Não! Não Olhe! é o novo terror de Jordan Peele

Depois de assinar Corra! (Get Out, 2017) e Nós (Us, 2019), o até então comediante Jordan Peele se tornou um diretor e roteirista a se acompanhar. Por isso, a expectativa em torno da estreia de Não! Não Olhe! (Nope, 2022) é grande e essa semana o público brasileiro poderá formar sua opinião. Fugindo-se das desnecessárias comparações com os longas anteriores, pode-se dizer que o novo trabalho de Peele parte logo para a questão que quer apresentar, sem se preocupar com os porquês, e cria um ambiente de suspense bem interessante.

A primeira coisa que chama a atenção no Cinema de Peele é o fato de ele ter protagonistas negros em filmes com histórias universais, e não voltadas para o público negro. Fora Corra!, que fazia terror com questões ligadas ao racismo, os demais apenas contam com tramas intricadas, que fazem o espectador sair com a pulga atrás da orelha. Mas, importante notar, o fato deles serem negros traz mais nuances para as situações vistas. Aqui, temos o oscarizado Daniel Kaluuya (de Judas e o Messias Negro, 2021) liderando um elenco ainda mais diverso, mostrando que é possível fazer uma boa obra sem precisar apelar para atores brancos padrões, como fazem vários diretores incensados.

Aproveitando para homenagear o veterano Keith David (de Dois Caras Legais, 2016), o longa começa com coisas caindo do céu e causando estragos. Mais adiante, os personagens vão descobrir que não se tratava de um avião soltando pedaços, nem nada do gênero. Kaluuya faz um sujeito retraído, com suas razões para a clara falta de ânimo, enquanto Keke Palmer (de As Golpistas, 2019) faz um ótimo contraponto como a irmã animada e conversada. Até demais, o que gera momentos engraçados e discussões entre os dois.

O ritmo no início é lento e o filme não se apressa para apresentar seus personagens, com foco principalmente nos irmãos. A relação entre eles fica complicada pelo fato dele ser mais quieto e ela ser bem irritante, mas eles se aproximam ao viverem algo maior do que eles. Na vizinhança, há um ex-astro mirim (vivido por Steven Yeun, de Minari, 2020) que se torna um caubói asiático, o que quebra um bocado a figura à qual estamos acostumados. Brandon Perea (da série The OA) faz um vendedor mal-humorado de uma loja de tecnologia e Michael Wincott (de Hitchcock, 2012) é um diretor do audiovisual que fecha o grupo principal.

O título nacional perde o humor que o original traz em si. Além de mais careta, o nosso título é mais óbvio sobre o que está sendo tratado, esfregando na nossa cara o que os nomes dos capítulos só insinuam. Os cavalos treinados pelos Haywoods são quase astros de Hollywood, por aparecerem em filmes e comerciais, fazendo parte de espetáculos que atraem a atenção de todos. Quanto pior, maior é o apelo, como o trecho do macaco Gordy deixa claro. E esse parece ser o ponto que interessa a Peele: o fato de darmos muita atenção a desgraças, o que pode fazer com que elas se multipliquem. Melhor não olhar.

Jordan Peele segue trilhando um original caminho pelo terror

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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