Macbeth ganha nova vida no Cinema

Dentre os nomes mais famosos da literatura mundial, William Shakespeare é certamente um dos mais adaptados ao Cinema. E Macbeth é uma de suas peças principais, tendo pelo menos três encarnações bem relevantes na tela grande. Pois agora tem uma quarta, pelas mãos de Joel Coen, que pela primeira vez dirige um longa sem o envolvimento do irmão, Ethan. A Tragédia de Macbeth (The Tragedy of Macbeth, 2021) está disponível no Apple TV+.

Abusando de luz, sombra, contrastes e neblina, Coen faz uma obra com cara de teatro que volta e meia surpreende com uma fotografia em preto e branco belíssima assinada por Bruno Delbonnel (de A Balada de Buster Scruggs, 2018). E com algumas sacadas visuais geniais, como o bosque que anda. Como de costume, o diretor traz junto a maravilhosa esposa, a triplamente oscarizada Frances McDormand (de Nomadland, 2020), que dá um show como a conspiradora Lady Macbeth. E, no papel do protagonista masculino, temos ninguém menos que o também premiado Denzel Washington (de Um Limite Entre Nós, 2016).

O excelente casal principal ainda conta com o grande Brendan Gleeson (da série Mr. Mercedes) como o Rei Duncan, conhecido como justo e carismático. Todo o elenco, do qual se destacam Corey Hawkins (de Infiltrado na Klan, 2018) e Harry Melling (também de Buster Scruggs), é bem competente, dos mais aos menos conhecidos. E completa o quadro a inquietante trilha sonora de Carter Burwell (de A Grande Mentira, 2019), que acentua a tensão da história.

Para quem não conhece, Macbeth acompanha um habilidoso general que defende seu rei e sua Escócia natal com dedicação e força. Após uma campanha vitoriosa, no caminho de casa, ele e o colega Banquo (Bertie Carvel, de The Crown) passam por três bruxas que fazem duas previsões para Macbeth. Quando a primeira se cumpre, ele logo entra na expectativa pela segunda: se tornar o próximo rei da Escócia.

Washington e McDormand declamam os diálogos do bardo inglês com uma desenvoltura assombrosa, tornando o complicado texto mais palatável ao público. Uma observação cabível diz respeito à química entre eles: ela não existe. Os atores parecem ter se conhecido na tarde anterior. Numa outra versão recente, esta de 2015, temos Michael Fassbender e Marion Cotillard dando beijos apaixonados, pegando fogo entre insinuações sexuais.

Ainda lembrando o longa de 2015, o diretor Justin Kurzel e seus roteiristas preencheram os silêncios de Shakespeare com cenas muito bem construídas e cores vivas, encenando os horrores da guerra e dando maior fluidez à trama. Aqui, no roteiro de Coen, o desenvolvimento é mais brusco e as relações, mais frias. E a loucura que toma os personagens chega repentinamente, pecando na construção.

Joel Coen mostra, com esse A Tragédia de Macbeth, que até um trabalho menor seu é bem acima da média. E que é perfeitamente capaz de uma realização solo, sem o irmão. É sempre uma experiência fantástica ver Washington e McDormand em cena e eles são automaticamente inscritos na lista de prováveis indicados na temporada de premiações. E é uma pena não poder dar um Oscar ao criador da obra original, falecido há alguns séculos.

Orson Welles levou Macbeth ao Cinema em 1948

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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