This Is Us chega ao fim (sem spoilers)

O primeiro episódio, exibido originalmente em setembro de 2016, deixou o público um tanto perdido, apresentando linhas temporais distintas sem que percebamos, para no final tudo fazer sentido. E assim, com maior ou menor grau de complicações, foi This Is Us por seis temporadas, indo e voltando no tempo para nos apresentar todas as nuances da família Pearson. E agora, que a série acabou, há um bocado de gente órfã por aí, sem saber como superar essa perda.

A série tinha nada menos que cinco personagens principais, e cada um desenvolve o seu próprio núcleo, com outras tantas pessoas chegando em cada um. Um dos principais méritos da atração foi conseguir dar importância e peso dramático a cada. É raro perceber alguém que foi descartado, logo todos reaparecem. Os diferentes momentos históricos mostrados em sequência também ajudam a criar expectativa, até suspense, e vamos recebendo peças de um longo e prazeroso quebra-cabeça. As roupas, cabelos e figurino (e bigode) ajudam a reforçar as épocas.

O elenco tem nomes mais e menos conhecidos – a maioria ficou conhecida após a estreia da série. Milo Ventimiglia é provavelmente quem, dos principais, tem a carreira mais longa no Cinema e na televisão. Lembrado pela série Heroes e como o filho de Rocky Balboa (em 2006 e 2018), ele já dublou super-heróis em séries e recentemente protagonizou Meu Amigo Enzo (The Art of Racing in the Rain, 2019), e já tem uma nova série engatilhada: The Company You Keep.

Ventimiglia vive Jack Pearson, um ex-soldado que volta da Guerra do Vietnã tentando colocar sua vida no lugar e, entre um bico ou outro, conhece Rebecca. Entra em cena Mandy Moore, cantora que se aventurou como atriz e deu muito certo. Começando por longas melosos (como Um Amor Para Recordar, 2002), ela trabalhou em várias séries, também como dubladora. No Cinema, um ponto alto é a comédia Galera do Mal (Saved!, 2004). A química entre Ventimiglia e Moore nos leva a crer que de fato os dois foram feitos um para o outro e logo terão uma família. 

Revezando-se com esse casal, temos as histórias dos três filhos: Kevin, Kate e Randall. Mais velho e ligeiramente problemático, Kevin (Justin Hartley, o Arqueiro Verde de Smallville) vive diversas desventuras amorosas enquanto tenta se encontrar, batalhando na profissão de ator. Kate (Chrissy Metz, de Superação, 2019), a irmã do meio, é assistente de Kevin e vive para a família até que percebe que precisa ter uma vida própria. E Randall (Sterling K. Brown, de Hotel Artemis, 2018), que veio por último, é invariavelmente a voz da razão, às vezes um pouco arrogante, sendo sempre apontado como “o filho que deu certo”, com uma boa profissão e uma bela família.

Partindo desses cinco personagens, temos diversas histórias sendo criadas e, o mais impressionante, todas são amarradas. O criador de This Is Us, Dan Fogelman, trabalhou a ideia por muito tempo até chegar ao resultado que vemos na televisão. E tamanho esforço deu frutos: além de diversas indicações a prêmios e muitas vitórias, a série é uma das melhor avaliadas da atualidade e muito comentada em redes sociais. Certamente, já garantiu empregos aos envolvidos. Fogelman, com trabalhos medianos a fracos como diretor e roteirista (a exceção é Amor a Toda Prova, 2011), fez aqui um nome na indústria.

Entre muitos pontos positivos da série, talvez o maior seja dar profundidade a seus personagens e fugir de saídas fáceis. Pouquíssimos momentos soam forçados, buscando um certo resultado dramático. Na maior parte do tempo, vemos seres humanos errando e acertando, e errando novamente, e assim por diante. Ao mesmo tempo em que cada um tem sua personalidade e características distintas, percebemos uma evolução. Randall, por exemplo, sempre se cobrou muito e não aceitava um resultado menor que excelente. E isso tem um preço: crises de ansiedade, ataques de pânico. Tudo isso vai sendo trabalhado.

A visão que os filhos têm dos pais também cresce. Por mais que os vejam como maravilhosos e perfeitos, os filhos vão conhecendo mais lados, dando no fim um ótimo equilíbrio. Como acontece com qualquer um. E as outras figuras que vão aparecendo acrescentam muito. Ron Cephas Jones (de Meu Nome É Dolemite, 2019) é responsável por momentos maravilhosos, e não à toa foi premiado por sua atuação como William. Tão interessantes quanto, temos outro veterano, Griffin Dunne (Nicky), além de Jon Huertas (Miguel), Susan Kelechi Watson (Beth), Chris Sullivan (Toby) e Alexandra Breckenridge (Sophie), para ficar nos coadjuvantes mais frequentes. E não podemos nos esquecer das crianças: alguns personagens, além da versão adulta, têm intérpretes diferentes para outras faixas etárias, todos ótimos.

Entre os que aparecem pouco, destaque para Gerald McRaney, que faz o médico de Rebecca, além de Denis O’Hare (Jessie) e Michael Angarano (Nick), que cresceu bastante desde seus tempos de Quase Famosos (Almost Famous, 2000). Muitos rostos reconhecíveis, como Dan Lauria (o pai do Kevin de Anos Incríveis), aparecem em menos capítulos, e são sempre boas surpresas. Há gente famosa também entre os roteiristas e os diretores dos episódios, com os próprios atores assumindo a cadeira aqui e ali. Diversidade, em frente e atrás das câmeras, é algo que não falta, e assuntos polêmicos e necessários são abordados na trama.

A trilha sonora é mais um ponto fantástico. Os temas originais ficaram a cargo do experiente Siddhartha Khosla, já indicado a três Emmys. E as músicas populares usadas não são menos que ótimas, ganhando a afeição do público de várias formas, ao mesmo tempo. Para uma série ter o impacto que This Is Us tem, são necessários muitos acertos juntos. E é exatamente por isso que, mesmo após a exibição do décimo oitavo episódio da sexta temporada, também conhecido como o último, This Is Us continuará a ser descoberta por milhares de pessoas que vão se apaixonar pelos Pearsons.

PS: Clique aqui para ouvir o Programa do Pipoqueiro sobre a série.

Sentiremos saudades…

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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