por Marcelo Seabra
Na onda do que parece ser um novo subgênero cinematográfico, as adaptações live action de clássicos Disney, chega às telas Dumbo (2019), novo trabalho do criativo diretor Tim Burton. Numa tentativa de fazer uma obra com os pés no chão, os animais falantes foram cortados e o elenco humano cresceu, buscando compensar essas faltas. O problema de ter muitos coadjuvantes é não poder dar muita atenção a nenhum, e eles ficam longe de atingir o mesmo pico emocional que os ratinhos engraçadinhos do original.
No meio de tantos personagens, até o próprio Dumbo perde espaço. O elefantinho adorável é criado por uma computação gráfica eficiente, como também os demais efeitos visuais do longa. Outro ponto positivo é a reunião de Burton com atores de produções passadas. Temos na tela ninguém menos que Michael Keaton, que viveu Batman (1989 e 1992) e Beetlejuice (1988), além do “Pinguim” Danny DeVito e da “Miss Peregrine” Eva Green. DeVito, inclusive, viveu outro dono de circo do diretor em Peixe Grande (Big Fish, 2003). Encabeçando o elenco, temos um correto Colin Farrell (de As Viúvas, 2018) como um viúvo que volta da guerra para se reconectar aos filhos e à vida civil.
A história do filme é basicamente a mesma do desenho de 1941: um elefantinho nasce num circo que anda meio capenga e é a esperança de dinheiro entrando. Num primeiro momento, todos fazem pouco do bichinho pela estranheza de suas orelhas enormes. Mas eles logo entendem que aquele é o grande trunfo de Dumbo: ele pode voar. Há muitas diferenças entre as duas obras e não vale a pena entrar nesses detalhes, já que uma independe da outra. Mas os temas permanecem os mesmos: aceitação, relações familiares, o mal da ganância.
Como é costume nas produções de Burton, a riqueza dos cenários é espantosa. Tudo é colorido, mas de um jeito meio sombrio, como a Gotham de Batman (1989). O parque Dreamland, inclusive, lembra muito o esconderijo do Coringa em A Máscara do Fantasma (1993), com invenções que vislumbram um futuro bem tecnológico. A diferença de Dumbo para os demais trabalhos do diretor é o tom infantil. Filmes como O Lar das Crianças Peculiares (2016), Frankenweenie (2012) e até Alice no País das Maravilhas (2010) são protagonizados por crianças e as têm como público principal, mas não deixam de agradar os adultos também, revelando camadas que podem ser percebidas por diferentes faixas etárias.
Alguns enquadramentos em olhares e expressões soam forçados e, por vezes, diálogos são excessivamente expositivos. Há situações irreais até para esse universo de fantasia. E esse clima de fábula é constantemente esfregado na cara do espectador, com ênfase até da trilha sonora. Ehren Kruger, roteirista de longas pesados como O Suspeito da Rua Arlington (1999), O Chamado (2002) e A Chave Mestra (2005), também tem suas derrapadas, como três dos Transformers, Os Irmãos Grimm (2005) e Ghost in the Shell (2017), além do constrangimento adolescente Sangue e Chocolate (2007). Dumbo é mais um ponto contra nessa carreira irregular.
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O maior problema do filme “Dumbo” não é nem tanto a impressão de uma direção cansada (como o semblante do Capitão Farrier) e não identificada com o desenho de 1941, à exceção talvez do porre do elefantinho, mas é o roteirista, Kruger. Disney usava inescrupulosamente as pessoas, durante toda a vida teve problemas com banqueiros e roteiristas, chegando mesmo a desgraçar a vida de alguns desses últimos durante o Macartismo. Essa classe de profissionais, desde então, vive às turras com a empresa Disney e, pode até ser, o próprio Kruger, inclusive, deve ter aderido a alguma das grandes greves mais recentes. Ao compor uma caricatura de Walt Disney travestida da personagem de Keaton, ambiciosa e manipuladora (o filme é muito mais a respeito dela do que sobre Dumbo), Kruger errou a mão e foi o fogo amigo cheio de recalcamentos que, para arremedar o ícone patronal, devorou a essência do merecido longevo sucesso das produções da Disney, a Magia.
Pois é, apontei o roteirista como um dos grandes problemas. Talvez, a causa esteja aí. Abraço!