O título já diz muito: o filme Argentina, 1985 (2022) trata exatamente desse lugar, nesse período. Importante é saber o que aconteceu lá, algo crucial para o bom andamento do país que infelizmente não se repetiu por toda a América Latina. Nossos hermanos julgaram criminosos de guerra do período da ditadura deles e trouxeram alguma justiça aos milhares de desaparecidos e mortos. Eles celebram, este ano, 35 anos de democracia, momento certeiro para esse lançamento.
Talvez por tratar de um assunto tão espinhoso e, ao mesmo tempo, crucial, a Argentina tenha escolhido o filme para representá-la na pré-corrida ao Oscar. Os países indicam suas obras e, após a primeira votação, chega-se aos cinco finalistas. Só que o filme não é feito apenas de boas intenções: a reconstituição da época e dos eventos é ótima e ajuda muito ter Ricardo Darín, o maior ator argentino em atividade, no papel principal.
Brilhando numa composição meticulosa, Darín (de Relatos Selvagens, 2014) vive o promotor civil Julio César Strassera, incumbido de conduzir o julgamento dos militares envolvidos na tortura e/ou morte de aproximadamente 30 mil cidadãos argentinos, além dos muitos que sobreviveram com sequelas físicas e psicológicas. O ator não transforma seu personagem em um santo, como acontece aos montes no Cinema, e o apresenta em toda a sua imperfeição. Um bom sujeito, com defeitos, tentando fazer o bem.
Strassera precisava montar uma equipe, mas muitos advogados veteranos que ele conhecia haviam morrido. Ou pior: se tornaram puxa-sacos de fascistas – ou seja, fascistas. Por isso, chamar mais gente foi ficando complicado, e este era só o primeiro desafio dele. Logo, entra em cena um promotor adjunto, Luis Moreno Ocampo (Peter Lanzani, de O Clã, 2015), um jovem advogado que será essencial no caso. Curiosamente, uma das personagens mais importantes do longa é a mãe de Ocampo, que mal aparece em cena, mas tem uma participação marcante.
Dá gosto de assistir a uma produção tão bem cuidada que, além de entreter de forma inteligente, ainda traz luz sobre fatos que todos precisam conhecer. Argentina fez o necessário ao final da ditadura: colocou todos os canalhas fardados no banco dos réus e mostrou que não se trata seres humanos como eles fizeram. Se alguém estava errado ou fora da lei, que fosse julgado e pagasse por isso. Como ocorreu com eles. Algo imprescindível para o Brasil que, como não aconteceu, deixou brecha para as atrocidades que vemos hoje, com o crescimento da extrema-direita. Nunca mais!