por Marcelo Seabra
Muita gente tem apontado a interpretação de Johnny Depp como o principal trunfo de Aliança do Crime (Black Mass, 2015), longa que era planejado há anos e finalmente chega aos cinemas. A verdade é que vários nomes do elenco merecem destaque e é exatamente isso a maior atração do projeto. Se alguns desses atores aparecem no Oscar do ano que vem, não vai ser surpresa. Uma história forte e interessante como essa merecia mesmo um elenco de peso, mesmo que a atenção dispensada a cada um seja um tanto desigual.
A diferença principal deste Aliança do Crime para outros filmes de máfia, como os de Martin Scorsese, por exemplo, é que trata-se de uma história real. Mas a influência é clara. Depp deixa de lado momentaneamente os papéis mais estranhos, como em Mortdecai (2015), mas não abandona a transformação pela qual parece passar em todo papel que vive. Quase careca e de lentes de contatos azuis, ele é uma figura bem estranha. Essas características acabam servindo como uma distração perigosa, que pode tirar o público do filme. Mas Depp emprega seu carisma e constrói um monstro que parece ser o herói da vizinhança, sendo querido por todos à sua volta.
O protagonista do longa, já retratado no documentário Whitey: United States of America v. James J. Bulger, é um criminoso que consegue dominar a região onde vive com a ajuda do FBI, por mais incrível que isso possa parecer. Whitey Bulger (Depp) se associa a um agente do Bureau, John Connolly (Joel Edgerton, de Êxodo: Deuses e Reis, 2014), seu velho conhecido, para aparentemente servir de informante. Mesmo não sendo um sujeito exatamente genial, Bulger manipula o FBI a combater seu inimigo, a máfia italiana, e toma conta de boa parte de Boston. Cada vez mais violento, ele parece estar envolvido em todos os crimes da cidade e ainda assim fica à solta, tranquilo por saber que tem proteção federal. E, para piorar, é irmão de um senador norte-americano (Benedict Cumberbatch, o Sherlock). A lealdade que ele inspira é outro traço fantástico de sua personalidade, mas totalmente usado para o mal.
A construção mais completa de um personagem nesse roteiro é a do agente Connolly. Edgerton consegue ser durão e trouxa na mesma medida, conferindo um grau de vulnerabilidade necessário para que acreditemos em sua jornada, de homem da lei idealista e competente a fã número um do psicopata que ele admira desde jovem. Ao voltar para sua cidade natal, Connolly reencontra aquele mundo e logo volta a ser o garoto impressionável das ruas de Boston, onde se tornou próximo dos irmãos Bulger. A vaidade vai tomando conta dele e os presentes-propinas se tornam cada vez mais frequentes, e vemos um indivíduo se afundando na lama.
Como geralmente acontece num bom filme de máfia, temos belas imagens, externas e internas, na luz ou nas sombras. A fotografia é cortesia de Masanobu Takayanagi, que volta a trabalhar com o diretor Scott Cooper depois do fraco Tudo por Justiça (Out of the Furnace, 2013). O roteirista, Jez Butterworth, parece estar na moda, tamanha a lista de longas que têm assinado, como Spectre (2015) e James Brown (2014). Ele escreveu com o novato Mark Mallouk, adaptando Black Mass: The Irish Mob, The FBI and a Devil’s Deal, dos jornalistas Dick Lehr and Gerard O’Neill. O livro foi publicado em 2001 e antes mesmo já havia interesse pela compra dos direitos. Por vários motivos, tendo sido pensado até em uma minissérie, a produção foi atrasada e trocou de equipe várias vezes, terminando nas mãos de Cooper, que está longe de ser um diretor criativo, com um estilo marcante. Ele já ajudou Jeff Bridges a ganhar um Oscar (por Coração Louco, 2009), vamos ver se acontece o mesmo com Depp.