Wolverine ganha o filme solo que merece

por Marcelo Seabra

O Wolverine. Ele é tão famoso que bastava usar o nome, e pronto. A distribuidora preferiu chamá-lo de Wolverine – Imortal (The Wolverine, 2013), trazendo um certo sensacionalismo dispensável e execrado pelos fãs. Depois do abominável Origens (X-Men Origins: Wolverine, 2009), o mais nervoso X-Man bem que merecia uma produção que o tratasse bem. Felizmente, é o que faz este novo longa, que respeita o personagem e, ao mesmo tempo, não se preocupa tanto com a mitologia, focando no básico. Temos um sujeito isolado, se escondendo do mundo e em constante sofrimento. Esse é o Logan que conhecemos.

Na pele do mutante pela sexta vez, a primeira em 3D (convertido e desnecessário), Hugh Jackman novamente faz um ótimo trabalho. Com uma dieta sugerida por Dwayne “The Rock” Johnson e muito exercício físico, ele teve seis meses para se preparar e está realmente gigantesco. Isso não passa despercebido, ele aparece sem camisa frequentemente, para delírio das garotas que farão a boa ação de acompanhar seus namorados. Mesmo tendo passado por vários visuais nos quadrinhos, Logan fica a maior parte do tempo de camiseta e calça, bem civil, a não ser quando requisitado em lutas. Aparecendo mais magro e debilitado em Os Miseráveis (Les Misérables, 2012), que lhe rendeu uma indicação ao Oscar, o ator parece nunca ter abandonado Wolverine, de tão à vontade que se sente em cena. E continua com cara de Clint Eastwood, o que casa muito bem com a situação de cavaleiro solitário.

Dando sequência ao terceiro filme da franquia X-Men, O Último Confronto (The Last Stand, 2006), a nova aventura coloca Logan vivendo como andarilho nos cantos do mundo, quando é encontrado por uma japonesa que pretende levá-lo ao Japão a pedido de seu chefe, promovendo o reencontro de velhos amigos. Meio a contragosto, Logan aceita e acaba entrando numa grande disputa familiar por dinheiro e poder. No meio, aparece uma proposta tentadora: abrir mão do fator de cura e envelhecer como um humano normal, e eventualmente morrer. É bem comum ver vampiros filosofando a este respeito em ficções um pouco mais profundas, e a questão também toca Logan.

Famoso pelo roteiro premiado de Os Suspeitos (The Usual Suspects, 1996) e já tendo trabalhado na franquia mutante sem ganhar crédito, Christopher McQuarrie foi contratado para escrever The Wolverine. Quando o projeto trocou de diretor, com a saída de Darren Aronofsky, Mark Bomback (de Incontrolável, 2010) e Scott Frank (de Marley & Eu, 2008) foram trazidos para reescrever, mas a fonte seguiu sendo a saga japonesa de 1982 criada por Chris Claremont e Frank Miller. Detratores costumam lembrar de James Mangold pelo fraco Encontro Explosivo (Knight & Day, 2010), mas o diretor também responde por Os Indomáveis (3:10 to Yuma, 2007), Johnny & June (Walk the Line, 2005) e Identidade (Identity, 2003), três bons exemplos de um artista versátil que consegue se sair bem em gêneros tão diferentes. E não podemos esquecer Kate & Leopold (2001), primeira parceria de Mangold com Jackman.

As escolhas mais acertadas em The Wolverine foram esquecer que Origens existe, não partindo dele, e tentar dar um clima mais sombrio e pé no chão. Mesmo que, no terceiro ato, a inspiração vinda dos quadrinhos se torne mais clara. Digamos que as coisas começam com uma grande influência da moda Christopher Nolan e terminem mais próximas à festa de exageros de Os Vingadores (The Avengers, 2012). A ambientação em um Japão mais cru e violento, com máfia e tudo, lembra produções como Chuva Negra (Black Rain, 1989) e O Justiceiro (The Punisher, 1989), também uma adaptação de um anti-herói dos quadrinhos cujo azar foi ter Dolph Lundgren no papel.

Praticamente um ronin, um samurai sem mestre

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

View Comments

  • Todos tem uma baita implicância com o terceiro ato, e seria compreensível isto caso ele fosse ruim. Mas não é. É tenso, perigoso, não está lotado (há somente 6 personagens envolvidos, com apenas 4 atuantes) ou sequer é espalhafatoso. Ok, a revelação é previsível e a Víbora uma vilã categoria Hera Venenosa, no mais, funciona bem pro filme que até então vinha sendo construído.

    • É, não chega a ser um problema, só muda o tom que vinha mostrando até então. Mas o resultado é positivo!
      Abraço!

  • Seabra, você mencionou na crítica do filme Identidade (do Mangold) e, na boa, que filmaço é esse, revisitei o filme recentemente e sinto falta de uma boa discussão sobre (até porque eu o conheci tarde) a trama, ainda que contenha alguns buracos...SPOILER ALERT (afinal é o menino o assassino?? eu prefiro imaginar que o assassino investigado era mentalmente incapaz e vivia custodiado pelos pais - até porque o fato criminoso é recente ao tempo do presente do filme, cerca de 6 ou 8 anos) mostra grande habilidade em segurar um clima de tenção e suspense fora do padrão de Hollywood e, por sinal muito bem vindo ao cinema contemporâneo!!

    • Ih, Marco, para poder discutir melhor, eu teria que assistir a ele de novo. Assim que eu puder, te aviso. Abraço!

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