Tenet é o novo espetáculo visual de Nolan

Uma campanha de divulgação enigmática cercou Tenet (2020) por um bom tempo – ainda mais com os adiamentos da estreia devido à pandemia. No fim, concluímos que o título já diz muito sobre o filme: um palíndromo que não esclarece nada e, ao mesmo tempo, parece ser mais complicado do que de fato é. A direção de Christopher Nolan é garantia de um espetáculo visual, mas não necessariamente de um grande filme.

A sensação que temos ao chegar ao cinema sem saber nada sobre o roteiro é a mesma do protagonista quando é envolvido na trama. Propositalmente e sem nenhuma sutileza, ele é reafirmado (e se reafirma) frequentemente como protagonista da história, como se isso já não fosse óbvio. Nolan, também roteirista, parece ter tido uma ideia promissora e criado um início e um fim, tendo alguma dificuldade com o meio.

Começando com uma situação tensa sem relação direta com a história principal, apenas para apresentar o personagem, o filme já se coloca como uma aventura à James Bond. A associação é óbvia e faz parecer que Nolan está afirmando ser capaz de chegar próximo de 007 sem precisar de material baseado na obra de Ian Fleming. Tudo em Tenet  é original e mostra o poder do realizador em Hollywood: qualquer ideia que ele proponha ganha sinal verde e um orçamento polpudo. Seu nome no cartaz é retorno certo.

Uma crítica comumente feita à obra de Nolan é sobre a falta de engajamento emocional junto ao público, e essa característica chega ao ápice em Tenet. Quando mal entendemos o que está acontecendo, fica difícil se importar com alguém. Se, em Interestelar (Interstellar, 2014), o diretor ainda tentou arrancar algumas lágrimas, aqui ele desistiu totalmente. Ao contrário de A Origem (Inception, 2010), que trazia uma subtrama familiar para o Cobb de DiCaprio, permanecemos no escuro quanto ao protagonista.

Segurando as pontas como a atração principal, John David Washington não é surpresa para ninguém. O talento do ator já havia ficado bem claro em Infiltrado na Klan (BlacKkKlansman, 2018) e mais uma vez ele faz um ótimo trabalho. Com tamanha segurança, ele nem de longe segue na sombra do pai famoso, Denzel. E esse acaba sendo um problema para o filme: assim como é com James Bond, nunca ficamos realmente com receio de que algo grave vá acontecer ao personagem. Apenas aguardamos o desenrolar da ação.

Entre figurinhas repetidas e novidades, Nolan convocou um grande time de atores. Dentre as repetições, temos o habitual Michael Caine (o Alfred da trilogia Batman, entre outros), Kenneth Branagh (Dunkirk, 2017) e Martin Donovan (Insônia, 2002). Robert Pattinson (curiosamente, o novo Batman) é o principal entre os novos reforços, e ainda temos Elizabeth Debicki (de As Viúvas, 2018), Himesh Patel (de Yesterday, 2019) e Aaron Taylor-Johnson (de Animais Noturnos, 2016). Com maior ou menor importância para a trama, todos cumprem bem os seus papéis.

Contando com a trilha de Ludwig Göransson (de Pantera Negra, 2018) e a fotografia de Hoyte Van Hoytema (de Interestelar e Dunkirk), Nolan há muito não tem o que provar tecnicamente. Os efeitos são lindos e críveis, alterando a realidade como a conhecemos, como em A Origem. Só o desenvolvimento da história deixa a desejar, lembrando um pouco a trajetória de M. Night Shyamalan. São duas horas e meia que demoram a passar. Talvez, seja a hora do diretor só dirigir, deixar a escrita para outro. Ou, ao menos, voltar à parceria com o irmão, Jonathan.

Nolan dirige Washington, seu protagonista

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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