por Marcelo Seabra
Apesar de acumular trabalhos na TV e no Cinema desde meados da década de 80, John Hawkes só ganhou a devida atenção quando sua interpretação em Inverno da Alma (Winter’s Bone, 2010) foi bastante premiada. Parecendo uma versão mais nova de Sean Penn e pulando entre papéis coadjuvantes, ele mostra que tem cacife para encabeçar um longa como o protagonista de As Sessões (The Sessions, 2012), um ótimo e bem atuado drama baseado em fatos. Foram doze anos de pausa na carreira cinematográfica do diretor e roteirista Ben Lewin (Um Golpe de Sorte é de 1994), e a volta valeu a pena.
Hawkes interpreta Mark O’Brien, um jornalista e poeta vitimado pela poliomielite, que danificou seus músculos e fez com que ele dependesse de um respirador artificial. Ele mexe apenas o pescoço e a cabeça, o que o deixa dependente de cuidados o tempo todo. Uma simples coceira torna-se um grande tormento. Criado dentro do catolicismo, ele brinca que gosta de ter quem culpar por sua condição. Apesar das dificuldades, Mark não perde o bom humor, e Hawkes acerta no tom. O ator se dá tão bem que parece realmente ser deficiente, como os outros atores que disputaram com ele o papel. Para se preparar, Hawkes leu os artigos e poemas de O’Brien e assistiu ao premiado documentário Breathing Lessons: The Life and Work of Mark O’Brien (1996).
William H. Macy (de O Poder e a Lei, 2011) vive o Padre Brendan, novo responsável pela paróquia frequentada por Mark. Brendan tem posturas modernas (ele bebe e fuma, por exemplo) e é bem compreensivo, e os dois logo se tornam bons amigos. Quando é contratado para escrever uma matéria sobre a relação entre sexo e deficientes físicos, Mark começa a pensar sobre si mesmo: aos 38 anos, ainda é virgem. Após uma ótima conversa com o amigo e conselheiro, ele decide buscar uma terapeuta sexual, onde entra a personagem de Helen Hunt (de Náufrago, 2000), que concorre ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante pelo trabalho.
Cheryl vai ajudar Mark a resolver seu “problema”, praticando exercícios corporais até chegar às vias de fato. Hunt encara de frente uma tarefa não muito confortável, que inclui cenas muito naturais de nudez, e mostra seu talento no que deve ser um dos papéis mais difíceis do ano. Mark é aterrorizado pela ideia de proximidade, e intimidade, como um adolescente, e terá a primeira experiência sexual como um rito de passagem à idade adulta. Mesmo correndo o risco de ser confundida com uma prostituta, Cheryl se dedica a ajudar pessoas nesse tipo de situação. Ao tirarem suas roupas, Mark e Cheryl parecem estar revelando seu interior, e a química entre os atores é fantástica.
Com um roteiro bem enxuto, baseado no artigo de O’Brien publicado em 1990, Lewin foca nos personagens, evitando um peso desnecessário ao drama e passando longe do sentimentalismo barato. O próprio Lewin sobreviveu à poliomielite quando criança, ainda tendo as muletas como lembrança. Tratando um assunto delicado com leveza, ele desvia de armadilhas e mostra um deficiente físico como um cidadão inteligente, obstinado e capaz.