John Lithgow e Alfred Molina vivem uma bela história de amor

por Marcelo Seabra

Como já cantaram Bo Diddley, Buddy Holly e vários outros, o amor é estranho. O diretor e roteirista Ira Sachs (de Deixe a Luz Acesa, 2012) usou esse mote para contar uma bela história de amor, companheirismo e luta contra adversidades que se chama exatamente O Amor É Estranho (Love Is Strange, 2014). Além de tratar as situações de forma bem realista, misturando momentos cômicos e dramáticos, o filme conta com dois grandes protagonistas que, por si só, já valem o ingresso.

Ben (John Lithgow) e George (Alfred Molina) conseguem finalmente se casar, depois de quase quarenta anos de relação. O casamento torna ainda mais pública a orientação dos dois, que nunca esconderam nada. Por isso, George é demitido e começa uma dificuldade com as contas a pagar. Os dois optam por vender o apartamento e comprar um mais barato, mas os trâmites para a aquisição demoram mais do que deveriam, fazendo os dois dependerem de amigos e parentes para acolhê-los. E ninguém consegue receber os dois juntos, separando o casal por alguns dias.

O roteiro, escrito por Sachs e Maurício Zacharias (de Madame Satã, O Céu de Suely e Deixe a Luz Acesa), retrata seus protagonistas de forma singela, deixando o fato de serem dois homossexuais da terceira idade como apenas um detalhe. E é exatamente o que é: um detalhe, numa história de amor bonita e melhor construída que muitos filmes que acabam ganhando mais atenção. Os problemas vividos nessa etapa da vida independem de orientação sexual, religião ou time de futebol. Todos caminham para o mesmo fim, e sorte de Ben e George terem um ao outro para se apoiarem.

O grande trunfo de O Amor É Estranho é o par principal. Lithgow, a melhor participação da série Dexter, já mostrou ser um excelente ator em diversos papéis, de pai inofensivo (como em Planeta dos Macacos: A Origem, 2011) a psicopata (Síndrome de Caim, 1992), ou os dois juntos (em Dexter). Molina, mais lembrado como o Dr. Octopus de Homem-Aranha 2 (Spiderman 2, 2004), está no mesmo patamar, e os dois juntos funcionam excepcionalmente bem. O carinho e a admiração que demonstram um com o outro é algo milimetricamente calculado que aparece como natural, surge sem grandes esforços. Evitando clichês e exageros, os dois dão muita dignidade a seus personagens, que passam por uma fase difícil, mas permanecem educados e respeitosos, mesmo que carentes e tristes pela situação. No elenco de apoio, destaque para Marisa Tomei (de O Lutador, 2008), sempre uma figura marcante, e o jovem Charlie Tahan (de Blue Jasmine, 2013).

É muito interessante ver a mudança pelas quais os coadjuvantes passam ao ajudarem Ben e George na adversidade. Quem mais parecia ser atencioso e preocupado pode se mostrar insensível ou intolerante. É muito fácil ser legal em festas e jantares, situações pontuais em que todos falam de amenidades e se divertem. Dizem que, dando poder, você conhece uma pessoa. Precisando dela também. É na necessidade que a verdade aparece.

Ira Sachs e seus atores dão uma pausa nas filmagens

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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