Estreia: Programa do Pipoqueiro – Atômica

por Marcelo Seabra

Pessoal, ouçam todos: o Programa do Pipoqueiro está no ar!

A ideia é mesclar comentários e músicas, trazendo informação e entretenimento a você. Nessa primeira edição, trazemos a trilha do filme Atômica (Atomic Blonde, 2017), além de falarmos sobre vários filmes do momento. Clique no player abaixo e confira!

Comentários são bem-vindos, viu?

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Reality show mostra a sua morte ao vivo

por Marcelo Seabra

Quando ouvimos alguém ameaçando se matar ao vivo na TV pela primeira vez, foi algo chocante. Mesmo que fosse apenas um filme. Rede de Intrigas (Network, 1976) levantou algumas discussões, mostrou o absurdo em que a televisão estava chegando – já naquela época – e indicou o buraco em que o jornalismo entrava anos antes da situação ficar tão crítica. Em pleno 2017, Esta É a Sua Morte – O Show (This Is Your Death – The Show) busca um efeito parecido, e o alvo da vez são os reality shows. Mas, assim como com a referência acima, tudo aqui lembra outras obras, formando uma colcha de retalhos que desanda desde o início.

O longa, segundo dirigido por Giancarlo Esposito (o Gus Fring de Breaking Bad), começa bem promissor, com um apresentador de TV (Josh Duhamel, dos Transformers) presenciando uma cena de horror que ele ajudou a criar. Isso dá a entender que ele se levantará contra esse mar de lama que vem tomando conta da emissora, mas é aí mesmo que ele decide pular de cabeça e se sujar todo. Esse núcleo fica em suspenso para podermos conhecer o trabalhador Mason (Esposito), que se mata entre empregos para prover para a família e tem uma esposa (Lucia Walters) que sempre o olha com reprovação e o culpa pela crise mundial.

A ideia nada original do roteiro é mostrar que não é possível entrar na água sem se molhar, ou algo assim, além das críticas que se propõe a fazer. Não deixa de lembrar Breaking Bad, série na qual o protagonista achava que podia vender drogas sem ter que entrar no mundo de violência que vem junto. Adam Rogers (Duhamel saiu da mesma forma que Ryan Seacrest) aceita ser usado pela presidente do canal (Famke Janssen, da franquia Busca Implacável), ao usar sua recém adquirida fama para apresentar algo extremamente apelativo. Mas admite a estar usando também para cumprir um propósito nobre: valorizar a vida das pessoas comuns. Como? Matando-as no palco e tentando se convencer de que é por uma boa causa. E ele logo acredita na própria mentira.

O comportamento da sra. Mason é o indicador claro dos maiores erros do roteiro de Noah Pink (de Genius) e Kenny Yakkel (de Reality da Morte, 2011). Eles parecem correr contra o relógio para explicar tudo que o julgam necessário, e acabam acelerando as coisas. Ao invés de levarem tempo desenvolvendo determinada situação, resumem tudo numa fala medíocre e sem noção, como quando o chefe de Mason exige que ele faça um deslocamento de 75 minutos em 30. O que, de qualquer forma, o deixaria sem dormir. As mudanças pelas quais Rogers passa não são nada críveis, ele perde seus valores sem pensar duas vezes.

Por mais que as duas executivas (Janssen e Caitlin FitzGerald, de Masters of Sex – acima) sejam coerentes, o entorno não funciona. O drama da irmã (vivida por Sarah Wayne Callies, de Prison Break), por exemplo, é bem superficial e exagerado. Os roteiristas querem fazer críticas ao público do programa, mas acabam igualando-os aos próprios espectadores do filme, mostrando mortes cada vez mais elaboradas e causando o cansaço que Rogers e equipe tentam evitar. É como se eles não acreditassem na mensagem que querem passar. Enquanto isso, vão lançando mão de artifícios altamente discutíveis, como colocar decepção, depressão e suicídio como causa direta um do outro. Mesmo que partamos do pressuposto de que esse programa seria possível, tudo é muito simplista e afobado.

À medida em que as peças são jogadas, sabemos como será dado o xeque-mate. Uma ou outra ideia interessante que surge acaba se perdendo no universo de situações irreais que parecem apenas servirem para dar andamento ao roteiro, além de previsíveis. O reality do início é claramente inspirado em The Bachelor, e a nova atração lembra até O Sobrevivente (The Running Man, 1987). O título vem do clássico da TV Esta É a Sua Vida, além de várias outras obras que podem vir à mente durante a sessão.

Algo que nos deprime, mas que está bem próximo da realidade, é o retrato da plateia presente no estúdio: um bando de psicopatas que se divertem com o sangue que jorra. O pessoal torce, com plaquinhas e tudo, e não tem nada de catártico no processo. Só sadismo. Dá para perceber a intenção dos realizadores, de apontar o dedo para certos problemas que envolvem a TV e a sociedade em geral, que alimenta esse tipo de coisa. Mas a falta de sutileza é fatal e Esta É a Sua Morte não entrega o que parecia prometer.

Esposito atua em frente e atrás das câmeras

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Soldados americanos ficam Na Mira do Atirador

por Marcelo Seabra

Um terreno vasto, cheio de areia e poeira, com um resto de parede no meio e mato em volta. E pilhas de lixo. E o sol na cara, rachando mamona. Este é o cenário de Na Mira do Atirador (The Wall, 2017), longa de guerra atualmente em cartaz que trabalha bem o suspense da situação. Mostrando que nem só de Netflix vive o telespectador, foram os estúdios Amazon que bancaram a produção, em associação com parceiros independentes.

Famoso por seus longas de ação A Identidade Bourne (The Bourne Identity, 2002), Sr. & Sra. Smith (2005) e No Limite do Amanhã (Edge of Tomorrow, 2014), Doug Liman mostra novamente que é um diretor criativo, aproveitando ao máximo o roteiro de Dwain Worrell (de Punho de Ferro) com tomadas interessantes e uma montagem ágil, que evita momentos enfadonhos mesmo tendo pouco o que mostrar. Os diálogos são afiados e aqueles que se mostram bobos ou superficiais logo são esclarecidos, para tudo há um bom motivo.

De cara, somos apresentados a dois militares que parecem esquecidos no meio do nada do Iraque, após o fim da guerra ter sido declarado. George Bush declarou seu país vitorioso e todos estavam indo embora. Mas um obstinado atirador mostra que não se importa com o fim do conflito, algo o motiva a permanecer em campo, com o rifle em punho. Os tais desgarrados encontram uma cena suspeita, com uma equipe de construção de um oleoduto morta.

É provável que tenha algum atirador à espreita, e cabe a eles esperar. O Sargento Matthews (John Cena, de Pai em Dose Dupla, 2015) é o sniper americano, sempre com o Sargento Isaac (Aaron Taylor-Johnson, de Animais Noturnos, 2016 – acima) como olheiro na retaguarda. Os dois estão em um país que não é o deles, sem apoio algum, o que levanta questões que parecem ser evitadas pelos norte-americanos. O filme chegou a levantar polêmica sobre uma possível apologia a terrorismo, o que é besteira. Mas é bem possível que, no meio da sessão, você se pegue pensando para quem torcer.

Discussões éticas à parte, Na Mira do Atirador é uma obra de ação que acaba não se aprofundando nos pontos levantados. Mas, graças a Liman e a Taylor-Johnson, principalmente, consegue cumprir sua função: divertir. E é bem objetivo, contando sua história em menos de noventa minutos. Só não pode confundi-lo com a obra-prima do Pink Floyd.

John Cena faz o colega de Taylor-Johnson

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The Tick volta à telinha em tons mais sombrios

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Criado em 1986 para ser uma paródia dos super-heróis da época, The Tick conseguiu uma boa base de fãs, se tornando um daqueles fenômenos cult que, vira e mexe, aparecem no mundo do entretenimento. Depois de ser levado à TV em uma série animada entre 1994 e 1996, ele teve sua primeira versão com atores, estrelada por Patrick Warburton (de Ted 2, 2015), que trazia coadjuvantes impagáveis como a Capitã Liberdade, Batmanuel e o inseparável companheiro Arthur.

Devido a problemas que só acontecem com os executivos da Fox, por mais que a série fosse aprovada por público e crítica, essa versão de The Tick teve apenas nove episódios antes de ser descontinuada. Dezesseis anos depois, o serviço de streaming da Amazon decidiu trazer o personagem de volta em uma nova série que, com pouquíssimas exceções, guarda poucas semelhanças com sua antecessora. Se a versão de 2001 era, basicamente, uma sitcom estrelada por super-heróis, a versão de 2017 tem pouco daquele humor escrachado e traz tons bem mais sombrios para a personagem.

A nova versão de The Tick tem como estrela principal não o herói superforte, invulnerável, desmemoriado, propenso a discursos grandiloquentes e sem muita noção da realidade vivido por Peter Serafinowicz (de Guardiões da Galáxia, 2014, e Rick and Morty). Aqui, a história gira em torno de Arthur (Griffin Newman, de Vinyl – acima) e sua obsessão em provar que o Terror (Jackie Earle Haley, de A Torre Negra, 2017), vilão que o mundo acredita estar morto há anos e que foi responsável pela morte de seu pai, não só está vivo como comanda o crime na cidade onde habitam.

Além disso, Arthur acredita que Terror está preparando um plano que marcará sua volta de maneira catastrófica. Infelizmente, diferentemente de diversas pessoas que habitam esse mundo, Arthur não tem superpoderes ou quaisquer habilidades especiais, sendo apenas um contador que, em sua busca pelo que acredita ser a verdade, tromba com um traje que lhe concede habilidades especiais. E no Tick, o único que parece acreditar nele.

Com a exceção de algumas sequências que prestam homenagens a aquela, essa nova versão de The Tick é bem mais séria e, sejamos francos, menos divertida do que sua predecessora. Apesar de ainda ser uma série sobre super-heróis vivendo em um mundo muito parecido com o nosso, quase toda a comicidade focada no dia a dia dessas pessoas foi descartada. O foco aqui é, em grande parte, a forma como Arthur lida com as consequências de sua perda, os problemas psicológicos e psiquiátricos que isso gerou e como as pessoas à sua volta lidarão com isso, especialmente sua irmã Dot (Valorie Curry, de Bruxa de Blair, 2016 – acima), uma paramédica e estudante de medicina que acredita que Arthur está voltando às alucinações que atormentaram sua adolescência e que também tem alguns segredos que prefere esconder do irmão. Até mesmo o próprio Tick, praticamente o único alívio cômico presente, tem sua sanidade colocada em xeque, de maneira mais profunda do que em sua série anterior.

Toda essa abordagem torna a nova versão de The Tick muito mais densa, mas não menos atraente. Todos os atores levam seus papéis a sério na medida certa e têm uma performance convincente. As caracterizações estão bem feitas e, se há um ou outro problema nas cenas com CGI – e há –, eles não incomodam e devem ser superados na medida em que um orçamento mais folgado seja liberado para a segunda temporada que, apesar de ainda não ter sido anunciada, deve acontecer. Há ainda problemas na tradução do Amazon, que hora chama o personagem Superion por seu nome original, ora o traduz para Superia. Outro incômodo menor.

Jackie Earle Haley quase não é percebido debaixo de tanta maquiagem e figurino

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Cinema australiano nos traz O Acampamento

por Marcelo Seabra

Filmes de terror sobre retiros no campo e gente acampando são comuns, e podem facilmente descambar para a matança desenfreada. Não é mesmo, Jason? Por isso, é grande a satisfação quando aparece uma obra como O Acampamento (Killing Ground, 2016), que leva seus personagens a sério e não cria situações mirabolantes. A estreia do diretor e roteirista Damien Power num longa-metragem é discreta, daquelas que dão a falsa impressão de serem simples e fáceis de fazer.

O filme acompanha um casal que vai passar um fim de semana à beira de um lago, numa paisagem idílica. Chegando lá, descobrem que não são os únicos, mas ninguém sai da outra barraca. Paralelamente, vamos conhecendo mais personagens e o quadro vai se formando. Montada de maneira inteligente, fugindo da cronologia, a obra exige um mínimo de atenção de seu público.

Os cenários australianos são bem convidativos e propícios a um mistério. Dos vários filmes que saíram desse filão, temos Wolf Creek (2005) como provável exemplo mais famoso, que deu origem a continuações e até a uma série. Mas não podemos nos esquecer dos que mostram embates entre as pessoas da cidade e os locais, caso da refilmagem Doce Vingança (I Spit on Your Grave, 2010) e do mais famoso Amargo Pesadelo (Deliverance, 1972).

Pois é com esse último que O Acampamento divide características, apenas em menores proporções. O elenco, prioritariamente australiano, tem pouca fama fora, mas é bem competente e tem muita experiência. O fato de não conhecermos aqueles rostos é até interessante, já que não criamos expectativas. E, se o começo é mais contemplativo, marcado por silêncios, do meio em diante o ritmo acelera e a ação se torna mais envolvente. O resultado, não à toa, chamou a atenção em Cannes e já pode ser conferido nos cinemas.

Não se engane: as coisas ficarão difíceis

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Pennywise volta à vida no novo It

por Marcelo Seabra

As adaptações das histórias de Stephen King chegam ao Cinema e à TV num volume tão grande que é preciso peneirar bem para chegar às de qualidade. A boa notícia é que a mais recente a entrar em cartaz, It – A Coisa (2017), é uma das melhores. E é talvez aquela que melhor leva às telas o clima criado pelo autor, com todos os sentimentos que vêm à tona quando lemos seus livros.

A versão para a TV, de 1990, posteriormente editada como filme, causou uma impressão forte em quem a assistiu em grande parte devido ao ótimo trabalho de Tim Curry. O ator deu vida ao vilão e ficou marcado como um dos grandes pesadelos a assombrar a todos nós. Mas, de uma forma geral, não era um filme brilhante, e perde a graça em sua segunda metade.

Dessa vez, temos Bill Skarsgård (acima) como Pennywise e é importante ressaltar que ele não deixa nada a dever a Curry. Visto recentemente em Atômica (Atomic Blonde, 2017) e na franquia Divergente, o filho de Stellan e irmão de Alexander já conquistou identidade própria e é um dos novos talentos a acompanhar. Ele faz um palhaço ameaçador que, até quando tenta ser simpático, tem um quê que incomoda. Seu uso vocal é fantástico, compondo o personagem nos mínimos detalhes, e ele ainda conta com um figurino impecável.

A trama nos apresenta a quatro garotos em vias de entrarem nas férias de verão e que, mesmo assim, não ficam livres das ameaças dos valentões da escola. Por esse interesse em comum, digamos assim, eles acabam se aliando a outros três e formam o “Grupo dos Perdedores”. E há outra coisa que os une: visões macabras trazendo à vida os piores pesadelos deles, geralmente personificados por um palhaço. Eles logo fazem a associação às crianças desaparecidas da cidade e entendem que são aqueles que devem parar essa ameaça.

Outro grande trunfo desse novo It é o grupo de jovens atores (incluindo Finn Wolfhard, de Stranger Things) e a relação entre eles. Depois de muito laboratório, eles realmente ficaram próximos, chegando a afirmar em entrevistas que as filmagens foram os melhores três meses de suas vidas. Esse laço é fundamental para vender a história e nos remete a outros projetos bem-sucedidos, como Os Goonies (1985), Super 8 (2011) ou o óbvio Conta Comigo (Stand By Me, 1986), também baseado na obra de King.

Como de costume na obra do mestre do terror, não faltam sustos e situações de tensão, muito bem entrecortados por momentos de humor. Mas isso não é o principal: há vários temas sendo desenvolvidos e o roteiro o faz lindamente. O amadurecimento, as dúvidas da juventude, o primeiro amor, a importância da amizade e a superação de traumas e dificuldades são alguns deles. Não importa se com crianças, como em Conta Comigo, ou se com adultos, como em Um Sonho de Liberdade (The Shawshank Redemption, 1994), alguns desses assuntos estão sempre presentes. A criatura que espreita acaba sendo uma metáfora, aqui mais clara que o usual.

Descoberto por Hollywood com o curta Mamá (2008) e o longa que o expande, Mama (2013), o diretor argentino Andrés (ou Andy) Muschietti entende o peso de seu elenco e sabe a hora de mostrar e a de sugerir. A fotografia de Chung Chung-hoon (de Segredos de Sangue, 2013) explora bem desde os parques e lagos até o esgoto e seus cantos escuros, passando por uma boa e velha casa assombrada. E Benjamin Wallfisch (de Annabelle 2, 2017) dosa muito bem sua trilha sonora, elegante e nada invasiva. As músicas populares que aparecem, como as de The Cure e XTC, são escolhidas a dedo e fogem do habitual.

Existe apenas um porém que pode desanimar aqueles que não conhecem o livro de King. Como ele é enorme, não daria para fazer apenas um filme de duas horas com todas as passagens necessárias, mesmo com alterações e simplificações. Nem na minissérie da TV, com mais de três horas de duração, coube tudo. Por isso, os envolvidos optaram por dividir a história em duas partes. O início da produção do capítulo 2 é esperado para março de 2018 com a mesma equipe. Já aguardamos ansiosamente.

Tim Curry foi o Pennywise de 1990

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Charlize Theron quebra tudo em Atômica

por Marcelo Seabra

Quantos filmes podemos lembrar que têm, como razão de ser, a busca por uma lista? “Caiu em mãos erradas a lista com os nomes de nossos espiões e todos correm risco”. Esse é um fiapo de trama bem batido que pode ou não ser bem utilizado. Mais um longa que se enquadra nessa relação é Atômica (Atomic Blonde, 2017), novo veículo para Charlize Theron mostrar que, além de saber atuar, é muito boa de briga.

Partindo do ponto mencionado, a agente britânica Lorraine Broughton (Theron, de Velozes e Furiosos 8, 2017) chega em Berlim pouco antes da derrubada do muro para encontrar a tal lista roubada de um colega/romance assassinado. Lá, ela é informada que terá que trabalhar com o responsável local, o pouco confiável David Percival (James McAvoy, de Fragmentado, 2016 – abaixo), e ainda precisará descobrir a identidade de um agente duplo. Engrossando o elenco, temos John Goodman, Toby Jones, Eddie Marsan, Til Schweiger, Sofia Boutella e Bill Skarsgård (o novo Pennywise de It).

Tudo isso é desculpa para o diretor David Leitch colocar em prática todas as suas técnicas de ação. Depois de uma longa carreira como dublê e coreografar diversas lutas e perseguições, e até dirigir cenas de John Wick: De Volta ao Jogo (2014), Leitch partiu para novos desafios. E essa parte em Atômica é impecável. O diretor demonstra ter um domínio perfeito do que mostrar, o quanto mostrar, e como posicionar atores, câmera e os demais objetos de cena. A tensão e o suspense são bem trabalhados e tudo fica crível, e até surpreendente. E o cansaço e os hematomas dos personagens são muito bem mostrados, tornando as coisas mais reais.

Depois de roteirizar 300 (2006) e sua continuação (2014), Kurt Johnstad partiu para outra revista em quadrinhos, The Coldest City, de Anthony Johnston e Sam Hart. Inicialmente, o título do filme seria esse também, mas Atômica (ou Atomic Blonde) chama mais a atenção para a força de sua protagonista, talvez numa tentativa de valorização da mulher. O problema é que, se por um lado a obra parece ter esse nobre propósito, por outro ele incorre em pecados contrários: em fetichizar duas belas mulheres que se envolvem e no corpo da protagonista. E vai se alternando entre as duas posturas.

Todos os homens do roteiro parecem ser machistas que não acham possível que uma mulher consiga cumprir uma missão complicada como aquela. Mas os superiores de Lorraine a escolheram, e ela mostra dar conta do recado. Ou seja: o machismo parece estar presente na frente das câmeras, na forma como os personagens pensam. Mas os principais problemas do roteiro são a forma como ele complica algo simples, fazendo parecer que tem muito mais elementos envolvidos na trama do que de fato tem, e a sua estrutura, que depende de voltar o tempo todo numa sala onde acontece um interrogatório que dura toda a sessão.

Se Leitch acerta nas cenas de ação, outro ponto alto é a trilha sonora. Mesmo um pouco previsíveis, se você é ligado em música, as faixas escolhidas funcionam muito bem. Desde o trailer, com Blue Monday (com New Order e na versão do Health), e vêm Depeche Mode, Queen, Clash, Nena, Siouxsie & The Banshees, David Bowie, entre outros. Ah, e como diretor do segundo Deadpool, não poderia faltar uma brincadeira com o saudoso George Michael, aqui em carreira solo. Entre erros e acertos, Atômica é um filme divertido que acaba cansando e se beneficiaria de uma estrutura mais direta e menos minutos de exibição.

Charlize Theron sabe o que faz

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Death Note não decepciona só fãs

por Marcelo Seabra

Você conhece o Ryuk? Se sim, você deve ser um dos muitos fãs pelo mundo do mangá Death Note ou do anime que veio na sequência. Se não, prepare-se para conhecer um universo bem interessante, no qual um caderno sela o destino de quem tem seu nome escrito nele. A Netflix produziu e já disponibilizou a adaptação desse material para o Cinema. Mas os comentários têm sido impiedosos. É uma pena que, se a proposta é promissora, a realização deixa muito a desejar.

Death Note (2017), o filme, é um daqueles casos em que o falatório a respeito pegou tão pesado que acabou aumentando o público, que ficou curioso e foi conferir. E ele não merecia a metade dessa exposição. Longe dos extremos, o resultado fica no meio, desperdiçando ideias e sequências criativas com personagens rasos e até ridículos e situações que poderiam ter ido longe, mas optaram pela falta de sentido. Os fãs da obra de Tsugumi Ohba e Takeshi Obata não gostaram das alterações e se revoltaram, mas a verdade é que não se trata de um problema de adaptação, já que essa liberdade entre meios deve existir. É só um filme ruim.

Assim como aconteceu com A Vigilante do Amanhã (Ghost in the Shell, 2017), o original japonês ganha vida com elenco prioritariamente americano e as críticas já começam no anúncio da produção. Nat Wolff (famoso por Cidades de Papel, 2015 – acima) vive Light Turner, um estudante que tem sua vida mudada quando cai em seu colo (literalmente) um caderno misterioso. Logo em seguida, Light se desespera ao ver uma criatura bem esquisita – e muito bem-feita digitalmente – que se diz ser algo como um deus da morte. Basta escrever o nome de um desafeto no caderno, pensando na pessoa, e ela morrerá. Dá até para especificar a causa da morte.

Essa premissa dá tantas possibilidades que o início do filme chega a ser excitante. Quantas questões bacanas poderiam ser discutidas, começando pelo poder de decidir entre vida e morte! Ela cria expectativa e segue um caminho interessante até que percebemos dois problemas graves: a enorme proporção que toma o romance dos personagens e o surgimento de um tal detetive (Lakeith Stanfield, de Corra!, 2017) que leva a história ao fundo do poço. Após uma rápida busca pela internet, percebe-se que os personagens têm várias diferenças com seus correspondentes no mangá, e todas parecem puxar a nova obra para baixo.

O namoro de Light e Mia (Margaret Qualley, de Dois Caras Legais, 2016) vira o centro do filme e as decisões que eles tomam giram em torno disso. É uma bobagem muito grande perder tanto potencial para enfatizar o que qualquer filminho tem, além de tornar as ações dos dois mesquinhas. E L, o tal detetive? Na fonte, ele seria quase um Sherlock moderno, o rei das deduções. Na tela, o que vemos é um adulto mal resolvido que age por impulso e tem uma tara por balinhas, mas nem sabe como colocá-las na boca sem derramar metade. Com atitudes estapafúrdias, como pular com os dois pés numa cadeira, ao invés de se sentar, ele irrita e chegamos a torcer para que morra logo.

A resolução, afobada, não amarra bem as coisas e fica clara a sensação de que os roteiristas não sabiam o que fazer. Light deveria ser mais inteligente, frio e prático, mas fica só no perfil “romântico medroso”. Os irmãos Charley e Vlas Parlapanides escreveram o primeiro esboço nos idos de 2007, quando o mangá tinha acabado de ser publicado (2003-2006). Depois de trocas de estúdio e profissionais envolvidos, a Netflix assumiu a produção e contratou Jeremy Slater para reescrever. Os três foram creditados como roteiristas e o produto ficou nessa bobagem.

Pecado maior é aproveitar mal Willem Dafoe (de Cães Selvagens, 2016), que faz a voz de Ryuk e acaba limitado a algumas frases espertinhas e risadinhas que ecoam. Shea Whigham (de Kong, 2017), quase um Kurt Russell mais novo, não cansa de ser enganado como o pai de Light. Apesar de uns curtas e até longas elogiados, o diretor Adam Wingard é o responsável pelo recente Bruxa de Blair (Blair Witch, 2016), o que não conta pontos. Ele disse, em entrevistas de divulgação, que a Netflix estaria disposta a lançar um Death Note 2, só dependeria das pessoas assistirem ao primeiro. Veremos o que o futuro guarda para essa possível franquia.

Ryuk é um mentor e um vilão ao mesmo tempo

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A Torre Negra finalmente chega aos cinemas!

por Marcelo Seabra

As adaptações de textos de Stephen King praticamente formam um subgênero, tamanho é o volume e a frequência com que chegam às telas – grandes e pequenas. É comum vermos duas tentativas com o mesmo livro (como foi com Carrie, a Estranha, e com O Nevoeiro) e até continuações toscas que nada têm a ver com o original (como com Colheita Maldita). Uma obra permanecia intocada: a série de oito livros A Torre Negra, tida como inadaptável. Ficou anos de lá para cá, passando nas mãos de vários diretores, roteiristas e produtores. Enfim, em 2017, a espera chegou ao final.

Coube ao dinamarquês Nikolaj Arcel (de O Amante da Rainha, 2012), com um roteiro assinado a oito mãos (inclusive as dele), cuidar da adaptação. Que, na verdade, não é exatamente uma adaptação, mas uma apropriação dos personagens em uma outra realidade. Atualmente em cartaz, A Torre Negra (The Dark Tower, 2017) dá vida ao Pistoleiro e ao Homem de Preto, os icônicos antagonistas do mundo criado por King e desenvolvido por mais de 30 anos.

Uma coisa sobre o longa é indiscutível: o elenco é fantástico. Idris Elba (da série Luther) é um Pistoleiro perfeito, com todos os trejeitos e atitudes que se pode esperar, e uma certa doçura que era imprevisível. Matthew McConaughey (de Interestelar, 2014) passa a ironia e a maldade necessárias ao vilão. E, mesmo com esses acertos, a palavra que melhor define o filme é decepção. Se Elba consegue conferir um pouco de humanidade a seu personagem, o mesmo não se pode dizer do colega, e a culpa é totalmente do roteiro – e talvez do responsável pelo cabelo dele, que parece artificial como sua personalidade.

É criado um draminha adolescente para dar o pontapé inicial, e o fio condutor é o jovem Jake (Tom Taylor, de The Last Kingdom). A cara é de romance para jovens adultos, mais um Divergente da vida. Pesadelos fazem com que Jake chegue ao Mundo Médio e encontre aqueles que povoam sua mente. Uma coisa que King sabe bem, e Tolkien, Lewis, Martin e companhia também, é que você deve estipular regras ao criar um universo fantasioso. Senão, fica muito fácil tirar da manga situações e soluções, e é isso que acontece aqui. O garoto é uma variação do Danny Torrance de O Iluminado e descobre as coisas junto com o público. A luta entre Roland e Walter parece ser milenar, como a do bem contra o mal, mas nunca foi resolvida sabe-se lá porquê.

E o objetivo do vilão? Governar um mundo morto, cheio de monstros. É o que fica claro. Pior do que isso, só o conflito mequetrefe que surge para colocar em xeque a amizade do Pistoleiro com o garoto. O que Roland busca: salvar a Torre Negra ou se vingar de Walter? Tanto faz, gente, o fim será o mesmo se ele for bem-sucedido. E fim é o que o público espera ansiosamente, após pouco mais de 90 minutos que parecem uma eternidade. Nem os easter eggs sobre a carreira de King animam os fãs. E os não iniciados vão vagar por mundos distantes durante a sessão, e esquecerão o que viram assim que as luzes se acenderem.

Para quem se interessar pelos livros…

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Nova adaptação de O Nevoeiro bebe pouco na fonte

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Publicado pela primeira vez em 1980, na coletânea Dark Forces, e republicado cinco anos depois em Tripulação de Esqueletos, O Nevoeiro, de Stephen King, é um estudo psicológico sobre o que acontece quando pessoas muito diferentes entre si são forçadas a conviver em isolamento e no que farão em sua tentativa de sobreviver a uma ameaça que lhes foge à compreensão. No caso, ela se trata de um misterioso nevoeiro que cobre a cidade de Bridgton, no Maine, e quem se aventura nele jamais volta, já que ele traz predadores que se parecem com insetos distorcidamente gigantes e famintos. Um grupo de habitantes se tranca em um supermercado e tenta sobreviver até que o nevoeiro se dissipe ou alguém venha em seu resgate. Claro que isso se torna muito difícil quando os membros desse grupo começam a brigar entre si e algumas bizarrices se desenrolam, como é comum na obra de King.

Em 2007, The Mist chegou ao cinema pelas mãos de Frank Darabont, talvez o diretor que melhor tenha adaptado Stephen King no cinema (são dele também Um Sonho de Liberdade e À Espera de um Milagre). Estrelado por Thomas Jane, o filme é bem fiel ao conto de King e apresentou um final muito superior ao conto. Infelizmente, é daqueles filmes que não obteve muito sucesso de público. Agora, é uma série e chegou à Netflix, depois de ter sua primeira temporada exibida pelo canal americano Spike. Apesar de dividir o mesmo título do conto e de se aproveitar de algumas de suas ideias, essa nova versão da história guarda muito poucas semelhanças com o texto de King.

A série O Nevoeiro começa com Bryan Hunt (Okezie Morro, de Guerra Mundial Z, 2013) acordando no meio de uma floresta. Bryan está sofrendo de amnésia e, bem rapidamente, vê um grande nevoeiro se aproximando. Ele, então, corre em direção à cidadezinha de Bridgeville. Ela, no entanto, logo será envolta pelo nevoeiro e Bryan se verá preso ali.

Antes disso, no entanto, somos apresentados aos protagonistas da série. Kevin (Morgan Spector, de A Entrega, 2014) é um escritor que vive na cidade com sua esposa Eve (Alyssa Sutherland, de Vikings) e a filha Alex (Gus Birney), uma adolescente cujo melhor amigo é Adrian (Russel Posner), o típico adolescente moderno cuja sexualidade não-definida o torna um pária na escola onde frequenta. Alex tem uma queda por Jay (Luke Cosgrove), filho do xerife Connor (Darren Pettie), que representa tudo o que Adrian mais odeia, já que, aparentemente, é apenas mais um valentão pertencente ao time de futebol da escola. Para sua infelicidade, a atração de Alex por ele é recíproca e isso trará grandes consequências para a vida da menina.

Temos ainda a presença de Mia (Danica Curcic), uma criminosa de passado misterioso e, fechando o elenco principal, o casal formado por Ben (Derek McGrath, da nova versão de Carrie, A Estranha, 2013) e Nathalie (a veterana Frances Conroy, de séries como How I Met Your Mother e American Horror Story). Nathalie é daquelas senhoras que parecem que ainda vivem na década de 1960 e acredita ter uma ligação muito forte com a “Mãe Natureza”. Isso faz com que ela se torne uma personagem importante nessa primeira temporada da série, na medida em que acredita que o nevoeiro é uma forma da natureza punir os habitantes daquela cidade por seus pecados.

Inicialmente, as pessoas de Bridgeville pensam que aquele é um nevoeiro normal, como todos os outros. No entanto, à medida em que quem entra nele não volta e morre de formas horríveis, o pânico toma conta da cidade e as pessoas acabam isoladas em diversos locais: uma igreja, um hospital, um shopping. A partir daí, é uma corrida pela sobrevivência. Para Kevin, há ainda a questão de tentar atravessar a cidade para se reunir à sua família sem ser morto pelo que quer que se esconda no nevoeiro.

Apesar de guardar algumas semelhanças com o conto original, essa nova versão de o Nevoeiro se encaixa naquelas produções que se baseiam apenas levemente na história que lhe deu origem. Nenhum dos personagens aqui apresentados está no conto e, consequentemente, suas personalidades e histórias de vida são todas originais. Há uma tentativa aqui e ali de relacioná-las aos originais – Nathalie por muitas vezes lembra a fanática religiosa Sra. Carmody (vivida por Marcia Gay Harden na versão de 2007), ainda que a origem do fanatismo de Nathalie seja bem outra – e a causa do nevoeiro parece ser a mesma do conto, mas isso não fica claro ao longo da série.

A própria natureza do nevoeiro aqui difere daquela apresentada no conto e no filme de 2007. Enquanto nos dois primeiros as ameaças são de origem extradimensional, aqui elas assumem um caráter mais sobrenatural, ainda que isso não fique exatamente claro. Isso pode se dar também, suponho, pelo fato da Spike ter um orçamento bem limitado para seus efeitos especiais que, em muitos momentos, se mostram bem fracos, quase no nível do que se vê nas produções do Syfy ou nas novelas da Globo. Nada que comprometa a qualidade geral da série, mas chega a incomodar em alguns momentos.

Apesar disso, a série tem seus bons momentos e os efeitos do isolamento – especialmente no shopping – sobre a mente dos ali isolados são razoavelmente bem conduzidos. Há, ainda, algumas viradas de roteiro interessantes, que compensam o fato de alguns personagens parecerem unidimensionais e estereotipados. A primeira temporada de O Nevoeiro foi disponibilizada no Netflix na última sexta-feira, dia 25 de agosto. Rumores sobre uma segunda temporada já começaram, mas, até o momento, nada foi anunciado.

O supermercado do conto aqui vira um shopping

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