por Marcelo Seabra
Cercado por muita expectativa do grande público, finalmente chega aos cinemas a cinebiografia Somos Tão Jovens (2013), longa que se propõe a apresentar o jovem Renato Russo, antes da fama e da Legião Urbana – daí o título, inspirado nos versos da clássica Tempo Perdido. O destaque da produção, como aconteceu em Cazuza – O Tempo Não Para (2004), é a interpretação do ator principal, Thiago Mendonça, fundamental para o sucesso de público que a obra vem atingindo. As canções de Russo também são um diferencial que tem mobilizado muita gente, e dá para perceber isso quando uns e outros começam a cantar dentro do cinema. Já é a sexta melhor estreia desde a chamada Retomada do Cinema Brasileiro.
Depois de descartar a possibilidade de fazer um documentário sobre a vida do cantor e compositor, o cineasta Antônio Carlos da Fontoura (de Gatão de Meia Idade, 2006), amigo de Russo e da família Manfredini, propôs focar nos anos de formação do artista, aqueles que não são muito conhecidos pela maioria. Trata-se de um “filme de origem”, tão na moda com super-heróis, e ignora os anos finais e tristes da vida de Russo, morto em 1996 em decorrência da AIDS.
A intenção da mãe de Renato, D. Carminha, era ter um filme alegre para lembrar o filho, e não algo deprimente, focado na degeneração física que ele sofreu após contrair o vírus que o levou. Talvez por isso, Fontoura e seu roteirista, o experiente Marcos Bernstein (de Meu Pé de Laranja Lima, 2012), não se prendam aos elementos mais dramáticos daqueles anos de chumbo. A questão da sexualidade, por exemplo, é tratada de leve, assim como a luta contra a ditadura, o uso de álcool e substâncias ilegais e as crises existenciais. A necessidade de emendar citações a músicas de Renato nos diálogos irrita, e muitas delas têm sua gênese explicada, o que soa bem forçado.
Para simplificar, Bernstein usou um recurso comum principalmente na adaptação de livros: mesclar personagens. Ana Cláudia, vivida pela ótima e discreta Laila Zaid, não existiu, é apenas o resumo de várias mulheres que passaram pela vida de Renato. O mesmo acontece com Carlinhos (Antônio Bento), que representa os homens de Renato. No elenco adulto, Marcos Breda e Sandra Corveloni vivem os pais, e passam por momentos engraçados em meio à atitude dos jovens punks de Brasília. Mendonça, que já havia interpretado o cantor sertanejo Luciano em Os Dois Filhos de Francisco (2005), canta e toca de fato, o que traz bastante veracidade ao longa. Suas caras e bocas remetem diretamente a Russo e até as desafinadas ao vivo são legítimas.
Entre os jovens, é interessante notar que muitos dos amigos da “turma da colina” ficaram famosos. Não é difícil identificar Dinho Ouro Preto (Capital Inicial), Philippe Seabra (Plebe Rude) e Herbert Viana (Paralamas do Sucesso) em meio aos principais, como os irmãos Lemos e André Pretorius (identificado como Petrus), entre vários outros. A caracterização de Petrus (vivido por Sérgio Dalcin – ao lado) é extremamente exagerada, fugindo do tom dos demais. Edu Moraes, que faz Herbert, tem um trabalho vocal fantástico, parece o original falando.
Em 2011, foi lançado Rock Brasília – A Era de Ouro, documentário que retrata bem a “turma da colina” e as bandas que se originaram da capital do Brasil. Somos Tão Jovens é a versão ficcional, focada em Renato. É impossível explicar tudo e dar início, meio e fim para todos os personagens. Alguns coadjuvantes entram e saem e não entendemos bem a trajetória deles. As anedotas mais populares vão se enfileirando, como a briga entre Renato e Fê Lemos, que termina com um arremesso de baqueta. Dá a sensação de que o roteirista precisa arrumar lugar para todos os fatos listados previamente. Para os interessados naquela cena do rock nacional, não deixa de ser curioso conhecer esses episódios. E fica a esperança de que, logo, assistiremos à parte 2, que bem poderia se chamar Legião Urbana.