por Marcelo Seabra
Pronto, acabou o suspense. Não que o Brasil inteiro pare por causa do Oscar, mas uns aqui e outros ali realmente queriam saber o que aconteceria. Como a cobertura é cronológica, não vou entregar de cara quem ficou sendo o grande vencedor da noite, mas alguns filmes, como Inverno da Alma (Winter’s Bone), já saem ganhando por serem indicados, já que atraem uma atenção bem maior do que outros independentes.
A premiação começou às 22h30 com uma engraçada montagem dos filmes indicados, co-estrelando James Franco e Anne Hathaway (ao lado), com A Origem (Inception) como ligação entre eles. Após uma rápida apresentação, chega Tom Hanks para apresentar a primeira categoria, Direção de Arte. E Alice no País das Maravilhas (Alice in Wonderland) leva, para Robert Stromberg e Karen O’Hara. Em seguida, Fotografia fica com Wally Pfister, de A Origem, que aproveita para honrar Christopher Nolan, esquecido pela Academia.
Depois de Kirk Douglas ser ovacionado de pé, o veterano entrega o Oscar de Atriz Coadjuvante para Melissa Leo, por O Vencedor (The Fighter), com ou sem campanha pedindo votos. Ela já havia sido indicada como Melhor Atriz por O Rio Congelado (The Frozen River, 2008). Depois de um longo discurso e um palavrão proferido para milhões de espectadores, Leo finalmente deixa o palco. E podemos ver Matthew McConaughey na platéia – não sabia que ele podia entrar em ocasiões como essa.
Justin Timberlake e Mila Kunis entram para anunciar o Melhor Curta de Animação, que vai para The Lost Thing, deixando a Pixar (e Day & Night) de lado nesta. Mas, na categoria seguinte, Melhor Animação, a desforra chega no prêmio mais previsível da noite. Não tinha como Toy Story 3 não levar. Pausa para novo comercial.
Josh Brolin e Javier Bardem chamam o Melhor Roteiro Adaptado, outra barbada: claro que é Aaron Sorkin, em sua primeira indicação, por A Rede Social (The Social Network). Fica a pergunta: e Toy Story 3 é adaptado do quê? Em seguida, temos Melhor Roteiro Original, que fica para O Discurso do Rei, desbancando minha aposta em A Origem. É a primeira indicação de David Seidler, que se descreve um “late bloomer” (alguém que “desabrocha” tarde). Ele levou também o BAFTA e o British Independent Film Award, entre várias indicações este ano.
Anne Hathaway volta dos comerciais cantando para Hugh Jackman. E é James Franco que solta a primeira (e única) piada sacaneando Charlie Sheen, dizendo, vestido de mulher, que recebeu um SMS do ator. Em seguida, o Melhor Filme Estrangeiro é apresentado pela eterna rainha Helen Mirren (falando francês) e o tal de Russell Brand, do novo Arthur, o Milionário. O prêmio ficou com In a Better World. Eu e o site Rotten Tomatoes ficamos pra trás, apostando em Biutiful. Reese Whiterspoon chama o Melhor Ator Coadjuvante, que responde por Christian Bale. É sua primeira indicação a um prêmio da Academia, mesmo que já venha atuando desde antes de O Império do Sol (Empire of the Sun), de 1987. O Vencedor leva, assim, os dois Oscars de coadjuvantes, realmente seu ponto forte. Pena Mark Wahlberg não ter sido indicado.
Ficamos sabendo que a ABC continuará a televisionar o Oscar nos EUA e chegam os australianos Nicole Kidman e Hugh Jackman, par de Austrália (2008), para anunciar a Melhor Trilha Sonora Original. Após uma fantástica apresentação da orquestra (e do novo palco-telão), com os temas clássicos do cinema e, na sequência, dos indicados deste ano, são confirmados vencedores Trent Reznor e Atticus Ross, por A Rede Social. Mixagem de Som, o prêmio seguinte, fica com A Origem, sob a responsabilidade de Lora Hirschberg, Gary Rizzo e Ed Novick. Edição de Som, ainda com Matthew McConaughey e Scarlett Johansson apresentando, vai novamente para o favorito A Origem. Richard King, o editor, havia ganhado por O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight, 2008), também de Nolan, e Mestre dos Mares (Master and Commander: The Far Side of the World, 2003), além de acumular uma indicação por Guerra dos Mundos (War of the Worlds, 2005).
Marisa Tomei (ao lado) é convidada para anunciar os vencedores dos prêmios técnicos, entregues anteriormente. Foram 11 premiados, no total, entre técnicos e engenheiros – ou “os nerds”, como se referiu James Franco. Cate Blanchett chama Rick Baker para receber novamente um Oscar, desta vez pela Maquiagem de O Lobisomem, ao lado de Dave Elsey. É a sétima premiação de Baker, além de outras cinco indicações, e a segunda indicação de Elsey. Coleen Atwood leva seu terceiro Oscar de Melhor Figurino, agora por Alice no País das Maravilhas, e acumula outras seis indicações. É a primeira vez que é premiada em uma parceria com Tim Burton.
Cantando uma música de O Picolino (Top Hat, 1935), Kevin Spacey chama Randy Newman para executar a primeira Canção Original indicada da noite, We Belong Together, de Toy Story 3. Apesar de mediana, é a melhor das indicadas. Alan Menken no piano, com Mandy Moore e Zachary Levi (da série Chuck) cantando, apresentam a música de Enrolados (Tangled), I See the Light. Acredite: é mais ou menos neste ponto que começa a transmissão da TV Globo, com o ridículo José Wilker dizendo que “está chutando” em seus palpites sobre Melhor Ator e Atriz. Aproveitaram para fazer um flashback das premiações que aconteceram antes da transmissão, a coisa mais patética que já vi a Globo fazer (não, já vi pior).
A próxima categoria bem poderia ser entregue num outro dia e apenas comunicada na noite de hoje: Melhor Documentário em Curta-Metragem. Levou o Strangers No More, e ninguém viu nenhum dos cinco – ao menos no Brasil. O Melhor Curta-Metragem de Ficção ficou com God of Love, com o figuraça Luke Matheny, cria da Academia, agradecendo e avisando que deveria ter cortado o cabelo. Um clipezinho abusando do já popular software Auto-Tune força ligeiramente a barra, brincando com filmes do ano no formato musical e fechando com uma piada com o descamisado lobisomem da saga Crepúsculo. O Melhor Documentário em Longa-Metragem, anunciado por Oprah Winfrey, é Inside Job. Confesso que foi ótimo ver o tal mascarado Banksy, um grafiteiro que virou estrela da noite pro dia, não levar. Os diretores começam o discurso lembrando que nenhum dos executivos envolvidos na crise financeira global de 2008, assunto de seu filme, foram presos.
Lembrando os velhos tempos, um esticado Billy Cristal volta ao palco propositalmente brincando com a sua idade e fazendo uma homenagem a Bob Hope, um dos grandes apresentadores do Oscar. A melhor piada da noite teve Robert Downey Jr. como alvo, assim como nos Globos de Ouro, com o próprio no palco levando gozação de Jude Law (ao lado). Os dois anunciam Melhores Efeitos Visuais, que fica com os mágicos de A Origem, como não poderia deixar de ser. A Melhor Edição (ou Montagem) é a do favorito A Rede Social, para Angus Wall e Kirk Baxter, já indicados por O Curioso Caso de Benjamim Button (The Curious Case of Benjamin Button, 2008) e antigos colaboradores de David Fincher.
Continuando com mais duas canções indicadas, Jennifer Hudson chama If I Rise, de 127 Horas, com Florence Welch e A.R. Rahman, e Coming Home, com Gwyneth Paltrow, do filme Country Strong. Após mais um envelope difícil de abrir, Randy Newman leva seu segundo Oscar, entre vinte indicações (o que ele faz questão de lembrar em seu discurso). O anterior também foi trabalhando com a Pixar, por Monstros S.A. (Monsters Inc., 2001).
A sempre enervante Céline Dion canta Smile , de Chaplin, para lembrar os falecidos do último ano. Nomes como Blake Edwards, Tony Curtis e Leslie Nielsen farão falta, entre muitos outros. Homenagem especial a Lena Horne, atriz e cantora negra falecida aos 92 anos, que abriu caminho para outros atores negros ao assinar longo contrato com um grande estúdio de Hollywood.
Em momento, no mínimo, estranho, Anne Hathaway chama Hilary Swank, que chama Kathryn Bigelow que chamará o Melhor Diretor da noite. Não dá pra entender pra quê tanta gente chamando gente. E, então, uma zebra meio que esperada: Tom Hooper (ao lado) tira o prêmio que estava praticamente nas mãos de David Fincher. Só falta agora O Discurso do Rei levar Melhor Filme, consagração da zebra.
Os Governors Awards do ano homenageiam Kevin Brownlow, Eli Wallach, Jean-Luc Godard e Francis Ford Coppola, em cerimônia realizada em novembro passado. Na noite dos Oscars, Godard não comparece, e seus três colegas silenciosamente agradecem a menção. Eis que surge Jeff Bridges, Melhor Ator do ano passado, para apresentar o prêmio de Melhor Atriz. Um rápido trecho de cada filme, algumas palavras de Bridges para cada indicada, e Natalie Portman sobe para apanhar sua previsível estatueta com total apoio do pai da sua criança, que já aparece bem na barriga. Agora por Cisne Negro (Black Swan), Natalie estava indicada pela segunda vez, a primeira tendo sido por Closer – Perto Demais (2004). Em seguida, Sandra Bullock faz o mesmo papel de Bridges na escolha do Melhor Ator, falando sobre cada um e anunciando o vencedor. Em sua segunda indicação (consecutiva), Colin Firth confirma os palpites e fica com o prêmio. Ano passado, por Direito de Amar (A Single Man), perdeu para Bridges (em Coração Louco – Crazy Heart), e agora deu o troco.
Fechando a noite, Steven Spielberg entra para tirar entre dez indicados o Melhor Filme do ano. Sob um monólogo do rei de Firth, são exibidos trechos de todos, inclusive mostrando, sem cerimônias, momentos importantes das histórias, os famosos spoilers. Spielberg aproveita para lembrar alguns grandes filmes que foram “apenas” indicados, como Cidadão Kane (Citizen Kane, 1941) e Touro Indomável (Raging Bull, 1980). Novamente, O Discurso do Rei surpreende e rouba o Oscar de A Rede Social. James Franco e Anne Hathaway se despedem chamando um bando de criancinhas para cantar (Somewehere) Over the Rainbow, clássico da trilha de O Mágico de Oz (The Wizard of Oz, 1939). Final brega com criancinhas cantando, séria injustiça com A Rede Social, mas A Origem levou quatro, o que é uma ótima surpresa. Acabou equilibrado. E tarde.