por Marcelo Seabra
O provável casal mais famoso do Cinema da atualidade, Brad Pitt e Angelina Jolie, está ao mesmo tempo em cartaz, em filmes e funções diferentes, ambos com a Segunda Guerra Mundial como pano de fundo. E o resultado é mais ou menos o mesmo: obras cansativas, visualmente belas, que não conseguem engajar o público na luta de seus personagens, por mais bravos e honrados que eles sejam. Os dois passam de duas horas de exibição, com situações que se estendem por muito mais do que o necessário. Não são ruins, é bom reforçar, mas não empolgam.
Em sua segunda experiência na cadeira de diretora (após Na Terra de Amor e Ódio, 2011), Jolie assina Invencível (Unbroken, 2014), adaptação da história do ítalo-americano Louis Zamperini, que saiu das competições olímpicas de corrida para os fronts de batalha em território japonês. Conhecemos melhor o garoto Louie em sua infância, um começo bem promissor para o filme. Logo, o ritmo muda, ele cresce e começa a competir em corridas para, em seguida, ser convocado para defender o país. A partir daí, começam a desventuras do jovem, que passa por provações de um sadismo extremo.
Em evidência por viver o protagonista, Jack O’Connell não começou agora, como muitos têm pensado. Ele está, por exemplo, em Sem Saída (Eden Lake, 2008) e Harry Brown (2009), bons filmes que não chamaram muito a atenção quando lançados. O ator teve agora sua grande chance e a aproveita bem, compondo um personagem carismático e seguro. Mas o roteiro não o ajuda, deixando claro que Zamperini passaria pelo inferno de cabeça erguida, sem se queimar. Em momento algum, temos uma sensação real de perigo, por pior que seja o que vem pela frente. Sabendo que esta é uma história real, e que o ex-combatente morreu em julho, já velhinho, temos certeza de que ele merecia ser honrado com um filme com mais emoção.
A mistura de roteiristas, com os ácidos irmãos Joel e Ethan Coen (de Inside Llewyn Davis, 2013), o veterano William Nicholson (de Os Miseráveis, 2012) e o açucarado Richard LaGravenese (de Dezesseis Luas, 2013), não deu um resultado dinâmico. Os eventos importantes são mostrados um a um, como se fossem riscados de uma lista, até que se chegue ao final do suplício do personagem. E Jolie, como diretora, parece estar apenas cumprindo uma obrigação, não acrescentando qualquer estilo ou criatividade. Em grande parte, o maior responsável pelas qualidades de Invencível é o diretor de fotografia Roger Deakins, que capta imagens lindas e nos faz agüentar os longos 137 minutos de duração.
Também no front, Brad Pitt é o nome principal no elenco de Corações de Ferro (Fury, 2014), filme que pega a Segunda Guerra em seus últimos meses, quando todos os cidadãos estavam sendo recrutados como última esperança de vitória da Alemanha. É impossível não comparar o trabalho do ator com o que ele fez em Bastardos Inglórios (Inglourious Basterds, 2009), mas Pitt tem dificuldade para acertar o tom. Ele é o sargento que lidera um grupo de cinco em um tanque. Ao perder um deles, ele recebe um novato (Logan Lerman, de Noé, 2014) e precisa aguentar firme até que o conflito chegue ao final. Shia LaBeouf (de Ninfomaníaca, 2013), Michael Peña (de Marcados para Morrer, 2012) e Jon Bernthal (de O Lobo de Wall Street, 2013) completam o tanque.
David Ayer, diretor e roteirista, tem sua cota de acertos e erros. Ao mesmo tempo em que ele é responsável pelo tenso e competente Marcados para Morrer (End of Watch, 2012), é dele também o irritante Tempos de Violência (Harsh Times, 2005). Faz parte de seu estilo buscar uma realidade gráfica, crua, como em um desses telejornais “mundo cão”, que mostram sangue e vísceras. E a fotografia do russo Roman Vasyanov (também de Marcados…) casa muito bem, produzindo imagens poéticas em meio à destruição. A mistura dessa objetividade com as boas atuações causa uma boa impressão. Mas assusta o que está por trás: a idealização da guerra e a justificativa para o comportamento psicótico de certos personagens.
Em clássicos do Cinema de guerra, como os de Oliver Stone, Kubrick e companhia, as figuras psicóticas muitas vezes são vítimas da brutalidade ou vilões, e não os heróis. Ayer tenta humanizar os combatentes americanos, mesmo mostrando-os como maníacos que não se importam em matar ou estuprar. Mas os alemães, estes podem continuar sendo malfeitores de uma dimensão apenas, que só servem para complicar as situações ou morrer. O próprio personagem de Pitt é daqueles que se utilizam da ideia de que é sendo hostilizado que um novato aprenderá a se virar e, por conseqüência, se tornará um homem. Ou seja: eu te torturo psicologicamente (e até fisicamente) hoje e você me agradecerá amanhã.
Tanto Corações de Ferro quanto Invencível se beneficiariam de alguns minutos a menos, tornando as coisas mais ágeis. Fica a impressão de que a guerra era, na maior parte do tempo, cansativa. E até podia ser mesmo. Mas não há necessidade de o público compartilhar desse tédio. O ingresso é pago para diversão, reflexão e diversos outros objetivos. Combate à insônia não é um deles.