Robert Eggers recria os vikings em O Homem do Norte

Depois de visitar a Nova Inglaterra de 1630 e uma ilha do Maine do início do século XX, Robert Eggers radicalizou e foi à Islândia de 850 DC recontar uma lenda viking. Como o diretor tinha o desejo de contar uma história desse tipo e vinha buscando um projeto para trabalhar com o sueco Alexander Skarsgård, eles concordaram em realizar O Homem do Norte (The Northman, 2022), adaptação livre de uma lenda islandesa. Como é de se esperar, com bastante violência e um toque de nudez, buscando ser bem fiel ao que se sabe da época.

Tanto A Bruxa (The Witch, 2015) quanto O Farol (The Lighthouse, 2019) são filmes perturbadores, tecnicamente impecáveis e que deixam uma impressão marcante no público, que leva um bom tempo para digerir o que viu. O Homem do Norte é mais simples de acompanhar, com uma trama mais óbvia e direta. Nem por isso é um filme inferior ou esquecível. A história do príncipe Amleth serviu como inspiração para o Hamlet de Shakespeare. O bardo inglês apenas trocou uma letra de lugar para nomear seu trágico personagem.

O ponto de partida de Amleth é o assassinato de seu pai, o rei Aurvandil Corvo da Guerra, pelo tio, e sua busca por vingança. Há diferenças entre o filme e o registro histórico de Saxo Grammaticus, que escreveu tudo no século XIII. Para poder tomar liberdades e se manter fiel aos costumes da época, o diretor e roteirista Eggers contratou o escritor islandês Sjón, parceiro constante da cantora Bjork, com quem trabalhou no premiado Dançando no Escuro (Dancer in the Dark, 2000) e aqui, novamente.

O nórdico do título é vivido por Alexander Skarsgård, que usou muito de sua experiência na série True Blood para fazer um personagem forte e violento, até animalesco – características dos guerreiros Berserkir. Ele passa toda a sua vida sem ter intimidade com outro ser humano, focando-se no que o levaria a consumar a vingança contra o tio usurpador. Quase um Batman, aprendendo a lutar e desenvolvendo seu físico para se tornar uma arma. O trabalho do ator é de muita entrega, ele merece todos os elogios cabíveis.

No papel de mãe de Amleth, temos a sempre excelente Nicole Kidman, que foi esposa de Skarsgård em Big Little Lies. Outra mulher importante para a trama é a interpretada por Anya Taylor-Joy (de A Bruxa), uma escrava que vira uma aliada do príncipe. Quase uma versão mais jovem da mãe dele, são tipos físicos muito próximos. Quem se difere fisicamente, curiosamente, é o dinamarquês Claes Bang (o Drácula da série da Netflix), nascido mais próximo de onde o filme se passa. Talvez, ele destoe dos demais para enfatizar que é um filho ilegítimo do então rei.

E temos Ethan Hawke, o vilão da série do Cavaleiro da Lua, que prova mais uma vez o seu talento vivendo um rei cheio de nuances, passando longe do que vemos em contos de fadas. Eggers ainda convocou três dos atores que colaboraram com ele anteriormente para pontas: Willem Dafoe (de O Farol) e os “pais da Bruxa”, Kate Dickie e Ralph Ineson. Há momentos de O Homem do Norte, muito devido à belíssima fotografia, que lembram Game of Thrones, e outras comparações podem vir à cabeça. O poema O Corvo, de Edgar Allan Poe, passa pela mente, mesmo que levemente. Independente das referências, a obra de Eggers se sustenta muito bem e o diretor segue sendo um nome a se acompanhar.

O diretor foi mais ambicioso dessa vez e teve um orçamento maior

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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