Moisés volta a abrir o mar no Cinema

por Marcelo Seabra

Exodus

No mesmo ano em que Darren Aronofsky resolve recriar a história de Noé, Ridley Scott filma outra das passagens mais famosas da Bíblia. Chega aos cinemas nesse Natal Êxodo: Deuses e Reis (Exodus: Gods and Kings, 2014) já sob a suspeita de ser outra decepção que não vai agradar nem a cinéfilos, nem a religiosos. E a crítica estrangeira não tem perdoado a produção, apontando diversos pontos supostamente fracos. As qualidades, no entanto, não devem ser esquecidas, e elas são muitas, distribuídas por vários aspectos.

Buscando não fazer um filme muito fantasioso, Scott tenta explicar muita coisa de forma científica. Mas ele toma a acertada decisão de não excluir a figura divina da produção, já que muito ali não teria como ter outra explicação. Um roteiro escrito a oito mãos não costuma ser um bom presságio, e isso pode ter influenciado no ritmo do filme, que é bem irregular. Há trechos rápidos, em que tudo se resolve objetivamente, e há outros que se arrastam, como a apresentação das dez pragas do Egito. O cuidado para uma boa construção é percebido, mas essa passagem é uma das que poderiam ter sido mais curtas. O resultado é um filme de 150 minutos que pode se tornar cansativo.

Exodus cast

Para o papel principal, desde o início o diretor deixou claro seu desejo de ter Christian Bale, hoje mais lembrado como Batman. Sendo discreto, mas vigoroso, Bale compõe um personagem interessante, dando a Moisés nuances humanas, com fraquezas e dúvidas, se afastando da imagem que muitos podem alimentar de que ele seria um representante infalível de Deus. Duelando com o ator galês, no papel de Ramsés II, está o australiano Joel Edgerton (de O Grande Gatsby, 2013), em uma personificação de um monarca que consegue ser másculo mesmo com o olho pintado e diversos ornamentos, ao contrário da figura andrógina de Rodrigo Santoro em 300 (2006 e 2014). Ramsés é mostrado como um faraó vaidoso, que nem sempre toma as melhores decisões, mas que tem grande consideração por seu quase irmão e que defende a família.

Reunindo todo o elenco, é fácil notar a variedade de sotaques, o que causa uma certa estranheza. Outros nomes famosos vistos em cena são Ben Kingsley, Sigourney Weaver, John Turturro, Ben Mendelsohn, Aaron Paul e a bela espanhola María Valverde, que vive a esposa de Moisés. Com mais ou menos destaque, nenhum desequilibra o todo. Uma das adaptações que se fazem necessárias na história envolve o vice-rei de Mendelsohn e a intriga que ele cria. A cronologia de Moisés também precisa ser alterada, já que não é difícil achar, na Bíblia, personagens que tenham vivido por centenas de anos. Mas não seria muito crível ver um senhor de mais de cem anos conduzindo o povo pelo deserto. Ainda assim, ele envelhece bem mais que a esposa.

O ponto principal que faz esse Êxodo: Deuses e Reis ter sucesso, ou mais que Noé (Noah, 2014), é tentar equilibrar o viés científico com o religioso. Ao mesmo tempo em que busca ser pé no chão, tendo explicações lógicas, o roteiro não exclui a influência divina sobre Moisés, representada por um menino que aparece quando julga necessário. Isso, apesar de o próprio cartaz do filme dar outra impressão, já que parece ser mais uma versão fantasiosa com aquele paredão de água digno de Os Dez Mandamentos (The Ten Commandments, 1956). Na carreira de um cineasta responsável por Os Duelistas (The Duellists, 1977), Alien (1979), Blade Runner (1982) e Gladiador (Gladiator, 2000), para ficar em alguns exemplos, este Êxodo não figura como um dos destaques. Mas tampouco é um fracasso como Robin Hood (2010). E ainda serve como uma bela homenagem de Ridley a seu irmão caçula, Tony Scott, falecido em 2012.

O mar não se abre magicamente, mas volta com tudo

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Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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Uma resposta para Moisés volta a abrir o mar no Cinema

  1. Wagner Cardoso disse:

    Blade Runner é o meu favorito de todos os tempos e tbm acho Alien uma obra máxima do cinema e fico impressionado como Ridley Scott foi perdendo a mão com o tempo apesar de bons filmes como Chuva Negra no percurso.Ele não tem mais aquela aura inovadora quase experimental do começo de carreira que impressionava até o Steve Jobs.No Prometheus ele teve a chance da virada e deveria ter colocado mais silêncio como menos diálogos deixando o filme com um clima enigmático que precisava e nesse épico poderia ter escolhido melhor o elenco.Espero que um dia ele consiga voltar a ser quem foi!!!

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