por Marcelo Seabra
*O texto abaixo foi escrito em 2011, ano de lançamento do livro Os Últimos Soldados da Guerra Fria, de Fernando Morais. Esta semana, o cartaz da adaptação para o Cinema, Wasp Network, foi divulgado, concretizando uma previsão de oito anos atrás. O roteiro e a direção são de Olivier Assayas.
Os Últimos Soldados da Guerra Fria – A Resenha
É muito interessante conhecer a história de perto. Uma coisa é ler em um livro, ouvir alguém contar. Outra, é ir ao lugar, conversar com as pessoas, ver as evidências de perto. O novo livro do prestigiado Fernando Morais, autor de Olga, Chatô – O Rei do Brasil, A Ilha e outros, chama-se Os Últimos Soldados da Guerra Fria e revela fatos até então desconhecidos sobre os chamados Cuban Five, ou Cinco de Cuba. Na verdade, sobre toda a rede Vespa. No meu primeiro contato com essa história, não tinha ideia do que significava tudo isso.
No início da década de 90, Cuba se recuperava da crise que a queda de sua parceira econômica, a União Soviética, trouxe através do turismo. Hotéis de luxo eram construídos na ilha, milhares de pessoas visitavam o país. Por isso, empregos eram criados e a receita que entrava ajudava a manter a economia cubana em dia. O problema é que Fidel Castro e seus partidários tinham muitos inimigos morando nos Estados Unidos, sediados principalmente na Flórida. E esse pessoal não estava nada satisfeito vendo Castro e o país se recuperarem.
Os grupos anticastristas da Flórida já promoviam ações para tentar minar o governo cubano, como jogar pragas nas plantações e interferir nas transmissões do aeroporto de Havana. Com o crescimento do turismo em Cuba, o foco passou a ser outro: atacar aviões, hotéis e até navios em águas internacionais. Várias mortes foram causadas, o terror estava se instaurando e a ameaça à economia voltou a pairar sobre a ilha.
Foi aí que se formou a rede Vespa. Foi reunido um grupo de 12 homens e duas mulheres que se fingiram de desertados e se dirigiram aos Estados Unidos. A missão era se infiltrar em grupos de extrema direita e descobrir os planos de ataques para poder preveni-los. Desta forma, muita informação foi passada, muitas vidas foram salvas, muitas bombas foram desarmadas. Em 1996, dois aviões de um destes grupos, o Hermanos al Rescate, foram abatidos pela artilharia cubana em espaço aéreo internacional, com o saldo de quatro cidadãos americanos mortos.
O FBI já vinha investigando atividades de cubanos na Flórida há anos, e esse era o momento propício para o ataque. Buscando os 14 membros da rede Vespa, o FBI invadiu as casas onde eles moravam e conseguiu prender 10 dos 14. Dos 10, cinco se renderam às ofertas dos americanos e, em troca de detalhes das operações, entraram em programas de proteção à testemunha. Os cinco que ficaram presos se tornaram conhecidos como Cuban Five, ou Los Cinco de Cuba. Em Cuba, são vistos como heróis nacionais; nos Estados Unidos, são considerados culpados por espionagem, conspiração para cometer assassinato e outras atividades ilegais.
Todos foram condenados, após um julgamento que durou sete meses, e as penas vão de 15 anos a duas penas de prisão perpétua. Gerardo Hernandez ainda brincou com Fernando Morais, em um contato intermediado por familiares e autoridades, dizendo que, por ser comunista, não acreditava em Deus e, por isso, cumpriria apenas uma das penas. O escritor contou esta e outras histórias em uma palestra em Belo Horizonte, realizada para a promoção do livro Os Últimos Soldados da Guerra Fria. Foram 40 entrevistas, divididas entre Cuba e Estados Unidos – além de uma no México. Somadas ao material escrito levantado e aos vários depoimentos colhidos em off, elas deram condições a Morais de detalhar bem as situações e mostrar, mais uma vez, o apuro de sua técnica jornalística e a imparcialidade de seu texto, que busca sempre comprovação por fatos e documentos.
Tive a fantástica oportunidade de conhecer Cuba, onde passei férias em 2009, e foi quando tomei conhecimento da história dos cinco. Havia cartazes em diversos estabelecimentos pedindo a libertação deles. Sempre que eram mencionados, a aura de mártires pairava, e era difícil para mim e para meu colega viajante separarmos a verdade do exagero. Confesso que, até bem recentemente, eu não conhecia a situação a fundo e não saberia dizer quem estava certo: o povo cubano ou as autoridades americanas. Com o livro de Fernando Morais, fica fácil tirar conclusões e entender melhor a história.