por Marcelo Seabra
Adler Berriman Seal, o Barry, teve o jogo de cintura necessário para conseguir trabalhar para a CIA e para o Cartel de Medellín ao mesmo tempo. Na ida, cumpria missão para um, e aproveitava a volta para resolver o outro lado. Assim, otimizava seus custos e ainda ganhava um trocadinho extra. Esse dinheiro chegou a um montante tal que ele não conseguia mais esconder em sua propriedade, e precisava enterrar no quintal. Essa é uma história tão absurda que só podia ser real. E Tom Cruise resolveu levá-la ao Cinema.
Doug Liman lançou recentemente Na Mira do Atirador (The Wall, 2017), mas não parece se cansar. Feito na América (American Made, 2017) é mais um fruto da feliz parceria do diretor com Cruise, que já nos havia dado No Limite do Amanhã (Edge of Tomorrow, 2014). O estilo de Liman é bem interessante para dar ritmo ao longa, com uma montagem ágil e um bem-vindo humor nas horas certas. Essa é uma das razões de Feito na América ser tão divertido. Há indicações de que os fatos narrados não são exatamente como aconteceram, o que invalidaria a obra como fonte histórica. Ainda bem que ela não se propõe a isso.
Quando conhecemos Seal, ele é um piloto de avião de uma companhia aérea que demonstra estar entediado com a rotina. Sua salvação chega na pele de Monty Schafer (Domhnall Gleeson, de O Regresso, 2015 – acima), um misterioso agente da CIA que lhe faz uma proposta: tirar fotos aéreas de negociações escusas e, assim, servir ao país. Logo, Seal percebe que o patriotismo não necessariamente traz dinheiro e uma outra oportunidade aparece: ajudar o bando do futuro lorde da droga Pablo Escobar (Mauricio Mejía). E essa, sim, traz muito dinheiro. Imagine ganhar dois mil dólares por quilo de pasta base de cocaína traficada levando 300 quilos por viagem…
Esse era o tipo de problema que Barry Seal (ao lado, o verdadeiro, que está mais para James Belushi) nunca imaginaria ter: falta de espaço para guardar o dinheiro. Ou precisar de várias empresas de fachada para lavar toda essa grana. A vida dele segue parecendo uma aventura de sessão da tarde, quase como uma variação do Lobo de Wall Street (The Wolf of Wall Street, 2013). Mas sabemos que quem se envolve com esse tipo de gente vai acabar encontrando situações mais graves. Para complicar as coisas, surge um irmão da esposa que não tem absolutamente nada na cabeça, um papel muito bem defendido por Caleb Landry Jones (de Corra!, 2017).
O roteiro, assinado pelo pouco experiente Gary Spinelli, é surpreendentemente bem amarrado. Claro que fatos da vida de Seal foram suprimidos, como as duas primeiras esposas e os dois primeiros filhos. Mas, como produto de entretenimento, funciona que é uma beleza. A filha mais velha chegou a entrar na justiça, para que a produção fosse parada. Podemos deduzir que não deu o resultado esperado por ela. A fotografia do nosso César Charlone (de Cidade de Deus, 2002) nos apresenta a paisagens belíssimas e nos situa bem geograficamente, e o filme ainda conta com o privilégio de uma inspirada trilha de Christophe Beck (de Homem-Formiga, 2015).
Feito na América escancara alguns problemas inerentes aos Estados Unidos, país notório por meter o dedo nos conflitos dos outros. E, invariavelmente, essa intrusão causa mais problemas do que ajuda, além de gerar aberrações como Barry Seal. Esta é uma ótima chance para levantar questões, mas é também um grande veículo para Cruise gastar seu enorme carisma e mostrar que ainda é um astro do primeiro escalão. E não deixa de ser um aquecimento, já que ele voltará em breve a pilotar aviões na continuação de Top Gun (1986).