por Marcelo Seabra
Como um daqueles mistérios que nenhum estúdio explica, temos praticamente ao mesmo tempo duas releituras da história da Branca de Neve (acima, na versão de Disney, de 1937) em cartaz. A primeira a ser lançada, Espelho, Espelho Meu (Mirror, Mirror, 2012), já está saindo de circuito, enquanto a segunda, Branca de Neve e o Caçador (Snow White and the Huntsman, 2012), acaba de entrar. Apesar de seguirem caminhos bem diferentes, o resultado é mais ou menos o mesmo: o meio do caminho entre o bom e o ruim, passando pelo tédio absoluto.
O filme do diretor indiano Tarsem Singh tem Julia Roberts como a madrasta e segue um tom mais abobado, com palhaçadas a torto e a direito. O príncipe, vivido por Armie Hammer (os gêmeos de A Rede Social, de 2010), é um trapalhão que fica com vergonha de admitir que foi assaltado por anões. A protagonista, Lilly Collins, é pequena e delicada, físico próprio para uma singela donzela em perigo, mas sua Branca de Neve acaba aprendendo com os anos da floresta a se defender. Tudo dentro do esperado.
Conhecido por suas escolhas visuais espalhafatosas e inovadoras, Singh cria cenários majestosos, coloridos, fazendo com que o filme quase pareça um desenho. Os aspectos que deveriam ser violentos ficam em segundo plano e a produção deve ser própria para todas as idades, já que não é o propósito aqui, como se poderia esperar (como têm feito as adaptações de quadrinhos), buscar realidade. Espelho, Espelho Meu foi anunciado como uma nova abordagem da clássica história, e é isso, de fato. Mas uma abordagem bem mais covarde e engraçadinha do que as fontes alemãs dos Irmãos Grimm indicam.
O longa do estreante Rupert Sanders pretende ser mais adulto, mas acaba ficando no adolescente, não consegue fugir da comparação com a novela Crepúsculo – como foi o caso de A Garota da Capa Vermelha (Red Riding Hood, 2011). O fato de ser estrelado por Kristen “Bella” Stewart não ajuda. A atriz mais uma vez se mostra bem limitada, recorrendo sempre às mesmas expressões entediadas e, em momento algum, faz a platéia acreditar que alguém em sã consciência a seguiria numa invasão à cidadela da rainha e lutaria contra um poderoso e temível exército.
Os cenários e figurinos acabam sendo mais inventivos que os de Singh, mas alguns efeitos visuais deixam a desejar. É um problema acreditar que o espelho indicaria Kristen como a mais bela, já que isso nunca seria verdade com Charlize por perto. Outra questão é aquela mania de explicar porque alguém é mau. Deveria ser mau e pronto! O caçador (o “Thor” Chris Hemsworth), que ajuda a dar nome à produção, aparece depois de meia hora de filme, sendo mais um coadjuvante. E os anões roubam a cena, interpretados por bons atores ingleses como Bob Hoskins, Toby Jones, Ian McShane e Ray Winstone, mas são desperdiçados pelo roteiro e acabam virando alívio cômico – totalmente fora de lugar.
O grande destaque de Branca de Neve e o Caçador é a rainha Ravenna, que Charlize Theron (de Jovens Adultos, 2011) traz à vida de forma propositalmente caricata, como deve ser um vilão de conto de fadas. Comparar as duas rainhas é como comparar os dois Coringas do Batman: uma é má, mas parece não poder ser levada muito a sério, enquanto a outra é perversa e não titubeia antes de sacrificar alguém. As duas atrizes estão bem, cada uma do seu jeito. E, ao lado dos cenários e figurinos, são os únicos elementos que funcionam nos dois filmes. E, afinal, como levar a sério uma heroína chamada Branca de Neve?