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Projeto Gemini tem Will Smith dobrado

por Marcelo Seabra

Em meio a tantas continuações e adaptações de material pré-existente, é de se louvar quando uma obra original e inovadora chega às telas. Mas fica difícil defendê-la quando se trata de Projeto Gemini (Gemini Man, 2019), um filme que depende muito de seus atributos tecnológicos e acabou deixando o roteiro para segundo plano. Will Smith, o protagonista, costuma ser bastante narcisista, com vários closes e poses, mas desta vez ele foi longe demais: temos dois dele.

Na geladeira desde 1997, o projeto passou por várias mãos e teve diversos astros associados a ele até ir parar no colo de Ang Lee. Vencedor do Oscar duas vezes (por Brokeback Mountain, 2005, e As Aventuras de Pi, 2012), o diretor encarou a missão de realizar um longa no chamado 3D+, com 120 frames por segundo – quando o usual é 24. O problema é que pouquíssimos cinemas no mundo estão devidamente preparados para atender essa demanda. Ou seja: a maior parte do público assistiu com os recursos de sempre, perdendo todo o charme que poderia ter tido.

Se você não tem acesso ao grande chamariz do longa, resta prestar atenção ao roteiro. Aí, as coisas ficam feias. A versão final é assinada por Darren Lemke (de Shazam!, 2019), David Benioff (de Game of Thrones) e Billy Ray (de Operação Overlord, 2018), mas a história criada por Lemke foi mexida por diversos roteiristas. Enquanto a tecnologia era desenvolvida, o roteiro era alterado. Não dá para saber como era num primeiro momento. Mas o que chegou às telas não funciona. Um fiapo bobo de trama, salpicado por diálogos manjados, que nos conduzem a um final mais do que esperado.

Smith, visto recentemente com bronzeado azul em Aladdin (2019), vive o provável melhor assassino do mundo. Capaz de tiros improváveis, Henry Brogan consegue acertar até passageiro de trem em alta velocidade. Mas cai num conto do vigário, elimina quem não devia e o governo entra em seu encalço. Liderada por Clay Verris (Clive Owen, de Anon, 2018 – acima), a agência responsável por caçá-lo conta com um trunfo – que era para ser segredo, mas aparece até no cartaz: eles têm um clone mais jovem de Brogan.

A ideia de se criar um clone levanta várias questões. Brogan não nasceu um exímio matador, ele passou por várias experiências que levaram a isso. Um clone não resolveria nada automaticamente. Se Verris é tão fodão a ponto de treinar alguém tão bem, por que ele próprio não foi no encalço de Brogan? Ou não fez um clone de si mesmo? Para evitar spoilers, fiquemos por aqui nos questionamentos. Mas o filme dá muito pano para manga no quesito “furos absurdos”. Mary Elizabeth Winstead (acima) e Benedict Wong são bons atores, mas suas personagens não acrescentam muita coisa.

Além de desperdiçar os atores, Projeto Gemini é um grande desperdício do diretor. Lee consegue criar umas sequências interessantes, como a da moto. Mas não dá para ir longe com esse arremedo de roteiro. Tudo, da fotografia à trilha, acaba sendo meio genérico. O próprio Smith, que costuma ser ao menos carismático, traz uma cara de cansaço – que cairia bem a Brogan – mas assume essa característica em sua interpretação. Parece que descobriu tardiamente a furada em que se meteu. Para quem acabou de cair no planeta Terra, o filme pode até divertir. Para quem já viu outros três ou quatro, este não funciona.

Smith, veterano e Junior, e os demais membros do elenco

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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