Anthony Hopkins perturba o público com Meu Pai

É gritante o tanto que Anthony Hopkins está acima de qualquer outro ator nesta temporada. Seu trabalho em Meu Pai (The Father, 2020) é algo realmente surpreendente, mesmo para quem conhece bem o talento do ator galês. O filme chega muito perto de colocar o público na cabeça de um senhor de 80 e poucos anos que rapidamente vai sendo tomado pela demência e fica cada vez mais confuso. Com poucos personagens e cenários, o filme nos proporciona uma experiência devastadora.

Fazendo sua estreia na direção de um longa-metragem, o dramaturgo Florian Zeller adaptou uma de suas peças (ao lado do veterano Christopher Hampton, de Um Método Perigoso, 2011) e conseguiu indicações aos principais prêmios este ano. A cara de teatro não foi totalmente afastada, mas isso não chega a incomodar e Zeller se redime após escrever o vergonhoso A Outra Mulher (Amoureux de ma Femme, 2018). Desta vez, conta com elenco do Reino Unido encabeçado por Hopkins e Olivia Colman (que faz as rainhas de A Favorita, 2018, e de The Crown).

Quando Meu Pai começa, conhecemos o genioso Anthony (Hopkins), um homem idoso constantemente visitado pela filha, Anne (Colman), que se preocupa muito com ele. A recusa do pai em aceitar uma cuidadora deixa Anne presa a ele, o que acaba afetando as relações e as atividades dela. No início, um espectador menos observador pode ficar um pouco perdido, mas logo tudo passa a fazer sentido.

O grupo pequeno de atores inclui Imogen Poots (de Natal Sangrento, 2019), Rufus Sewell (de Judy, 2019), Olivia Williams (de Victoria e Abdul, 2017) e Mark Gatiss (de séries como Game of Thrones e Sherlock). Colman faz uma filha dedicada, que tenta manter o bom humor frente as dificuldades com o pai, e a atriz diz muito com suas expressões. Não por acaso, Colman é hoje uma das principais intérpretes do Cinema mundial, sempre trazendo muita atenção para os projetos com os quais se compromete.

Hopkins, premiado com o Oscar e o BAFTA por sua fantástica atuação em O Silêncio dos Inocentes (The Silence of the Lambs, 1991), teve vários outros êxitos em sua carreira. Mas, com muita frequência, demonstra certa preguiça em suas escolhas e acaba fazendo pouco esforço em coisas como O Ritual (The Rite, 2011), Presságios de Um Crime (Solace, 2015) ou na franquia Transformers (em O Último Cavaleiro, 2017). Meu Pai foi uma opção muito acertada e vemos o ator numa composição rara. Ele tem a oportunidade de mostrar uma versatilidade gigantesca e é impossível ficar impassível frente a tanta sensibilidade.

Ponto positivo no currículo de todos os envolvidos, Meu Pai é certamente um dos melhores filmes da temporada. Hopkins pode até não levar a estatueta careca, já que a Academia parece empenhada em premiar postumamente Chadwick Boseman (por A Voz Suprema do Blues, 2020). Mas seu trabalho será lembrado, estudado e citado por muitos anos, desde já referência na criação de um personagem complexo e muito interessante. Mais uma vez, Hopkins nos lembra o grande ator que é.

Apesar do tema difícil, Zeller teve um set descontraído

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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