por Marcelo Seabra
Uma franquia da literatura que chega aos cinemas tem à sua volta a promessa de render mais filmes. E já fica aquela sensação de que o final será aberto, deixando pontas óbvias para as sequências. É exatamente o que acontece com Ender’s Game – O Jogo do Exterminador (2013), história sobre a gênese de um suposto herói que pode se arrastar por vários episódios, dependendo da bilheteria deste primeiro. Sorte que o retorno não tem sido interessante, nem foi suficiente ainda para bancar seus 110 milhões de dólares de orçamento.
Lembrado, o que é motivo para vergonha, por X-Men Origens: Wolverine (2009), o diretor e roteirista Gavin Hood é o responsável pela adaptação do livro que Orson Scott Card lançou em 1985. O resultado não fica muito longe do alcançado pela aventura solo do mutante. Diálogos expositivos e óbvios, ações inexplicáveis e personagens aborrecidos farão o público desejar ter revisto algum bom filme de ficção científica ao invés de perder tempo com este. As referências que vêem à cabeça durante a projeção são muitas, e todas superiores, começando por Star Wars e Star Trek.
Dois anos depois do sucesso de A Invenção de Hugo Cabret, o garoto Asa Butterfield volta a encarar a tarefa de viver um protagonista. Ele é Ender Wiggin (nome sacaneado pelos próprios colegas), o terceiro filho de uma família cujos dois mais velhos já foram reprovados para aquela que parece ser a função para a qual todos nascem: ser piloto da frota espacial e ajudar a Terra num possível novo ataque de uma raça alienígena que já matou milhões. Desde o primeiro contato com o menino, o Coronel Graff (Harrison Ford) vê nele algo espetacular e aposta suas fichas que será ele a salvar todos nós. Por algum motivo.
Ender passa por vários testes e acompanhamos a formação desse grande enviado divino, algo como os Skywalkers ou Neo, de The Matrix (1999). Em momento algum a fé cega de Graff é justificada, já que os grandes momentos de brilhantismo de Ender só são interpretados dessa forma por quem está do lado de lá da tela. Para quem assiste, são apenas conclusões pensadas por um menino que joga muito videogame. Se você coloca uma verdade na cabeça, qualquer fato externo pode servir para corroborá-la, basta interpretar de maneira conveniente. É o que Graff parece fazer, e ficamos constrangidos por ver um astro do quilate de Ford passando por esta situação.
Indicada ao Oscar por Bravura Indômita (True Grit, 2010), Hailee Steifeld fica relegada à função de interesse amoroso mal resolvido de um menino mirrado que parece ser bem mais jovem, além de mais inexperiente que ela naquele mundo. Com Abigail Breslin, a adorável Pequena Miss Sunshine (Little Miss Sunshine, 2006), e com Viola Davis (de Histórias Cruzadas, 2011) acontece a mesma coisa. Sir Ben Kingsley, no mesmo ano do malhado Homem de Ferro 3 (Iron Man 3, 2013 – ao lado), foi mais longe, com temas maoris tatuados no rosto para lembrar suas origens e, como seus antepassados, poder se comunicar com os mortos. Uma característica ridícula que pretendia conferir profundidade ao personagem e acaba não servindo para nada.
Os cenários de Ender’s Game são basicamente as salas dentro de estações espaciais, com poucas exceções. Ao contrário da riqueza de Círculo de Fogo (Pacific Rim, 2013), é tudo muito limpo, chato, refletindo a falta de criatividade geral da produção – outro exemplo é a trilha sonora genérica e didática de Steve Jablonsky, que faz o mesmo na franquia dos Transformers. Se você não souber o que esperar ou pensar em algum momento, não se preocupe: a trilha vai te indicar exatamente o que virá. Mas isso não deve acontecer, interpretações não são necessárias. Boas ficções científicas costumam fazer o público refletir sobre várias questões, o que não é o caso aqui.