por Marcelo Seabra
Um bar tipicamente brasileiro. Algumas pessoas jogando sinuca, outras sentadas, bebendo. Um clássico do cancioneiro brega no auto-falante. Ao fundo, um homem idoso, de semblante pacífico e cansado, parece dormir. Lá fora, uma rua poeirenta e pouco movimento. Cenário perfeito para um faroeste tupiniquim, que chega às telonas essa semana e atende por Comeback (2016).
O gênero é pouco explorado pelo nosso Cinema e foi o escolhido pelo diretor e roteirista Érico Rassi para marcar sua estreia em longas. E, infelizmente, a obra será lembrada por outra razão: é a despedida de Nelson Xavier, grande ator que travava uma luta contra um câncer. Muito querido por sua atuação como outro Xavier, o Chico (como em As Mães de Chico Xavier, 2011), entre vários outros papéis, Nelson traz as características necessárias para Amador: embora pacato, é capaz de uma explosão.
Em Anápolis, interior de Goiás (e terra de Rassi), Amador é um matador aposentado que vive de entregar máquinas de jogos eletrônicos em bares. Seu empregador, Tio (Gê Martu – abaixo), é o gângster poderoso da região e controla o crime, que já teve índices altíssimos. Amador, que já vive de nostalgia, recebe a visita do neto de seu amigo Davi e o jovem acaba fazendo-o voltar ainda mais aos velhos tempos. Ele quer aprender o ofício com o veterano.
Enquanto roda com seu aprendiz, Amador percebe que ninguém o respeita mais. A memória de seus feitos sangrentos não causa mais espanto nos habitantes. A chacina que causou mal é citada na mídia e o restaurante que foi o palco já é bem frequentado novamente. A relação com o novato faz com que o veterano ensaie um “comeback”, uma volta, na gíria local. Isso significaria novas mortes e, quem sabe, mais glória para ele.
Num clima de fábula sombria, o diretor e roteirista trata de questões importantes, como solidão, velhice e reconhecimento, mas de uma forma bem inusitada. É preciso ressaltar: o protagonista é um assassino de aluguel aposentado, responsável por diversos assassinatos devidamente documentados num álbum de recortes. Como se não bastasse o clima insólito do filme, há diálogos que conseguem ser tensos e engraçados ao mesmo tempo, mostrando o que à primeira vista pode ser falta de compreensão, mas se mostra prática na arte de levar vantagem.
Davi (Everaldo Pontes – ao lado), como Nelson, luta contra um câncer e não pode nem pensar em fumar. Mas quem liga para recomendações médicas tendo chegado tão longe? Seria melhor viver mais tempo sendo privado do que gosta ou reduzir seus momentos respirando para aproveitá-los com satisfação? E a tarefa do amigo é apoiar o jejum de nicotina ou fornecer cigarros? Outra questão que aparece no longa, que pode fazer o público refletir.
As músicas ouvidas em Comeback são interessantes por casarem bem com o cenário. A trilha sonora original, também muito adequada, é dos irmãos Gustavo e Guilherme Garbato (de O Silêncio do Céu, 2016), sócios na Casa da Sogra Soluções Sonoras. A fotografia, de André Carvalheira (de O Último Drive-in, 2015), aproveita bem as ruas da periferia da cidade e mostra a vida daquelas pessoas com realidade. Se elas de fato falam o termo “comeback”, ou se ele foi usado no título apenas para homenagear um gênero cinematográfico genuinamente norte-americano, não sabemos. Mas, se o filme peca, é por ser mais curto do que gostaríamos.
……Mas, se o filme peca, é por ser mais curto do que gostaríamos.
Ótimo comentário. Também acho. Fiquei um pouco triste quando vi que havia terminado. E que musica para terminar: Vuelvo a ti interpretada por Manolo Otero tem tudo a ver.
Gostaria de ter a relação das outras musicas..
Orlando, não conheço a maioria das músicas, só acho que elas casaram bem com o filme. Obrigado pela visita!