por Marcelo Seabra
Invariavelmente, as tragédias do mundo são marcadas pela incompetência e pela arrogância humanas. Foi assim com Chernobyl, é assim na devastação atual na Austrália. Outro desses episódios acaba de chegar aos cinemas: Kursk – A Última Missão (2018) narra o acontecido com o submarino russo em 2000. O fato é recente, mas muitos podem não conhecer os pormenores, assim como o final. Por isso, a tensão tende a aumentar à medida em que o oxigênio dos marinheiros diminui.
O elogiado diretor dinamarquês Thomas Vinterberg, do ótimo A Caça (Jagten, 2012), partiu do livro de Robert Moore, com roteiro de Robert Rodat (de O Resgate do Soldado Ryan, 1998) e do próprio Moore. O best-seller detalha tudo que foi descoberto nas investigações subsequentes ao naufrágio, e fica por conta dos roteiristas imaginar muito do que teria acontecido, lá embaixo e na superfície. Muitos países se envolveram, tentando diminuir o tamanho da tragédia, o que envolveu muita política no episódio. Mas não estranhe ouvir todos falando inglês, como é comum em produções que buscam aceitação pelo mundo.
Conduzindo o espectador pela trama, temos o personagem de Matthias Schoenaerts – que trabalhou com Vinterberg em Longe Deste Insensato Mundo (Far From the Madding Crowd, 2015). Mikhail Averin é admirado e respeitado pelos colegas, e conhecemos uma boa parte deles em um casamento. Dessa forma, o filme traz um pouco de profundidade a cada um deles, mesmo que não dê tempo para mostrar muito. Quando embarcam, já conhecemos o suficiente para torcer por eles, além de sabermos que tudo se trata de uma história real. Como é costume em filmes-catástrofe (um exemplo é o recente Horizonte Profundo, 2016), ficamos na expectativa pelo que já sabemos e pelo desenrolar.
E quem fica em terra também é importante. Como disse o produtor Luc Besson em entrevistas, a ideia era valorizar o lado humano da história. Se a tentativa de fazer sentimentalismo barato com closes na cara do filho de três anos desanima, a participação da esposa torna as coisas mais interessantes. A Léa Seydoux (de Spectre, 2015) não cabe apenas o papel de mocinha chorosa, como vemos por aí. As mulheres que ficaram esperando que seus maridos retornassem foram tratadas com total descaso pelas autoridades da marinha russa, ponto muito importante mostrado. A reunião convocada é um dos grandes momentos de Kursk, mostrando uma mistura de ingenuidade e burrice dos militares de alta patente.
Os outros nomes mais conhecidos do elenco são os de Colin Firth (de Kingsman: O Círculo Dourado, 2017) e do veterano Max von Sydow (de Star Wars: O Despertar da Força, 2015), dois grandes talentos que cumprem bem suas missões. Firth é responsável por um dos momentos mais fortes do longa, enquanto von Sydow personifica alguns dos pecados mencionados acima. Os diálogos entre todos eles são, em sua maioria, bem escritos, evitando exposições desnecessárias. Não importa que não saibamos os detalhes do funcionamento de um submarino, vamos continuar sem saber. Vinterberg mantém as coisas críveis e honra a memória das vítimas, além de deixar claro que autoridades nem sempre sabem o que fazem.