Está em cartaz e merece ser conferido o longa que conta um fato real e estarrecedor, muito discutido até hoje. Ângela (2023) se debruça sobre os últimos dias da vida de Ângela Diniz, socialite mineira assassinada em meados da década de 70. Com interpretações fortes, o filme faz um bom trabalho ao construir uma relação tóxica e mostrar como as coisas podem facilmente sair dos eixos quando uma das pessoas envolvidas é completamente desequilibrada.
Insatisfeita em um casamento de quase dez anos, Ângela pediu o desquite, aceitou perder a guarda dos filhos para conseguir se separar e acabou indo parar no Rio de Janeiro. Lá, se envolveu com o famoso colunista social Ibrahim Sued e conheceu aquele que seria o seu algoz, Raul “Doca” Street. A vida de Ângela teve outras situações complicadas ou mal explicadas, como o assassinato do caseiro ou ela sequestrar a própria filha, mas os realizadores do filme optam por focar no relacionamento dela com Raul, que por algum motivo não é chamado de Doca, como era conhecido.
Por alto, boa parte dos brasileiros, principalmente os mineiros, deve conhecer o caso, que volta e meia ganha os holofotes por discussões jurídicas. Um conhecido podcast recente narrou os fatos detalhadamente, mas é claro que não caberia tudo em um longa metragem. Talvez por julgar que todos conheçam as informações periféricas, o roteirista Duda de Almeida (de séries como As Aventuras de José & Durval) exclui muita coisa, e algumas informações são jogadas para o espectador pela metade, sem nenhuma explicação.
Vivendo a protagonista, Ísis Valverde faz um ótimo trabalho – exceto quando chora, soando exagerada e falsa. Com uma personagem muito mais rica que as das novelas que faz, a atriz usa e abusa de seu carisma, beleza e sotaque, nos dando uma ótima ideia de como Ângela devia ser. A outra metade da complicada relação é interpretada por Gabriel Braga Nunes, outra figura excelente que traz humanidade e violência na mesma medida para o assassino, nos mostrando que monstros não necessariamente têm a aparência monstruosa. Pelo contrário, podem ser galantes e sedutores. Em papéis menores, temos os também competentes Bianca Bin, Alice Carvalho, Gustavo Machado, Carolina Manica e Emílio Orciollo Neto.
Tendo tido a experiência de filmar a vida de Elis Regina em Elis (2016), o diretor Hugo Prata ainda comandou oito dos 13 episódios de Coisa Mais Linda, série ficcional que retrata o mesmo período vivido por Ângela e tem muitas similaridades com a história dela. Uma grande diferença entre as obras, no entanto, é a trilha sonora: enquanto a série traz faixas clássicas da MPB e samba, o filme apresenta músicas instrumentais genéricas e sem qualquer apelo.
A sessão de Ângela é justificada pela química entre o casal principal, que pega fogo, e pela história real da socialite covardemente assassinada. Inteligentemente, Prata deixou de fora partes mais picantes da vida da biografada, evitando que algum canalha pudesse justificar seu assassinato por seu estilo de vida. Ângela vivia da forma que queria, sem dar satisfações, e isso causava certo escândalo na sociedade brasileira conservadora e hipócrita dos anos 70. Por isso, ela pagou um preço muito alto.
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