PT Anderson nos apresenta a O Mestre

por Marcelo Seabra

Freddie Quell (Joaquin Phoenix) é um soldado voltando para casa sem saber exatamente o que fazer. O problema físico, de postura, é o menor deles. Freddie não tem rumo quanto à profissão ou futuro e nem uma família a quem recorrer. Talvez essa necessidade de uma figura paterna faça com que ele fique tão próximo do líder carismático Lancaster Dodd (Philip Seymour Hoffman), que está no processo de criar uma religião, ou culto, ou seita. Qualquer que seja o nome, o que importa é que ele é chefe, o que parece alimentar bem o ego do sujeito.

O Mestre (The Master, 2012) é o novo longa de Paul Thomas Anderson, diretor que está ainda em seu sexto longa (como Magnólia, de 1999, e Sangue Negro, de 2007), mas há muito é incensado como gênio, melhor de sua geração e outros exageros. De fato, PTA demonstra grande preciosismo técnico, usando ótimas peças, como a fotografia de Mihai Malaimare Jr. (dos dois últimos trabalhos de Coppola, Twixt e Tetro) e a trilha de Jonny Greenwood, para construir uma bela obra. O problema é o conteúdo, que fica um tanto vago e não escolhe uma direção a seguir. O longa é vendido como uma crítica à Cientologia, e de fato usa alguns elementos ligados à seita dos famosos de Hollywood. Mas em momento algum ele toma uma posição de criticar o movimento ou os membros, se limitando a mostrar traços negativos da personalidade do criador, Dodd.

Disputando o foco, Phoenix e Seymour Hoffman dão o melhor nos papéis principais e foram indicados a vários prêmios não por acidente. Phoenix, já indicado ao Oscar por Johnny & June (Walk the Line, 2005) e por Gladiador (Gladiator, 2000), este como coadjuvante, assume a frente e vive um Freddie animalesco, um homem que dá vazão a seus instintos básicos, buscando sexo e álcool com frequência – o que não é raro de se ver por aí. Seymour Hoffman (de Tudo Pelo Poder, 2011) é a possibilidade de luz nessas trevas, alguém que trará direção à vida de Freddie. A apresentação de Dodd já começa com uma grande amostra de sua vaidade, quando ele cita as várias profissões que teria, de filósofo a físico. Ele parece se aproveitar de pessoas sem rumo, convocando-as para a sua “Causa”, e ficamos sem saber exatamente o quão genuína é a sua afeição por Freddie. Sua inexistente disposição para argumentar sobre a Causa só reforça a hipocrisia dele, que espera que as pessoas o sigam cegamente, ignorando o seu passado e a sua vida conturbada. Seria ele apenas um picareta com uma grande necessidade de reconhecimento ou um picareta que realmente acredita no que faz?

Completando o núcleo do elenco, Amy Adams (de Curvas da Vida, 2012) vive a esposa de Dodd, uma mulher calma e apoiadora que esconde uma personalidade forte. Sua participação não é grande, mas o suficiente para conhecermos Dodd um pouco melhor, apesar de o personagem ficar sempre cercado por uma aura de mistério. Seu passado e como ele entrou nessa de líder de seita nunca é explicado, temos apenas migalhas. O roteiro, também de PTA, se prende à relação entre os dois, deixando a Causa de lado. Como no próprio cartaz nacional de O Mestre há uma afirmação sobre abordar a polêmica sobre a Cientologia, numa manobra desnecessária e cretina para promovê-lo, cria-se uma expectativa ainda maior sobre os bastidores da tal igreja, que tem seguidores famosos como Tom Cruise e John Travolta. Mas este é um problema do cartaz nacional, e não do filme.

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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