Warner/DC acerta o tom com Shazam

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Quando a Warner/DC anunciou que faria um filme do Shazam (antigamente conhecido como Capitão Marvel), era para ficar com os dois pés e uma mão atrás. Afinal, Shazam sempre foi um personagem leve, quase infantil, e a ideia da empresa de um universo sombrio, cínico e soturno não combinava em nada com essa essência. Felizmente, os fracassos (nesse caso, o retorno financeiro abaixo do esperado pelo estúdio) de público e crítica de Homem de Aço, Esquadrão Suicida e Batman vs Superman acenderam o sinal amarelo no estúdio. Ao invés de tentar fazer algo diametralmente oposto ao que a principal concorrente – a Marvel Studios – estava fazendo, porque não seguir a mesma fórmula?

O principal movimento da Warner na direção certa foi diminuir os poderes de Zack Snyder, até então a mente por trás de toda a iniciativa da criação de um universo cinematográfico da DC, e trazer Geoff Johns a bordo. Para aqueles que o desconhecem, Johns é uma das principais mentes criativas da editora. Atuando como roteirista de quadrinhos, ele foi o responsável por reformular personagens como o Lanterna Verde, Aquaman e o próprio Shazam, só para citar alguns, antes de passar um tempo como chefe criativo da empresa e, finalmente, abrir uma produtora exclusivamente para cuidar das adaptações da DC para a telona.

A influência de Geoff como produtor pode ser sentida inicialmente em Mulher-Maravilha (2017), que já se diferenciava bastante dos filmes de Snyder. Ao invés de um sentimento de desesperança e cinismo, com personagens atuando de forma sombria e, muitas vezes, descaracterizados em relação aos quadrinhos, vimos no filme da Amazona um primeiro sinal do que estava por vir. Filmes mais leves, mais divertidos e, porque não?, mais coloridos, onde a esperança é o sentimento mais presente.

Se, em Aquaman (2019), os fatores diversão e cores se fizeram bastante presentes, em Shazam eles chegam a limites jamais explorados em um filme da DC. Sim, fãs da DC que acham que os filmes da Warner só podem ser sérios: Shazam é o filme da DC que mais segue a fórmula da Marvel Studios. E, considerando todos os elementos que giram em torno do personagem, nada funcionaria melhor do que isso.

Para não estragar surpresas, o que pode-se dizer sobre Shazam (2019) é que se trata de um filme de origem. É um filme sobre como o orfão Billy Batson (Asher Angel, da série Andi Mack), por uma série de acasos, acaba sendo agraciado com os poderes do Mago Shazam (Djimon Hounsou, de Capitã Marvel, 2019) e assume o posto de campeão da magia. Ao dizer o nome do mago, Billy se transforma no mortal mais poderoso da Terra (vivido por Zachary Levi, da série Chuck).

Shazam é um filme que trata, de maneira bem condizente com seu material de base, como um menino rebelde de 14 anos se comportaria se, de repente, adquirisse capacidades super-humanas e como ele tiraria proveito delas. As sequências em que a versão adulta de Billy testa seus poderes, com a ajuda do “especialista em heróis” Freddy (Jack Dylan Grazer, de It, 2017), um dos adolescentes que mora na mesma casa de acolhimento de Billy, são hilárias. Freddy, aliás, é um dos grandes trunfos do elenco. Ele incorpora o nerd fã de super-heróis que, muitas vezes, não sabe muito o que diz, mas, graças ao seu conhecimento a respeito de seres poderosos, é fundamental na jornada de Billy para se tornar o campeão que deve ser.

Shazam é, principalmente, um filme sobre o valor da família. Sendo um órfão que sempre se virou sozinho, família é uma das coisas que o menino menos valoriza. Mas, na hora em que o bicho pega, quando a cidade da Filadélfia – e o próprio mundo – está sendo ameaçada pelo Dr. Silvana (Mark Strong, dos dois Kingsman – abaixo), que quer os poderes de Shazam para si, Billy descobre que apenas com o apoio de sua família, mesmo que emprestada, é o que fará a balança do poder pender a seu favor e colocá-lo devidamente na jornada de herói.

Shazam é, de longe, o filme mais divertido dessa safra de produções da Warner. E não poderia ser diferente, já que ele conta a história de um menino que, do nada, se transforma em um adulto superpoderoso e volta a ser menino bastando dizer uma palavra. Tanto a personalidade de Billy quanto a de Shazam foram muito bem trabalhadas e, se alguém tinha dúvidas a respeito da capacidade de Zachary Levi para o papel, elas se dissipam logo de cara. Claro, o filme tem aqueles problemas que a maioria das produções desse gênero carregam em seu DNA, como personagens tomando decisões que servem apenas à trama, o abuso da suspensão de descrença em algumas passagens e um terceiro ato um tanto quanto mais longo do que o necessário. Isso, no entanto, não tira em nada seus méritos.

A exemplo de praticamente todas as adaptações de histórias em quadrinhos atuais, Shazam tem duas cenas após seu final, uma no meio dos créditos e uma logo após eles. E, para aqueles que ficaram intrigados com o grande trecho aqui dedicado a Geoff Johns, sugiro que, após assistirem ao filme, leiam o encadernado estrelado pelo personagem de autoria de Johns. Ele foi lançado no Brasil há algum tempo pela Panini, mas, caso você tenha certa fluência em inglês, pode conferir online aqui.

Devagarzinho, Shazam chegou e passou na frente dos colegas

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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