Cage e Dafoe são Cães Selvagens e sem graça

por Marcelo Seabra

Depois de alguns filmes dos quais ninguém deve ter ouvido falar, o diretor e roteirista Paul Schrader, aos 70 anos, volta a ter um projeto chegando aos cinemas brasileiros. Mas isso não significa que Cães Selvagens (Dog Eat Dog, 2016) seja exatamente bom. É, no máximo, um filme estranho, com algumas sacadas geniais, mas sem nunca prender seu espectador ou criar tensão.

Famoso desde a década de 70, membro da turma conhecida como a “Nova Hollywood”, Schrader assinou vários roteiros interessantes, como Taxi Driver (1976) e Touro Indomável (Raging Bull, 1980), e logo partiu para a direção. Nessa função, lançou o famoso Gigolô Americano (American Gigolo, 1980) e, já nos anos noventa, Temporada de Caça (Affliction, 1997), provavelmente o último trabalho dele a causar algum barulho.

Para o que poderia ser uma volta por cima, o diretor chamou dois antigos conhecidos: Nicolas Cage (de Fúria, 2014) e Willem Dafoe (de O Homem Mais Procurado, 2014). Na história, conhecemos o trio, completo com Christopher Matthew Cook (de Under the Dome), que saiu da cadeia há pouco. Mais uma condenação significaria prisão perpétua, mas esse risco não vai mantê-los fora de problemas. Troy (Cage) tem um contato, El Greco (estreia como ator do próprio Schrader), que vai conseguir para eles um trabalho que promete pagar bem.

Cães Selvagens é baseado num livro de Edward Bunker, mais lembrado como o Mr. Blue de Cães de Aluguel (Reservoir Dogs, 1992), e conta com roteiro de Matthew Wilder (de Your Name Here, 2008). O resultado é uma mistura de situações batidas, já vistas em outros longas, com outras beirando o surreal. A falação do personagem de Dafoe, Mad Dog, é um exemplo de momento em que o filme perde qualquer ligação com o público. A tentativa de desenvolver a personalidade do sujeito acaba criando mais antipatia por ele. E seria bem complicado ter alguma simpatia por um psicopata como aquele.

Certos enquadramentos de Schrader criam cenas visualmente interessantes, e o uso da cor é bem acertado. O vermelho cria uma metáfora infernal, enquanto uma mistura inusitada representa a viagem das drogas. A sequência em preto e branco é particularmente bonita. Mas uma certa apelação para o gore, que pontua mortes exageradas com humor, são totalmente descabidas, mostrando muita falta de noção dos realizadores. Somando isso às ações estúpidas de seus protagonistas e ao senso de injustiçados que eles têm de si mesmos, temos um resultado que fica no negativo. E seguimos na esperança da reabilitação de Schrader.

O diretor posa com o elenco entre as filmagens

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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