 3, 2013), irmão de John, é um deles e o recruta para a missão. Paralelamente, acompanhamos a construção de ferrovia, projeto encabeçado pelo poderoso Cole (Tom Wilkinson, de Missão Impossível 4, 2011), e conhecemos Rebecca The Lone Ranger RWReid (Ruth Wilson, de Anna Karenina, 2012), a esposa de Dan. As circunstâncias fazem com que John se associe a Tonto, e ele passa a usar uma máscara para esconder sua identidade e fazer justiça. O elenco é reforçado por Helena Bonham Carter (de Os Miseráveis, 2012), como a prostituta-mor, e Barry Pepper (de Bravura Indômita, 2010), que vive o capitão da cavalaria. Quando Wilson, a típica mocinha em perigo, está em cena, é impossível não encarar aqueles lábios ridículos (ao lado).

Como, o tempo todo, o Tonto velhinho está contando a história a um garoto em 1933, tudo pode ser invenção. E interromper frequentemente o desenrolar da ação para voltar nesses dois se torna algo bem irritante. O roteiro trata John Reid como um sujeito mais bobo do que deveria, e ele é sempre alvo das piadas de Tonto. A dupla é responsável por várias sequências engraçadas, algumas delas além da medida por caracterizar Reid como um paspalho. A maior parte da ação também é com eles, claro, e é aí que está o maior exagero. Apesar da ausência de invenções ou superpoderes, a obra lembra o clima de As Loucas Aventuras de James West (Wild Wild West, 1999) e Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros (AL: Vampire Hunter, 2012), e não dá para evitar a comparação com os dois longas de Zorro com Antonio Banderas, situados em um universo parecido. Os dois personagens inclusive costumam ser confundidos.

Apesar das falhas, da longa duração e do roteiro extremamente convencional e formulaico, O Cavaleiro Solitário não deixa de ser um passatempo divertido, com uma bela trilha de Hans Zimmer e boas atuações. Fica a sensação de que os envolvidos se consideravam em um jogo ganho, atraindo espectadores com a presença de Depp e gastando horrores com cenas espetaculares de explosões e perseguições. Faltou alma, um desenvolvimento minimamente razoável para os personagens – principalmente Reid – e um pouquinho de coragem para fugir de esquemas pré-concebidos. Verbinski visitou o velho oeste com um resultado melhor na animação Rango (2011), onde ele partia de homenagens ao gênero para criar uma história criativa e cativante. E dificilmente poderemos esperar uma abordagem melhor numa continuação, já que um prejuízo esperado de US$ 150 milhões enterra de vez essa hipótese.

Tonto leva um papo com Silver

Tonto leva um papo com Silver

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Judd Apatow fala da vida aos 40

por Marcelo Seabra

This is 40

Em 2007, o produtor, roteirista e diretor Judd Apatow criou Ligeiramente Grávidos (Knocked Up), comédia sobre um casal nada a ver, de uma noite apenas, que descobre que, depois de nove meses, haverá uma conseqüência para este encontro furtivo. Um casal coadjuvante, a irmã e o cunhado da grávida, ganham uma participação maior e, em 2012, Apatow resolveu trazê-los às telas novamente. Bem-vindo aos 40 (This Is 40) revela como anda a vida de Pete e Debbie ao chegar nessa temida idade, mantendo o mesmo tipo de humor que Apatow emprega em tudo o que faz.

Repetindo os papéis, Paul Rudd (de As Vantagens de Ser Invisível, 2012) é acompanhado por Leslie Mann (de Eu Queria Ter a Sua Vida, 2011), que é esposa de Apatow e leva as filhas junto, Maude e Iris. Ou seja: esta é uma família real, com Rudd como o alter-ego de Apatow, o que já deixa claro trazer experiências autobiográficas do marido e pai. Muitas das situações podem ser vistas como engraçadas por quem não está envolvido, o que vai garantir algumas risadas do espectador. Mas, como de costume, a maior parte desses problemas se estende ao ponto de não ser mais engraçada, chegando bem próximo do que acontece na vida das pessoas. O bom humor dá lugar ao ressentimento, à raiva, a dúvidas.

This Is 40

Pete é dono de uma gravadora que anda focando em artistas mais velhos que já não têm mais atenção da mídia. O que significa dar murro em ponta de faca, algo nada bom para os negócios. O cara é o seu ídolo, mas não necessariamente vai atrair público e lucro. Pete resiste a abrir a situação para Debbie, e ela tem seus próprios problemas: a loja que ela administra está sendo roubada e uma das funcionárias é a provável ladra. Em casa, nada é mais fácil: uma filha enfrenta a chegada conturbada da menstruação e o crescente interesse por meninos, enquanto a mais nova se sente deixada de lado.

As figuras que cercam os protagonistas são um caso a parte. Há diversos atores, entre veteranos e outros mais novos, que roubam os momentos em que estão em cena, começando pelos “pais” Albert Brooks (de Drive, 2011) e John Lithgow (de Os Candidatos, 2012). Um é o extremo do outro, mas têm em comum os desafios conjugais com esposas mais jovens e filhos pequenos. Tatum O’Neal, Lena Dunham, Chris O’Dowd, Megan Fox, Jason Segel e Robert Smigel são alguns dos nomes vistos, além dos cantores Ryan Adams, Billie Joe Armstrong e Graham Parker. A aborrecida Melissa McCarthy, do deplorável Missão Madrinha de Casamento (Bridesmaids, 2011), ganha uma ponta interessante.

Apatow já está em seu quarto longa como diretor (tem também O Virgem de 40 Anos, de 2005, e Ta Rindo do Quê?, de 2009) e mantém sempre o mesmo tipo de abordagem. Ele procura mostrar personagens críveis, com problemas que podemos enfrentar no dia a dia, mas acaba exagerando os contextos e prolongando situações até chegarem a ser irritantes. O resultado é bastante irregular e até cansativo. Piadas com a finada série Friends (da qual Rudd participou) e com a condição de Midas da TV de J.J. Abrams não são o suficiente para segurar a peteca no ar. E durar mais de 130 minutos não ajuda.

O diretor leva a família à estreia

O diretor leva a família à estreia

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Sobra estilo aos Stokers

por Marcelo Seabra

Criar uma atmosfera de suspense não é das tarefas mais simples, e muitos longas são prejudicados exatamente pela falta de uma. Outros podem sofrer pela falta de conteúdo, primando apenas pela atmosfera. É a vitória da forma sobre a essência, e é disso que sofre Segredos de Sangue (Stoker, 2013), obra que marca a estreia do coreano Park Chan-wook em Hollywood. Muitos creditam a falta de audácia do filme às amarras que certamente os produtores impuseram ao diretor, que se mostrou mais corajoso e coerente em sua famosa trilogia da Vingança.

Claramente inspirado por Hitchcock e seu A Sombra de uma Dúvida (The Shadow of a Doubt, 1943), Wentworth Miller (mais conhecido como o Michael de  Prison Break) escreveu a história de uma família bem incomum. Com frequência, algumas pistas são jogadas e levantamos certas suspeitas sobre aqueles personagens, mas as expectativas morrem na praia. O título original, Stoker, é o sobrenome da família, e uma referência óbvia ao autor de Drácula, Bram Stoker. Não se trata de vampiros, como Miller reforçou em entrevistas, mas de uma metáfora para a pessoa que alimenta o fogo em uma fornalha, o “stoker”, em inglês.

Assim como em A Sombra de uma Dúvida, temos uma garota na transição para o mundo adulto (Mia Wasikowska, de Os Infratores, 2012) e a chegada de um tio Charlie extremamente suspeito (Matthew Goode, de Direito de Amar, 2009). Charlie resolve voltar e passar um tempo com a cunhada (Nicole Kidman, de Reféns, 2011) e a sobrinha pela ocasião da morte do irmão, Richard (Dermot Mulroney, de A Perseguição, 2011). As coisas começam aí, e passamos a conhecer um pouco melhor aquelas pessoas, quando também começam a surgir suspeitas.

Stoker scene

Depois de levantar algumas possibilidades, o roteiro simplesmente vai avançando sem esclarecer muita coisa, chegando a um final descabido. O clima de suspense é muito interessante, usando uma mansão cheia de sombras e conversas proibidas, mas a ambivalência sugerida não chega a lugar algum. Por que Charlie é mostrado como um ímã sexual, que atrai até as colegiais? Temos mesmo que acreditar que Goode é assim tão irresistível? E o passatempo favorito de pai e filha, tinha uma razão ou era só uma opção do pai? E a ligação entre sobrinha e tio, o que tinha de tão especial?

Há momentos em que é certo que alguém mostrará os dentes caninos protuberantes. Em outros, era questão de segundos até que Dexter, o psicopata mais legal da TV, aparecesse. O final deixa uma sensação de promessas não cumpridas, e de desperdício: Wasikowska e Kidman estão muito bem como mãe e filha, elas têm uma ótima sintonia. Pena que suas ações parecem fugir de uma lógica, apenas cumprindo tabela. Chan-wook se sai melhor quando tem mais liberdade criativa, quando o roteiro é dele e quando trabalha com seus compatriotas.

Elenco e diretor apresentam o longa em Londres

Elenco e diretor apresentam o longa em Londres

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Minions roubam Meu Malvado Favorito 2

por Marcelo Seabra

Despicable Me 2

Em 2010, foi lançada uma animação que arrecadou mais de 500 milhões de dólares pelo mundo. Isso já seria o suficiente para justificar uma sequência para Meu Malvado Favorito, e ela chega agora aos cinemas do Brasil. Para ser protagonizado por um vilão, o filme teria que ser equilibrado por algo mais ameno, ou não atingiria as crianças. Por isso, além de três crianças órfãs, ele conta também com os Minions, criaturinhas engraçadinhas que, mais do que nunca, dominam o show – e são usadas descaradamente para tal.

No início de Meu Malvado Favorito 2 (Despicable Me 2, 2013), Gru já não é mais um vilão. Ele é um pacato pai de três meninas que pretende produzir geléias e gelatinas para vender, e mantém apenas um pouco de seu mau humor. Sua rotina tranqüila é abalada pela chegada de Lucy Wilde, funcionária de uma agência anti-vilões que o recruta (à força) para ajudá-los. Um frasco contendo uma fórmula perigosa foi roubado, eles não têm nem ideia de quem seria o culpado e Gru, com sua mente naturalmente maligna, poderia encontrar o responsável. Gru e Lucy terão que trabalhar juntos, seguindo a pequena pista que têm, para impedir que algo muito ruim aconteça.

Despicable Me 2 Toys

No elenco de dubladores, alguns dos nomes do primeiro filme se repetem, começando por Steve Carell (de Procura-se um Amigo para o Fim do Mundo, 2012), o protagonista. O sotaque estranho, que é até motivo de piada, continua afiado, mas dificilmente teremos a oportunidade de conferir nos cinemas nacionais. Se um filme de zumbis como Guerra Mundial Z (World War Z, 2013) tem maioria de cópias em exibição dubladas, imagine um desenho! Kristen Wiig (de Missão Madrinha de Casamento, 2011), a maldosa sra. Hatie do primeiro, volta em outro papel, como a agente Wilde. Ken Jeong (de Se Beber Não Case) também trocou de papel, passando do apresentador de programa para o dono da loja de perucas. Russell Brand (de Rock of Ages, 2012) volta como Dr. Nefário, o cientista louco que não quer deixar de ser mau. A principal nova aquisição é Benjamin Bratt (de O Acordo, 2013), que vive o dono do restaurante mexicano Eduardo, papel que foi discutido com Javier Bardem e que chegou a ter Al Pacino contratado, mas desistiu por diferenças criativas. Steve Coogan (de Ruby Sparks, 2012), outra novidade, faz o chefe da liga anti-vilões. No elenco nacional, Leandro Hassum é Gru, Maria Clara Gueiros faz Lucy e Sidney Magal é Eduardo.

É engraçado quando dizem que determinado filme é para a família: pode esperar que seja voltado para crianças. Se é para a família, deveria ter algo que atraísse os pais, como na franquia Shrek, que mistura criaturas bonitinhas a um humor subversivo, agradando a todos. Essa nova aventura de Gru, como a anterior, não tem inovações, não foge de velhas fórmulas do Cinema e não traz reflexões relevantes, como os três Toy Story. Para compensar as faltas, sobram Minions, aqueles bichinhos que falam uma língua própria e ajudam Gru a realizar maldades, a limpar a casa, cozinhar e o que mais ele precisar. Eles chamam a atenção, protagonizam apresentações musicais e têm até um uso maior nesta continuação, se envolvendo mais na ação. Não é a toa que já há um longa prometido para 2014 estrelado por eles, sem as distrações destes dois primeiros.

Eis os astros do longa!

Eis os verdadeiros astros do longa!

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Duas análises do novo Homem de Aço

por O Pipoqueiro

Man of Steel

Uma estreia dessa grandeza, que criou tanta expectativa (leia aqui), merece não uma crítica, mas duas. Confira abaixo as duas visões, que não diferem tanto, e se assemelham também evitando spoilers. Pode ler sem medo de estragar nada.

Superman ainda não consegue alçar um voo digno nos cinemas

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Man of Steel scene

Como vocês puderam conferir num artigo anterior, a expectativa pelo novo filme do Super-Homem (ou Superman, como queiram), O Homem de Aço (Man of Steel, 2013) era altíssima por aqui. Ao subirem os créditos ao final da película, ficou patente que essa expectativa fora exagerada e o filme fica muito abaixo do que era esperado, especialmente se levarmos em conta os nomes de seus realizadores: este novo reboot foi escrito por David S. Goyer e produzido por Chris Nolan – respectivamente escritor/roteirista e diretor da aclamada trilogia Batman – e dirigido por Zack Snyder, um nome que se tornou bastante renomado entre os fãs de quadrinhos graças ao seu trabalho em 300 (2006) e Watchmen (2009). A química, dessa vez, não deu liga.

Uma das maiores críticas a Superman: O Retorno (Superman Returns), de 2006, foi o fato de o filme ter muito pouca ação. O Homem de Aço parece tentar compensar isso e se torna uma produção que, honestamente, lembra mais uma mistura de um filme de Michael Bay com um filme catástrofe de Roland Emmerich, tamanhos os níveis de ação e destruição que ele proporciona. A história em si, que deveria ser o principal atrativo de qualquer filme, muitas vezes fica em segundo plano.

Como todo reboot, o longa traz uma história de origem. Ele se inicia em Krypton, um planeta que está à beira da destruição devido ao fato de sua população, ainda que altamente evoluída, tenha praticamente exaurido seus recursos naturais. Pior: ao tentarem obter minerais retirando-os do próprio núcleo do planeta, acabam tornando esse mesmo núcleo instável. Apesar da destruição iminente, o cientista Jor-El (Russel Crowe, de Os Miseráveis, 2012) propõe uma forma de salvar pelo menos parte do legado de Krypton, mas sua iniciativa nem sequer chega a ser considerada. Ao mesmo tempo em que ele a apresenta, uma tentativa de golpe de Estado está sendo levada a cabo pelo General Zod (Michael Shannon, de Boardwalk Empire – abaixo). Jor-El consegue enganar temporariamente as forças do general e garantir a sobrevivência de Krypton ao inserir o codéx – matriz genética da qual todo kryptoniano é gerado, já que Krypton abolira a reprodução natural de seus cidadãos – nas células de seu filho Kal, o primeiro bebê kryptoniano gerado por concepção natural em milênios. Depois de muita briga – com Jor-El mostrando seus conhecimentos de artes marciais – a história segue mais ou menos como tradicionalmente se conhece: Kal-El é colocado em uma nave espacial e enviado para ser criado na Terra; Jor-El é morto; Zod e seus comparsas são presos e condenados a uma prisão na chamada “Zona Fantasma”; e Krypton explode.

Krypton

Trinta e três anos se passam e vemos um homem desconhecido (Henry Cavill, de Imortais, 2011), barbado, realizando feitos impossíveis para um ser humano normal ao mesmo tempo em que segue uma vida nômade para impedir que as pessoas descubram seu segredo e coloquem seus entes queridos em perigo. Através de flashbacks, descobrimos que seu nome é Clark Kent e que ele fora encontrado e criado por um casal de agricultores, Jonathan e Martha Kent (Kevin Costner, de Hatfields & McCoys, e Diane Lane, de Secretariat, de 2010), que lhe ensinaram não só a controlar, mas, dentro do possível, esconder suas extraordinárias habilidades.

A coisa toda começa a degringolar para Clark quando ele está prestando serviços para o exército norte-americano em uma missão no norte do Canadá que examina uma espécie de veículo enterrado sob toneladas de gelo. A chegada da repórter Lois Lane (Amy Adams, de Curvas da Vida, 2012) ao mesmo local faz com que a história comece a andar mais rapidamente. Paralelamente a isso, o planeta é visitado por uma nave alienígena, tripulada por Zod e seus comparsas – que conseguiram escapar da Zona Fantasma quando da explosão de Krypton –, que passaram os últimos 33 anos em busca do “último filho de Krypton”. Dizer mais do que isso – e muito já foi dito – estragaria a experiência do filme pro leitor que ainda não assistiu à película.

O Homem de Aço tem seus méritos, mas, infelizmente, a maior parte deles se resume à parte técnica. Os efeitos especiais são praticamente perfeitos e Zack Snyder sabe como trabalhar com eles. Todo o elenco tem atuações que não comprometem – ainda que não se destaquem – e há até uma química decente entre Cavill e Adams. O roteiro, que chega a reciclar até mesmo situações vistas no primeiro Homem-Aranha (Spider-Man, 2002), no entanto, não funciona. Mesmo aqueles que não são fãs dos quadrinhos do personagem notarão que ele está bastante descaracterizado e isso causa incômodo. O fato é que, quando os produtores chamaram Christopher Nolan e Goyer para o projeto, eles queriam que a dupla conseguisse inserir aquele aspecto de “mundo real” no filme da mesma forma que fizeram na trilogia do Homem-Morcego. Infelizmente, o Superman não é o Batman e essa abordagem mais realista e até mesmo sombria, pelo menos nessa primeira tentativa, não deu certo. Apesar da boa bilheteria no exterior e da garantia de uma continuação, O Homem de Aço mostra que, na briga nas telas do cinema entre DC e Marvel, a Warner Brothers (dona da DC) ainda tem muito a aprender com a sua concorrente.

Man of Steel Wallpaper

Homem de Aço destrói até sua própria mitologia

por Marcelo Seabra

Finalmente, já estão disponíveis as primeiras pré-estreias do aguardado O Homem de Aço (Man of Steel, 2013), longa que retoma a carreira cinematográfica do Super-Homem – que está na geladeira desde o fracasso de Superman – O Retorno (Superman Returns, 2006). O herói ganhou um tratamento similar ao que deu muito certo com Batman, tentando lhe dar um aspecto mais real, pé no chão. Na prática, vemos que isso é mais fácil de fazer com um milionário que teve os pais assassinados que com um alienígena indestrutível que vive na Terra desde bebê. Os realizadores tiveram carta branca para mudarem o que acharam necessário nas origens conhecidas do personagem, o que deve desagradar muitos fãs.

Como é um herói mais do que conhecido, há alguns elementos que rodeiam o Super-Homem que já são esperados em um filme. Romance é um deles, e humor passou a ser após as palhaçadas feitas com a cinessérie das décadas passadas. Talvez, a falta destes dois elementos tenha feito alguns se desanimarem um pouco com a nova aventura. De fato, o clima sisudo da produção dificilmente se quebra, um pouco de humor não faria mal. Do romance, sinceramente, não dá para sentir falta. Ele aparece, mas bem dosado, numa medida aceitável, que não vira o centro das atenções. Uma coisa irritante é a necessidade de sempre se voltar à origem, que já foi mais do que explicada, e os envolvidos ainda acabam se vendo na obrigação de acrescentarem algo novo, para justificar recontar tudo. O mesmo se observou no recente O Espetacular Homem-Aranha (The Amazing Spider-Man, 2012), que se enrolou ao inventar em cima do que todos já sabiam. Bastava uma introdução bem feita situando o público, como acontece em Superman II (1980).

Clark

O básico é o que todos já sabiam: um menino cresce na fazenda dos Kent, cidadãos do interior dos EUA que parecem ser modelos de integridade e cidadania. Em meio a flashbacks, conhecemos a história de seu planeta-natal, Krypton, que explodiu em decorrência da exploração desmedida de seus recursos naturais. Jor-El, um cientista kryptoniano, envia seu filho numa nave prevendo que ele seria um deus na Terra, já que as características do planeta fariam o pequeno ser muito poderoso. O garoto cresce tendo que lidar com suas diferenças: desde cedo, ele se descobre muito mais forte que os outros, além de talentos como uma audição sobre-humana, entre outros que vão aflorando com o tempo. Já crescido, Clark decide sair pelo mundo ajudando pessoas, aceitando trabalhos diversos e conhecendo melhor os humanos. Seu pai adotivo havia alertado-o para o risco de se mostrar, dizendo que o planeta não estaria pronto para tantas descobertas, como não estarmos a sós no universo. Por isso, ele se mantém anônimo.

No espaço, nesse momento, Zod, um general dissidente de Krypton que estava preso com seus asseclas na Zona Fantasma, consegue rastrear o filho de seu antigo aliado, Jor-El. Um encontro se dará na Terra e é aí que as coisas começam a ficar aborrecidas. Enquanto o filme cuida de desenvolver seus personagens, tudo corre bem, mesmo com as tais alterações na origem clássica. Mas, quando começa a ação desenfreada e genérica que mais lembra as destruições de Roland Emmerich, o filme fica bem chato. Não vale a pena entrar em mais detalhes, mas alguns fatos estranhos que aparecem a partir daí não fazem muito sentido e fica a sensação que o foco foi concentrado numa parte da trama, deixando a outra para se resolver em dois minutos, no finalzinho. E descaracteriza-se ainda mais o Super-Homem, que teoricamente nunca causaria tantos prejuízos no centro de Metrópolis.

MAN OF STEEL

No campo dos atores, não há altos e baixos, fica tudo em campo seguro. Para o papel principal, corrigindo um dos erros de O Retorno, que contava com um ator totalmente inexpressivo, foi chamado Henry Cavill (mais aqui), lembrado como o Charles Brandon da série The Tudors – seus últimos trabalhos no Cinema não merecem ser citados. Ele tem uma atuação discreta e adequada, e mostra músculos compatíveis com o título de Homem de Aço. O longa exige menos de Cavill, que não precisa buscar a versatilidade de um Christopher Reeve, por exemplo. Por falar em Reeve, há uma cena, um close, que aproxima bastante os dois atores. A nova Lois, a cargo de Amy Adams (de O Mestre, 2012 – abaixo), é infinitas vezes melhor que a anterior e cumpre bem sua missão.

Temos duas encarnações distintas de Robin Hood como pais de Kal-El/Clark: Kevin Costner (o Príncipe dos Ladrões de 1991) é Jonathan Kent e Russell Crowe (o Hood de 2010) é Jor-El, e ambos têm papéis fundamentais na jornada do filho. Diane Lane (de Killshot, 2008) e Ayelet Zurer (de Ponto de Vista, 2008) vivem as mães, a terráquea e a kryptoniana. O General Zod, que na cabeça de todos ainda é o megalomaníaco de Terence Stamp, de Superman II, ficou com Michael Shannon (de O Abrigo, 2011), e é de longe a figura mais marcante do filme. A competência de Shannon supera a escorregada da maquiagem (ou falta de) e permite a Zod ter um arco melhor construído. Laurence Fishburne (da série Hannibal) fecha o elenco principal como Perry White, o editor do Planeta Diário.

O grande responsável pelo renascimento de Batman, Christopher Nolan, foi contratado pela Warner como produtor e consultor criativo, e escreveu o roteiro ao lado de seu parceiro David Goyer, também da trilogia. Essa era a garantia do tom sombrio buscado pelos executivos. Para a direção, depois de aclamado por duas adaptações de quadrinhos, Zack Snyder assumiu. Com 300 (2006) e Watchmen (2009) no currículo, ele era mais do que capacitado, e de fato a parte técnica é impecável. Os efeitos visuais são ótimos, as caracterizações são perfeitas. Mas, nos dois trabalhos anteriores de Snyder, nos preocupamos com a integridade física dos personagens, nos envolvemos, o que não acontece aqui. Ele poderia ter se preocupado menos com mudanças e mais com a alma do filme, a dualidade Superman/Clark Kent.

Há escolhas corajosas, mas a longa duração do trecho “destruição” enfraquece o resultado, além dos afobados minutos finais. E, para quem esperava algo à altura de John Williams, só resta se contentar com a trilha sem graça de Hans Zimmer. Uma sequência, já certa, poderá ir muito mais longe, podendo pular a batida origem do herói e desenvolver uma história bacana. Quem sabe, teremos pela primeira vez um bom uso para o grande Lex Luthor no Cinema?

Homens de aço da TV e do Cinema

Homens de aço da TV e do Cinema: Reeve, Dean Cain, Tom Welling, Routh e Cavill

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Truque de Mestre engana e diverte na mesma medida

por Marcelo Seabra

Now You See Me banner

Reunir um grupo de ilusionistas para praticar assaltos é uma premissa tão interessante que já deveria ter sido filmada. Quando se tem um elenco bacana, então, se torna ainda mais atraente conferir o resultado. Filmes que colocam truques de mágica no cerne de sua trama têm por obrigação revelar seus segredos para o público e mostrar que não se trata de enganação, mas de engenhosidade. É aí que separamos, por exemplo, o ótimo O Grande Truque (The Prestige, 2006) do decepcionante O Ilusionista (The Illusionist, 2006). E também é aí que derrapa o novo Truque de Mestre (Now You See Me, 2013), em cartaz nos cinemas brasileiros. Mas as várias outras qualidades tentam equilibrar as coisas.

Com roteiro escrito a seis mãos – Ed Solomon, (de Homens de Preto, 1997), Boaz Yakin (de Príncipe da Pérsia, 2010) e o estreante Edward Ricourt – e um diretor habituado ao gênero ação – Louis Leterrier, de dois Carga Explosiva (2002 e 2005) –, era de se esperar algo mais confuso e descerebrado. No entanto, tudo começa muito bem, com uma fantástica sequência de apresentação de cada um dos quatro mágicos que se tornarão “Os Quatro Cavaleiros”, responsáveis por um show conjunto num cassino de Las Vegas. J. Daniel Atlas (Jesse Eisenberg, de Para Roma, Com Amor, 2012), Henley Reeves (Isla Fisher, de O Grande Gatsby, 2013), Jack Wilder (Dave Franco, de Anjos da Lei, 2012) e Merritt McKinney (Woody Harrelson, de Jogos Vorazes, 2012) foram reunidos misteriosamente e realizam uma série de apresentações que têm um objetivo desconhecido.

Now You See Me scene

Logo de cara, os Cavaleiros fazem uma mágica, com a ajuda de um espectador, que se mostra realmente um roubo a um banco francês. O agente do FBI Dylan Rhodes (Mark Ruffalo, o Hulk de Os Vingadores, 2012) e a agente da Interpol Alma Dray (Mélanie Laurent, de Bastardos Inglórios, 2009) se unem para tentar prender o grupo, o que fica difícil pela falta de provas. Eles buscam ajuda com o ex-mágico Thaddeus Bradley (Morgan Freeman, de Oblivion, 2013), que se ocupa de revelar os segredos por trás dos truques. Michael Caine (da trilogia Batman) fecha o ótimo elenco principal como o milionário que banca o quarteto. Uma boa escolha para cada papel ajuda muito a colocar o longa no caminho certo, e este é o principal mérito de Truque de Mestre.

À medida que a projeção vai se aproximando do final, as coisas se tornam mais frenéticas e pontos importantes da trama começam a ficar no ar. Muito do plano dos protagonistas depende de mágicas não explicadas e mirabolantes, o que começa a deixar uma pulga atrás da orelha. Tudo estava muito divertido, mas passa a ser inacreditável, o que derruba o pacto que o longa firmou com o público. Explica-se uma coisa aqui para deixar outras três ali sem a menor pista. Este é o tipo de filme que perde força quando se olha para trás, após a sessão, e os furos começam a ficar mais óbvios. Não deixa de ser um bom passatempo, mas não pense muito a respeito.

Os Quatro Cavaleiros: Eisenberg, Fisher, Harrelson e Franco

Os Quatro Cavaleiros: Eisenberg, Fisher, Harrelson e Franco

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Universidade Monstros traz os jovens Mike e Sulley

por Marcelo Seabra

Monsters University banner

A vida na universidade é um tema extremamente explorado no Cinema, principalmente no americano. Em qualquer gênero, sendo comédia e terror os mais freqüentes, as questões desenvolvidas são sempre as mesmas: diferenças, aceitação, bullying, superação, competição, amadurecimento. Ao pensarem no que poderiam fazer para aproveitarem o sucesso de Monstros S.A. (Monsters, Inc.), de 2001, os criativos da Pixar concluíram que uma solução seria uma pré-continuação, mostrando como os protagonistas se conheceram durante seus anos de formação. Mais de uma década depois, sai Universidade Monstros (Monsters University, 2013), uma animação nada inovadora que deve agradar às crianças, e só.

O universo criado no primeiro filme dá liberdade para os mágicos da Pixar criarem os mais variados monstros, muitos deles bastante simpáticos e coloridos, e encaixá-los nas tribos que geralmente podem ser encontradas em uma universidade. Até o hippie que fica no gramado tocando violão aparece. Não faltam atletas, mocinhas, nerds, desajustados, góticos e todos os tipos de adolescentes que pudermos pensar. Claro que cada um com suas características marcantes, já que não estamos falando de humanos. É na Universidade Monstros que o futuro deles é definido, pelas habilidades demonstradas dentro das funções que eles têm.

Monsters University monsters

O curso mais disputado é o Assustador, que formará monstros aptos a assustarem crianças humanas. O susto gera a energia que mantém o mundo deles funcionando. Quem não consegue assustar vai para um trabalho mais burocrático, como criar as portas usadas entre os mundos ou cuidar dos cilindros que armazenam os sustos. É para o curso de Assustador que se matricula Michael “Mike” Wazowski, um monstrinho verde que desde pequeno sonha em assustar crianças e trabalhar ao lado de seus ídolos. É para lá que vai também James “Sulley” Sullivan, um grandão de família nobre com talento natural para assustar, ao contrário do colega. Com cada um assumindo um estereótipo do mundo colegial, o talentoso e o esforçado, eles não poderiam mesmo ser amigos.

O clichê dos clichês fará com que aqueles dois seres de bom coração, mas muito diferentes um do outro, se aproximem: uma competição. Eles são expulsos do tão almejado curso e têm, como última esperança, um concurso de sustos que poderá reabilitá-los. A cada prova, um time é desclassificado e já sabemos onde isso vai dar. Carros (Cars, 2006), outro trabalho menor do estúdio, trazia à mente imediatamente Doc Hollywood (1991), aquela despretensiosa comédia com Michael J. Fox sobre um médico sabichão que era obrigado a ficar numa cidade pequena. Em Universidade Monstros, várias produções podem ter servido como inspiração, de A Vingança dos Nerds (Revenge of the Nerds, 1984) a A Casa das Coelhinhas (The House Bunny, 2008). No visual, não dá para esquecer dos Muppets – o Art, por exemplo, parece uma mistura do Animal com o Zed, de Loucademia de Polícia (Police Academy, 1984).

À frente da equipe de pobres coitados, Mike deve fazer com que todos superem suas limitações para ganharem a disputa e terem de volta a vaga no curso. E, de quebra, darem uma lição na fraternidade dos atletas valentões. Sobram lições de moral e discursos motivacionais, mas falta graça. Para uma animação que se pretende uma comédia, esse é um pecado capital. Seria uma influência negativa da Disney? Os cenários criados são ótimos, muito criativos e condizentes, e há até um trecho no final que faz uma homenagem a filmes de terror – muito adequada, tendo em vista a natureza dos personagens. Mas rir é algo que não acontece. Como, mesmo assim, já são mais de 150 milhões de dólares arrecadados pelo mundo, esperemos por mais produções com Mike e Sulley.

Essa é a turma de Mike

Essa é a turma de Mike

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Brad Pitt combate zumbis na Guerra Mundial Z

por Marcelo Seabra

World War Z

Uns dizem que é uma história sobre Brad Pitt e zumbis. Outros, que era uma bomba anunciada devido aos problemas durante a produção. E ainda há um trailer com cenas mal escolhidas, que não dá vontade de conferir o longa. Estes são alguns dos obstáculos que Guerra Mundial Z (World War Z, 2013) enfrentou sem ao menos ter estreado, e são também exemplos dos riscos que correm aqueles que dão um parecer sobre um filme antes de assisti-lo. Para a surpresa de muitos, trata-se de uma obra interessante e bem feita, ao contrário de muita coisa que essa moda de zumbis originou.

Em Contágio (Contagion, 2011), vimos uma doença se espalhando em velocidade impressionante e derrubando cidadãos do mundo inteiro. Imagine essas pessoas se tornando, em torno de 12 segundos, zumbis acelerados e audaciosos como em Extermínio (28 Days Later, 2002). As cenas com multidões de zumbis lembram os ataques de Eu, Robô (I, Robot, 2004), muito bem orquestradas e com fartura de corpos para todos os lados. Como não poderia deixar de ser numa obra dessa natureza, há críticas a aspectos da sociedade, como o fato de as autoridades terem sido avisadas dos primeiros acontecimentos e terem ignorado, o que acontece mais vezes do que deveria.

World War Z Set

Brad Pitt, sem precisar fazer muito esforço, vive Gerry Lane, um ex-agente das Nações Unidas que se retirou do trabalho após algum tipo de trauma e vive tranqüilo com a esposa (Mireille Enos, de The Killing) e filhas. Num belo dia, como outro qualquer, eles são surpreendidos na rua por pessoas agindo como loucos e Lane presencia uma transformação, após uma contaminação por mordida. Daí em diante, o ritmo da ação se intensifica e o roteiro foca no problema, sem se preocupar em dar muita profundidade aos personagens. O passado não vem ao caso, o agora é o que importa. Essa opção se mostra acertada por dar um ritmo ágil ao longa e explorar bem o assunto, com Lane viajando pelo mundo em busca de respostas.

Pitt, também produtor do longa, conseguiu comprar os direitos do livro de Max Brooks em 2007 e trouxe uma escolha inusitada para a direção. Marc Foster chamou a atenção com A Última Ceia (Monster’s Ball, 2001), seguindo com bons dramas como Em Busca da Terra do Nunca (Finding Neverland, 2004) e Mais Estranho que a Ficção (Stranger Than Fiction, 2006). Em 2008, ele comandou James Bond em Quantum of Solace (2008), dando uma guinada nos projetos que habitualmente assumia. Por que não, então, zumbis? Para adaptar o livro já tido como cult, foi chamado J. Michael Straczynski (de A Troca, 2008). Com o desenvolvimento de novas versões do roteiro, Foster acabou partindo para Redenção (Machine Gun Preacher, 2011), e voltou para pré-produção em abril de 2011. Depois de negociações, o orçamento foi fechado em US$ 125 milhões.

Depois que Damon Lindelof e Drew Goddard (ambos de Lost) reescreveram passagens, foi necessário fazer novas filmagens e o orçamento bateu a casa de US$ 190 milhões. Com tantos problemas, críticos previam um prejuízo grande, mas Guerra Mundial Z já está chegando a US$ 80 milhões de bilheteria, metade do custo, só nos Estados Unidos. Uma sequência já foi aprovada pela Paramount e Foster chegou a prever uma trilogia. Se a qualidade for mantida, eu não me importaria de acompanhar a parte 2.

Cena assustadora e bem feita

Cena assustadora e bem feita

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A expectativa por O Homem de Aço

por Marcelo Seabra

Man of Steel

Com a aproximação da estreia do novo longa do Homem de Aço, marcada no Brasil para 12 de julho (um mês de atraso em relação aos EUA), um misto de ansiedade e receio toma conta. Não deveria, mas como evitar? Sabemos que quanto mais expectativa um projeto cria, maior é a possibilidade de seu público se frustrar. É inevitável que algo dessa magnitude seja cercado de especulações, medos e, acima de tudo, esperança. Afinal, foi o filme de 1978 que abriu as portas para essa enxurrada de adaptações de histórias em quadrinhos que temos hoje, ou que ao menos permitiu aos grandes estúdios vislumbrarem o potencial deste tipo de personagem.

Superman 78Os problemas que marcaram a produção de 78 já fazem parte do anedotário do Cinema. Várias trocas de roteiristas e diretores, uma grande indecisão com relação ao protagonista, se seria alguém já estabelecido ou um novato, a dificuldade de criar os efeitos visuais necessários etc. A escolha de Christopher Reeve se mostrou fundamental. O carisma do ator era enorme, além da competência ao viver dois indivíduos distintos: o poderoso e indestrutível salvador da humanidade e o jornalista boboca que está sempre sendo deixado para trás. O sucesso foi tanto que marcou Reeve, que não ficou famoso por nenhum outro trabalho, e acabou repetindo o papel até o vergonhoso Superman IV (1987), que ele alegou ter aceitado devido ao importante tema da paz.

Apesar do que havia sido planejado inicialmente, o primeiro Superman não seguiu a linha camp, ou brega. Richard Donner, ao assumir a direção, descartou tudo e convocou Tom Mankiewicz para reescrever o roteiro, bolando logo a trama para dois filmes. Quando estava com 75% do segundo filmado, Donner parou o processo e finalizou o primeiro, quando foi demitido pelo produtor Alexander Salkind. O segundo foi finalizado por Richard Lester, que assinou a direção e cometeu ainda o terceiro filme. A diferença entre o que Lester e Donner fizeram é clara. O segundo filme começa com uma introdução muito original e inventiva que situa o espectador que não havia assistido ao primeiro, algo que é comum hoje em sequências. O terceiro, no entanto, recorre a uma série de trapalhadas e confusões, num estilo pastelão na contramão dos episódios anteriores. Contratar Richard Pryor para um papel importante já era um indicador de que as coisas iam para o espaço.

Superman III fight

Há situações, nesse terceiro, que chegam ao ridículo. A luta entre Clark e Superman, que parece ter ficado bêbado e mau com uma kriptonita estragada, é de dar pena. Só não é pior pela dignidade conferida por Reeve, que em momento algum deixa de se levar a sério. Ele tem a oportunidade de viver alguém cafajeste e maligno e se sai bem. Isso, até Clark ter o terno derretido pelo mesmo ácido que nem molha o uniforme do herói, que está sempre intacto. No segundo filme, é possível ver sangue em várias cenas, como na interessante briga no bar. Mas a briga se conclui com uma idiota cadeira giratória. E Lois convenientemente esquece tudo que sabia com um beijo. Uma boa proposta do terceiro é colocar Lana Lang no caminho de Clark, mostrando que há mais mulheres no mundo além de Lois. E, ao contrário da jornalista, Lana se apaixona por Clark, e não pelo Superman. Mas, ao final, ela simplesmente é deixada de lado.

No quarto filme, temos novamente o mala Luthor bolando planos igualmente malas. Ele chega ao ponto de criar um “Homem Nuclear”, um dos piores vilões da história do Cinema. Depois de um salto de quase vinte anos (de 1987 para 2006), necessário para apagar esse constrangimento, tivemos uma nova aventura do Super-Homem no Cinema. Outra decepção! A escolha de Bryan Singer como diretor parecia promissora, e Brandon Routh poderia ter sido outro Christopher Reeve – ele foi escolhido inclusive por sua semelhança física com o falecido. Pena que suas qualidades vinham no singular. Mais para modelo que para ator, Routh ainda foi prejudicado por um roteiro ridículo, novamente trazendo Luthor como um vilão cômico planejando ficar rico com terrenos valorizados. A Lois de Kate Bosworth não ajudou em nada, de tão inexpressiva, e ainda arrumaram um impossível superfilho.

Com um início tão brilhante, com acertos que fazem qualquer falha sumir, a carreira do Super-Homem merecia um futuro melhor. A balança já conta três a dois no quesito qualidade e este novo Homem de Aço representaria um empate, o início de uma reerguida. Algumas críticas já divulgadas lá fora não são muito animadoras, indicando fatores negativos como religiosidade forçada, falta de leveza e desmedida influência do efeito “Cavaleiro das Trevas”, o que era totalmente desnecessário para um personagem que representa o oposto de Batman. Independente das evidências, a criança interior continuará torcendo pelo herói, até ser tarde demais.

Depois do segundo filme, o General Zod volta a aparecer em O Homem de Aço

Depois do segundo filme, o General Zod volta a aparecer em O Homem de Aço

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Daniel de Oliveira é o rei da Boca do Lixo

por Marcelo Seabra

Boca internationalHiroito de Moraes Joanides (1936-1992), enquanto enfrentava uma longa pena na cadeia, decidiu contar sua história e justificar seus crimes. Por isso, escreveu um livro contando tudo o que fez para merecer o título de Rei da Boca do Lixo, zona boêmia paulistana que concentrava intelectuais, beberrões, prostitutas e diversos tipos de criminosos. Esse livro serviu de inspiração para o roteiro escrito por Flávio Frederico e Mariana Pamplona que daria origem a Boca (2010), longa já exibido em mostras, festivais e sessões pingadas que só agora chega às locadoras. O título original foi alterado para evitar confusões com o chamado “cinema marginal”, conhecido como Boca do Lixo.

Como os anos de atuação de Hiroito se restringiram às décadas de 50, 60 e 70, seu nome não é dos mais famosos hoje. Logo, seria necessária uma maior contextualização sobre o personagem. Não é isso que temos no longa, também dirigido por Flávio Frederico. Muitas informações são abordadas de raspão e outras são apenas dadas como notórias. Os saltos no tempo do roteiro não ajudam, o público fica boiando em diversos momentos da exibição. Em um, por exemplo, o personagem simplesmente sai da cadeia, apesar das várias acusações que enfrenta, e somos obrigados a deduzir que ele comprou a força policial local.

Vivendo o protagonista, Daniel de Oliveira tenta fazer o possível com o que lhe é dado e se resume a usar maneirismos para mostrar o quanto é mau, apesar do tipo magro. Seu Hiroito é um personagem falho, o roteiro usa subterfúgios óbvios para estabelecer verdades, como mostrar o sujeito lendo um livro para mostrar que ele era culto. Uma vez tendo provado o ponto, o texto não vê necessidade de voltar naquele aspecto, parecendo ter muito a mostrar em pouco tempo. Pode ter sido uma escolha de Frederico, para evitar um tom episódico, ou até uma restrição de orçamento, mas o longa acaba cheio de buracos.

Boca

Oliveira já mostrou competência em diversos trabalhos, e muitos não esquecem seu Cazuza (de 2004). Ele só está precisando ler melhor os roteiros que topa fazer, para evitar confusões como 400 Contra 1 (2010) ou esse Boca. Hermila Guedes, de Assalto ao Banco Central (2011), interpreta a esposa de Hiroito, uma prostituta por quem o chefão cai de amores e que nunca define se é parceira do marido no crime ou se prefere que ele saia daquela vida. Ela é mostrada em cenas que reforçam ambas as situações. Milhem Cortaz, dos dois Tropa de Elite e de Assalto, é sempre um ator interessante, mas seu personagem aparece quando é conveniente para o filme, e nunca chega a ser menos que raso. Esse, inclusive, é o problema de todos que cercam o Hiroito cinematográfico, como o traficante concorrente vivido por Jefferson Brasil ou o policial corrupto de Paulo César Peréio. Leandra Leal, então, entra e sai pela mesma porta.

Após ler um pouco sobre a história do Rei da Boca, constatamos que realmente se trata de uma figura rica, que poderia ter sido bem explorada pelo cinema. Ele veio de uma família de recursos, tinha uma relação complicada com o pai, que foi brutalmente assassinado, e ele ainda foi acusado do crime. Passou a morar na zona que frequentava e montou um bordel que o faria crescer na região. Diz-se que sua ficha criminal corrida tinha mais de 20 metros. Elementos suficientes para se ter um novo Scarface, ou algo assim, mas não foi desta vez. Apesar de uma fotografia competente, um clima noir muito apropriado e uma boa direção de Frederico, que opta por pular certas passagens desnecessárias e óbvias que causariam pouco ou nenhum efeito sobre o público, Boca peca pela falta de um (anti)herói bem delimitado, que criasse um mínimo de identificação com o espectador, que poderia até entender a lógica de suas ações. Para que isso aconteça, é melhor buscar o livro do verdadeiro Hiroito.

Leandra Leal: "O que vim fazer aqui mesmo?"

Leandra Leal: “O que vim fazer aqui mesmo?”

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