O longa do Super-Homem de 1978, de Richard Donner, segue firme sendo referência entre adaptações de histórias em quadrinhos. Por isso, não há honra maior para outro filme do que ter similaridades com ele. É o que observamos com Mulher-Maravilha 1984 (Wonder Woman 1984, 2020), sequência das aventuras da personagem de William Moulton Marston que andou dividindo a cena com outros heróis da DC. Aqui, ela segue sendo a protagonista isolada, com sua jornada sendo desenvolvida.
A descoberta de um artefato misterioso dá o pontapé inicial para a trama da diretora e roteirista Patty Jenkins (com colaboração no texto de Geoff Johns e Dave Callaham). Seguindo o sucesso de 2017, ela retoma sua Diana Prince (novamente vivida por Gal Gadot) em 1984, décadas após o fim da Primeira Guerra. O mundo dito futurista inclui pochetes, calças de paraquedistas, blazers com ombreiras e penteados chamativos, entre outras estranhezas que preferimos esquecer.
Com muita segurança no papel, Gadot ressurge como a mulher aparentemente perfeita, aquela invejada por outras e cobiçada por outros. Mas Diana não socializa facilmente, ela só sai de seu disfarce de cientista do museu por causas nobres. Dia após dia, ano após ano, ela se sacrifica pela humanidade e não deixa rastros, só rumores. Ninguém sabe quem é a misteriosa figura que previne assaltos e prende malfeitores. E só ela sabe a falta que faz seu eterno amor, Steve Trevor (Chris Pine).
É interessante a facilidade com que o roteiro resolve vários entraves e introduz elementos da mitologia da personagem. Jenkins e seus colegas de roteiro fizeram bem seu dever de casa, seguindo fielmente o cânone da Mulher-Maravilha. A aventura flui bem, salvo alguns excessos. Afinal, é discutível se eram necessários 150 minutos para contar uma história que caberia em menos de duzentas páginas de uma Graphic Novel. Há gorduras visíveis, que seriam facilmente cortadas por alguém sem uma ligação emocional com a editora – Richard Pearson, o montador, também trabalhou em Liga da Justiça (Justice League, 2017).
Como sempre acontece nesse subgênero, os vilões geram expectativa e são responsáveis por boa parte do sucesso da obra. Os escolhidos por Jenkins não decepcionam e são bem desenvolvidos pelo roteiro. Assim como acontece nas hqs, há alguns situações inverossímeis, mas nada que não dê pra relevar no calor do momento. Pedro Pascal (abaixo), gozando de grande sucesso atualmente como The Mandalorian, faz o canastrão Maxwell Lord, um empresário do ramo petrolífero que depende de seu carisma para conseguir parceiros de negócios e aposta no alcance da televisão para atraí-los.
Lembrando um pouco o Professor Aloprado de Jerry Lewis, Kristen Wiig (de Caça-Fantasmas, 2016) é Barbara Minerva, a atrapalhada colega de Diana no museu. Ela é mais uma personagem interessante num filme que valoriza as mulheres e as coloca em primeiro lugar. Da forma como a Mulher-Maravilha é construída, ela fica bem mais interessante que seu colega de editora, o Super-Homem, e funciona igualmente como um símbolo de esperança. Há cenas que remetem diretamente a O Homem de Aço (Man of Steel, 2013), como que Zack Snyder nos lembrando que ele continua no cargo de produtor. Felizmente, o Sol continua aparecendo, ao contrário da escuridão que Snyder costuma privilegiar.
Acima de tudo, Jenkins nos entrega um filme divertido e focado em seus personagens, todos tratados com respeito. Mas não pense que falta ação, não é o caso. A diretora consegue um bom equilíbrio entre os momentos mais introspectivos e os acelerados. A trilha sonora de Hans Zimmer, mesmo repetindo o tema que já conhecemos, consegue ir além e acrescentar novas notas. E o público sai do cinema esperando pela próxima aventura dos semideuses da DC, torcendo para que Snyder siga apenas como produtor.
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