por Marcelo Seabra
Produção original Netflix, Aniquilação (Annihilation, 2018) estava num limbo entre passar pela tela grande ou ir direto para o cemitério que se tornou o serviço de streaming. Um belo dia, eis que me deparo com a produção lá, disponível entre várias outras, achando-a por acaso. Um filme de Alex Garland, seguindo o lindo Ex-Machina (2014), ainda mais com Natalie Portman (de Jackie, 2016) à frente do elenco, merecia mais atenção. A impressão que fica é que a mistura de gêneros confundiu os executivos, que não sabiam como promover o longa.
As coisas começam como uma ficção-científica promissora e somos apresentados a Lena (Portman), uma professora universitária que tem um passado militar, como logo descobrimos. Uma tragédia relacionada ao marido (Oscar Isaac, de Ex-Machina) faz com que ela se voluntarie em uma missão no mínimo estranha: explorar uma região marcada por um estranho fenômeno e descobrir o que se passa. “Ou algo lá mataria todo mundo, ou eles ficariam loucos e matariam uns aos outros”, alguém descreve.
O Brilho, como o tal fenômeno é chamado, envolve uma parte costeira do continente, onde havia uma base militar. Ele parece mudar as características genéticas dos seres que vivem lá, e é isso que o pelotão pretende descobrir. Curiosamente, o grupo é formado apenas por mulheres: além de Portman, temos Jennifer Jason Leigh (de Bom Comportamento, 2017), Gina Rodriguez (de Jane, the Virgin), Tuva Novotny (de Borg vs McEnroe, 2017) e Tessa Thompson (de Thor: Ragnarok, 2017). Se tivéssemos cinco homens, ninguém estranharia, mas cinco mulheres, logo alguém aponta.
O gênero não demora a mudar e passamos para um terror meio surreal, e o filme perde força. De algo baseado num Tarkovsky (de Solaris, 1972), Garland parte para uma variação de um Alien, ou O Enigma de Outro Mundo (The Thing, 1982). O problema é que não se segue a lógica que parecia estabelecida, o roteiro parte para outras saídas. Dá a entender que o autor do livro em que Garland se baseia, Jeff VanderMeer, não sabia para onde ir. Ou sabia tanto que perdeu boa parte dos espectadores no caminho.
A estranheza do rumo da história acaba suscitando explicações possíveis que se ancorariam em teorias da física, o universo e tudo o mais. Mais ou menos o que aconteceu com Interestelar (2014) e a tal Teoria da Cordas: é necessário ter grande bagagem acadêmica para entender a viagem errada dos realizadores. Ou podemos apenas concluir que uma bela experiência, com situações criativas e uma fotografia adequada, acabou dando com os burros n’água, talvez por muita pretensão de Garland. O peso do sucesso de Ex-Machina foi demais pro artista.