Ethan Hawke vive Uma Noite de Crime

por Marcelo Seabra

“Lembrete: todos os serviços de emergência serão suspensos”. Por 12 horas, crimes de todas as naturezas são permitidos, inclusive assassinato, sem possibilidade de socorro. Isso, para purgar os pecados e purificar a alma de todos, ou alguma bobagem do gênero. Ou, como logo fica claro, para que se possa justificar a hipocrisia de uma sociedade ligeiramente futurística que se diz tranquila e segura à custa de permitir o sacrifício da parcela mais pobre e doente da população. Esse é o ponto de partida para Uma Noite de Crime (The Purge, 2013), novo suspense que propõe discussões interessantes, sem se aprofundar em nenhuma delas.

Uma noite, a cada 365 dias, das 19h às 7h da manhã, tudo é permitido. Assim, teoricamente, as pessoas cometem todos os delitos que quiserem para não precisar fazê-lo o resto do ano. Garotos ricos e mimados, por exemplo, podem ir às ruas e matar mendigos, e você poderia fazer o mesmo com o seu chefe. Nesse contexto, conhecemos a família Sandin, que tem uma vida mais do que confortável em um luxuoso condomínio, tudo conquistado à custa do trabalho de James (Ethan Hawke, de Antes da Meia-Noite, 2013), que vende equipamentos de segurança. Ele vive com a esposa (Lena Headey, a vilã de Dredd, 2012) e os dois filhos. Julgando-se seguros dentro de casa durante a noite da purgação, os Sandins verão que não será tão fácil sobreviver.

A exemplo de filmes como Funny Games (1997 e 2007) e Os Estranhos (The Strangers, 2008), temos aqui o pânico de ter o seu lar invadido. A diferença, no entanto, é que os invasores se identificam e revelam suas razões, por mais absurdas que sejam. E eles ainda têm a benção do governo, já que naquele dia vale tudo. As possibilidades polêmicas criadas pela premissa do diretor e roteirista James DeMonaco são várias e válidas, e a primeira é a mais óbvia: os líderes desse futuro (são apenas dez anos de diferença) buscam uma solução para a violência crescente que as cidades enfrentam. Mas é justificado liberar o crime, mesmo que por 12 horas? A melhor forma de não ter criminosos é eliminando-os? Ou, pior, permitindo que as supostas pessoas de bem o façam?

Apesar de ter esse início bem promissor, Uma Noite de Crime rapidamente perde a mão, colocando seus personagens em uma situação forçada e desnecessária, envolvendo um certo namorado. Logo em seguida, a violência pura e simples invade a tela e tudo se torna um aborrecido jogo de sobrevivência, perdendo toda a força que poderia ter tido. Isso, N produções oferecem, de tempos em tempos. Não que tudo vire uma catástrofe, mas é muito triste perceber o mau uso de um belo potencial. O elenco, correto, é desperdiçado, a expectativa criada fica por terra e seguimos adiante só para ver que fim terá aquela família. O final é apenas coerente e é questão de minutos até que se esqueça do filme.

Este é o educado líder dos dementes

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

View Comments

  • Pow Marcelo, você acabou com minhas expectativas por esse filme. Vi o trailer e fiquei com a maior vontade de assistir agora, perdi toda a vontade. Vou deixar pra ver em DVD!

  • Concordo com tudo que você disse, Marcelo!
    Um filme com um potencial enorme, que se perde ao longo da projeção. Uma pena.

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