por Marcelo Seabra
Alguns filmes conseguem nos fazer torcer por seu personagem, por pior que ele seja. Se o protagonista é um assassino da máfia, é bem complicado demonstrar qualquer simpatia. Talvez este seja o principal defeito de O Homem de Gelo (The Iceman, 2012): acompanhamos a vida daquele sujeito à distância, sem nunca nos envolvermos. Mas não deixa de ser uma história interessante e um estudo de personagem rico, e ainda ganhamos outra ótima performance de Michael Shannon.
Mais famoso como o General Zod de O Homem de Aço (Man of Steel, 2013), Shannon já vinha chamando a atenção em diversos trabalhos, como no longa O Abrigo (Take Shelter, 2011) e na série Boardwalk Empire. Como o psicopata Richard Kuklinski, ele mais uma vez mostra ser capaz de fazer muito com um roteiro que não lhe daria muitas possibilidades. Baseado no livro de Anthony Bruno e no documentário de James Thebaut, O Homem de Gelo é basicamente dividido em três partes: a transição de trabalhador para executor, a carreira na máfia e o declínio. Como a segunda parte é a mais longa, pulamos de uma morte a outra e as coisas só não caem na mesmice pela presença forte de Shannon.
Kuklinski, que ficou famoso pelo apelido que denuncia sua frieza, tocava um negócio de pornografia escondido da esposa (uma pequena participação de Winona Ryder, de Cisne Negro, 2010). Quando um mafioso acaba com seu trabalho, outro é oferecido: ele teria que matar uma pessoa. Quando cumpre a tarefa com tanta diligência, o tal chefão, Roy DeMeo (Ray Liotta, de O Homem da Máfia, 2012), o mantém na função. Em 40 anos de “carreira”, estima-se algo em torno de 100 mortes, e nenhum arrependimento. E tudo isso sem que a família Kuklinski tivesse a menor noção do verdadeiro emprego do respeitado pai. Além de Liotta, a produção conta com bons nomes no elenco, como David Schwimmer, James Franco, Chris Evans, Robert Davi e Stephen Dorff.
Com o livro de Bruno e o documentário de Thebaut, produzido pela HBO, pode-se dizer que O Homem de Gelo é bem fiel aos acontecimentos da vida de Kuklinski. A marcante caracterização de Shannon também é bem próxima, e ele imita até o tom de voz. A reconstituição da época é impecável e a fotografia imprime uma crueza ao filme que assemelha seu visual a grande clássicos do gênero, como um Scorsese ou um De Palma. Mérito do diretor e roteirista Ariel Vromen (de Danika, 2006), que reuniu todos estes talentos. Ele poderia ter se saído ainda melhor se conseguisse humanizar Kuklinski um pouco, talvez focando mais em sua vida familiar e nos conflitos com a esposa.
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