por Marcelo Seabra
O fascínio que o psicopata Ted Bundy exerce no imaginário norte-americano segue firme, com mais uma obra contando sua história. Entre longas ficcionais, documentários e programas de TV, ele é citado em mais de vinte títulos, e chega aos cinemas essa semana Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal (Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile, 2019). Trazendo como protagonista a namorada de Bundy, o filme se propõe a trazer um olhar novo sob o personagem, colocando o público no lugar da garota.
Em 1974, quando o conceito de serial killer não era difundido, a polícia começou a observar um padrão em assassinatos e concluiu que várias mortes e sequestros tinham por trás o mesmo criminoso. Episódios circunstanciais, como uma multa de trânsito e um retrato falado, levaram as autoridades a Theodore Robert Bundy, um estudante de Direito carismático, bem apessoado e articulado. Ele namorava Elizabeth Kloepfer (abaixo) e garantia a ela que isso não passava de um mal-entendido. Tudo logo seria esclarecido e eles poderiam se casar.
No entanto, não foi isso o que aconteceu. Evidências levaram a outras acusações e Bundy se viu numa situação bem complicada. E ele nunca deixou de jurar inocência. Liz, acompanhando tudo, torcia para que a injustiça fosse corrigida e ela pudesse ter seu amor de volta. É desse ponto de vista que acompanhamos o desenrolar dos fatos. O roteiro, premiado em 2012 e na geladeira desde então, se baseou no livro de Kloepfer, no qual ela se chama de Liz Kendall. Michael Werwie trabalhou uma década como garçom até que seu roteiro foi comprado, marcando sua estreia na função.
Responsável por um ótimo documentário recente, Joe Berlinger volta seu olhar para Bundy. No início do ano, a Netflix disponibilizou Conversando com um Serial Killer: Ted Bundy (Conversations with a Killer: The Ted Bundy Tapes), quatro episódios que cobrem os fatos ligados ao psicopata. Baseando-se no livro dos jornalistas Stephen G. Michaud e Hugh Aynesworth, ambos produtores da série, Berlinger cobriu tão bem o assunto que acabou assumindo a tarefa de conduzir também a versão ficcional da história. Em 2000, ele lançou A Bruxa de Blair 2, cuja recepção negativa deve tê-lo deixado traumatizado. Fora os dois longas, toda a carreira de Berlinger foi construída com documentários – inclusive sobre a banda Metallica, cujo vocalista, James Hetfield, faz aqui sua estreia como ator.
Para o elenco, o diretor ouviu os fãs de Zac Efron, que vinham se manifestando há tempos. Conhecido pelos bobinhos High School Musical da Disney, Efron tem demonstrado talento em diversos projetos, como no drama Obsessão (Paper Boy, 2012) e na comédia de ação Baywatch (2017). O ator aproveita o pouco de semelhança física que tem com Bundy e recria à perfeição seus olhares e maneirismos. O circo que o sujeito montou em seu julgamento é visto aqui na íntegra, com o ótimo John Malkovich (de Bird Box, 2018) como o juiz à frente do caso.
Fazendo dupla com Efron, temos Lily Collins (de O Mínimo para Viver, 2017) como Liz, uma mãe trabalhadora que parece ter encontrado um cara bacana. Nela, vemos agindo o poder da negação: mesmo que as evidências apontem para Bundy, ela se nega a aceitar, na esperança de que tudo fosse se resolver. É angustiante ver o efeito dessa situação na vida da moça. Ela passa a viver uma espera constante, acompanhando os desdobramentos pela televisão e recebendo ligações delirantes de Bundy. Efron e Collins funcionam bem juntos, dando uma boa ideia do sofrimento dela e do distanciamento da realidade dele.
Além dos já mencionados, o elenco ainda é beneficiado por alguns rostos interessantes, como Kaya Scodelario (de Maze Runner), Angela Sarafyan (de Westworld), Haley Joel Osment (o garoto de O Sexto Sentido, 1999), Jeffrey Donovan (de Bruxa de Blair 2), Brian Geraghty (das séries The Alienist e Ray Donovan) e Jim Parsons (o Sheldon de Big Bang Theory). A recriação dos anos 70 nos leva à época, e cenas reais mostradas nos créditos comprovam o quanto a produção chegou perto da realidade. Não é a obra definitiva sobre Bundy (esta seria Conversando com um Serial Killer), mas nos mostra a história por um lado diferente interessante o suficiente para valer o ingresso.