Uma pessoa vê um crime no imóvel em frente e, sem poder sair de casa, fica à mercê do possível assassino. Sim, você já viu esse filme, chama-se Janela Indiscreta (Rear Window, 1954), clássico de Alfred Hitchcock que há mais de 60 anos contou uma história de maneira irretocável sem precisar chamar o espectador de burro. Quem o faz é o novo A Mulher na Janela (The Woman in the Window, 2021), que traz um elenco fantástico para disfarçar uma bagunça generalizada.
Amy Adams é a isca enviada para atrair o público. Seis vezes indicada ao Oscar (e certamente merecedora, como por A Chegada, 2016), ela lidera um grupo que ainda traz Julianne Moore (de Suburbicon, 2017), Gary Oldman (de Mank, 2020), Jennifer Jason Leigh (de Bom Comportamento, 2017), Wyatt Russell (de Operação Overlord, 2018), Anthony Mackie (de Falcão e o Soldado Invernal) e Brian Tyree Henry (de Godzilla vs. Kong, 2021). Vários nomes interessantes que não têm nem tempo suficiente para mostrarem serviço. As atuações vão de insignificantes a constrangidas.
A personagem de Adams é uma psicóloga que sofre de agorafobia: medo de sair de casa. O que não impede todo o elenco de entrar lá. Qualquer um que estiver passando na rua entra da casa de Anna e ela não tem restrições a confiar e se abrir com desconhecidos. O dramaturgo Tracy Letts (que vive o psiquiatra de Anna), que adaptou o livro de A.J. Finn (pseudônimo de Daniel Mallory), assinou os ótimos roteiros de Possuídos (2006) e Killer Joe (2011), mas também cometeu Álbum de Família (2013), o que prova que ele não é infalível.
Os diálogos truncados deixam propositalmente muita informação de fora, o que fica cada vez mais inverossímil. Um passado é construído para a personagem, o que deveria torná-la mais profunda, mas fica apenas mais esquemático. A atitude geral é muito suspeita, claro, para que desconfiemos de todos. Ao invés de apostar suas fichas e criar tensão jogando com a percepção de público, como Hitchcock fez, o diretor Joe Wright (de O Destino de Uma Nação, 2017) atira para todo lado e cria um mistério digno do jogo Detetive.
Quem não ficou feliz com Gary Oldman sendo indicado ao Oscar por Mank não vai gostar de vê-lo dando chiliques vazios – e os demais também. Ao ator não sobra muita coisa, como a Julianne Moore, os maiores e mais desperdiçados talentos do projeto. Há quem diga que o livro de Mallory seja bom, ao contrário do filme, fenômeno similar ao observado em A Garota no Trem (The Girl on the Train, 2016). Se os livros são bons, não importa, ambas as adaptações descarrilaram.