Pantera Negra chega fazendo história

por Marcelo Seabra

Uma coisa que poucas adaptações de quadrinhos de super-heróis conseguem é unir boa bilheteria e elogios da crítica. Costuma ser um ou o outro, sendo que os críticos dificilmente se empolgam. Pantera Negra (Black Panther, 2018) atingiu essa proeza, tendo batido a marca dos 700 milhões de dólares de arrecadação e atingindo quase 100% de aprovação no Rotten Tomatoes. Pode-se dizer que o diretor Ryan Coogler está com a moral em Hollywood, e uma continuação é certa.

Depois dos elogiados Fruitvale Station (2013) e Creed (2015), Coogler recebeu da Marvel a incumbência de levar às telas um herói negro, oportunidade ótima para enfatizar a questão da raça, das origens e da diversidade. Não satisfeito em trabalhar na causa dos negros no Cinema, o diretor ainda valorizou a mulher, mostrando-as como fortes e decisivas na gestão de um país. Personagens como Blade e a Mulher-Maravilha já haviam levado esses pontos às telonas, mas nunca com tanto destaque. E nunca tão bem sucedidos.

T’Challa (Chadwick Boseman) nos foi apresentado em Capitão América: Guerra Civil (2016). Ao contrário dos demais, o sujeito não teve uma história de origem, já entrou no meio da batalha. Isso talvez tenha contribuído, o público pode ter ficado curioso, ou com vontade de mais. O roteiro, escrito por Coogler e Joe Robert Cole, evita voltar no tempo, mas não fica sem um flashback, resolvendo logo essa “dívida” e partindo para o futuro, para o desenvolvimento da história. E somos apresentados à fabulosa Wakanda, terra onde T’Challa é o rei, seguindo os passos de seu saudoso pai.

Com a bela fotografia de Rachel Morrison (também de Fruitvale Station), conhecemos todo o país e a razão de seu sucesso tecnológico: o metal vibranium, que permite aos cientistas locais um desenvolvimento inimaginável – e bem chutado. Uma coisa é ter um escudo do material, que permite segurar todo tipo de munição e pancada. Outra é ter um uniforme feito dele, altamente adaptável e compacto. E descobrimos vários outros usos para ele.

Tendo aceitado isso, partimos para os demais costumes e tradições de Wakanda, que envolvem uma planta alucinógena que confere poderes a quem a consome – que podem ser retirados – e um desafio que permite a qualquer um tentar ser o rei. Um pecado do pai vai levar T’Challa a combater um vilão bem próximo. É aí que entra Michael B. Jordan (em sua terceira parceria com o diretor), uma figura tão interessante e carismática quanto Boseman. Mas esse empate de forças acaba sendo um ponto fraco do filme, já que cai na mesmice, tornando a dinâmica entre eles repetitiva e previsível.

Tirando um problema ou outro, Pantera Negra é uma aventura bem eficiente que desenvolve e aproveita bem seus personagens. As mulheres em Wakanda têm um papel bem importante, o que pode ser uma das causas do sucesso desse povo. Tanto na ciência quanto no exército, elas se sobressaem, não se sujeitando a ser coadjuvante de nenhum homem. A pretendente de T’Challa (Lupita Nyong’o, de Star Wars: Os Últimos Jedi, 2017) segue o caminho que escolheu, buscando ajudar os outros; a chefe da guarda real (Danai Gurira, de The Walking Dead) não é nada submissa ao marido (Daniel Kaluuya, de Corra!, 2017), o que não a impede de amá-lo; e a irmã do rei (Letitia Wright, de Black Mirror) lidera a divisão de tecnologia. Todas críveis, independentes.

O maior mérito do longa ainda é prover para milhões de crianças negras pelo mundo um modelo de integridade e força, como os meninos brancos têm no Super-Homem, Batman e tantos outros heróis. Todos, quando pequenos, tínhamos nossos sonhos e aspirações, e todos merecem ter uma figura na qual se mirar. T’Challa vai voltar em breve, novamente lutando ao lado de Capitão América, Homem de Ferro e companhia na Guerra Infinita. Mas, nessa primeira aventura solo, já fez história.

Jordan é um vilão forte e motivado

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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  • Sério que passado 1/4 de século XXI a nada maravilhosa Marvel e antes de cristo DC ainda acham ofensivo mostrar no cinema duas mulheres - Okoye e Ayo - trocando olhares afetuosos? Demoram décadas para dar protagonismo a negros e mulheres e ainda ficam hesitando covardemente? Percebemos que há algo de podre no subgênero de super-heróis quando até filmes bíblicos conseguem ser mais ousados...

    • Alan, eu sinceramente não sabia que esse romance era esperado. O filme já levantou tantas bolas que achei bacana. Abraço!

    • Alan ajuda ai né, se você quando vai assistir um filme fica buscando pontos para falar de ideologia de gênero você perdeu a noção do que é filme de super herois. Para cara, relaxa, a vida não se resume em ideologias de gênro e com todo respeito dentro de um padrão de naturalidade um filme de aventuras como esse a ultima coisa que tem que se preocupar é com esses detalhes. deixa isso para outras modalidades de filmes.

  • Sinceramente. Não Gostei Tanto Assim de Pantera Negra. O Inicio é Bem Genérico. E Depois Sim, Sob o Nível Bastante Com a Escolha do Pai do Pantera e os Conflitos ali Que Ramificam. E Depois Volta a Ser Genérico. Até a Batalha Final, de Novo, Personagem Com os Mesmo Poderes. As Duas Batalhas Pelo Reino a Beira da Cachoeira, São Foda, Tenho Que Concordar. Mas, só Vale o Ingresso.

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