Mãe e filho comovem em O Quarto de Jack

por Marcelo Seabra

Dentre os destaques da temporada atual de lançamentos, uma das obras mais delicadas é O Quarto de Jack (Room, 2015). Contada a partir do ponto de vista de um garoto de cinco anos, a história traz ótimas observações a respeito do mundo, impregnadas de um otimismo de quem ainda não viu o que a humanidade tem de pior. Palmas para o diretor, Lenny Abrahamson, que soube conduzir o projeto com maestria e teve o tato necessário para arrancar do pequeno Jacob Tremblay uma atuação de veterano, ganhando o mesmo destaque da ótima Brie Larson.

Vivendo mãe e filho, Larson e Tremblay merecem todos os aplausos que vêm recebendo. Sequestrada aos 17 anos, Joy é mantida como escrava sexual por um desconhecido mais velho e acaba engravidando. Quando a conhecemos, Jack está com cinco anos e o quarto pequeno onde vivem é o único mundo que ele conhece. É comovente o tanto que o ser humano se adapta: Jack dá nomes a objetos, cria histórias segue vivendo alegremente ao lado da mãe. Ela, no entanto, sabe o que se passa e disfarça bem seu sofrimento, sacrificando-se para poupar o filho.

Em determinado momento, há uma virada na história, adaptada pela própria autora do livro, Emma Donoghue. Joy e Jack conseguem sair de Quarto e o garoto começa sua jornada de conhecimento de tudo. Tremblay brilha em cada pequena oportunidade que tem. A cena em que vê pela primeira vez um cachorro, por exemplo, comprova o imenso talento do ator, hoje com nove anos. E Larson (de Descompensada, 2015) dá a dimensão ideal a Joy, uma mãe que segura toda a sua dor para criar um cenário favorável para o filho, desabando quando sua força já não é mais essencial. A química entre os dois é algo palpável, vende bem a ideia da ligação entre eles.

A fotografia, trabalho de Danny Cohen (de Os Miseráveis, 2012), ajuda muito a construir para o público a percepção de Jack. Se Quarto parece grande para ele, o mundo exterior é algo inimaginável, mas ele continua preso, em sua cabeça. A trilha de Stephen Rennicks, antigo colaborador de Abrahamson (de Frank, 2014), abusa um pouco do sentimentalismo, mas mantém-se correta na maior parte do tempo. E Joan Allen (de O Legado Bourne, 2012), além de William H. Macy (de Cake, 2014), é um grande reforço ao elenco, segurando a barra de ser a mãe da desaparecida e de reencontrá-la sete anos depois, quando já não se tinha mais esperança.

Vários pontos da história de O Quarto de Jack chamam a atenção e pedem uma discussão. Visão de mundo, adaptação a ele, readaptação também, vingança… É uma obra rica que engana o público inicialmente com uma falsa impressão de simplicidade. Apesar de que deve sair do Oscar 2016 com apenas a estatueta de Melhor Atriz (para Larson), é um filme que não precisa de prêmios para provar sua relevância. Apenas as indicações já chamaram atenção o suficiente e o honraram com um bom volume de ingressos vendidos.

Larson e Allen celebram seu jovem astro

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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