por Marcelo Seabra
Já há alguns anos, Silveira e sua habitual parceira, a roteirista Patrícia Andrade, têm desenvolvido a cinebiografia de Luiz Gonzaga, e concluíram que era uma história muito rica para duas horas de filme. Por isso, decidiram focar na relação entre pai e filho, revelando como foi difícil o convívio entre os dois. Tudo, claro, fundamentado pela história de vida do pai, nascido em 1912 em Exu, no sertão de Pernambuco. Ele nunca deixou faltar nenhum bem material a Gonzaguinha, mas o garoto queria apenas ter um pai presente, enquanto era criado pelos padrinhos. Quinze horas de gravações de conversas entre os dois serviram de base para o roteiro e para estabelecer o tom do filme, que ainda contou com diversos depoimentos de amigos e parentes dos Gonzagas, que contribuíram também com objetos pessoais que foram aproveitados em cena.
O trabalho de reconstituição de época e de cenários é bem rico, passando por momentos marcantes do país. A fotografia tira bastante proveito das paisagens do sertão, com vários planos abertos mostrando como era dura a vida daquele povo. É de lá que Luiz Gonzaga sai fugido aos 17 anos, após receber uma ameaça de morte por ter se engraçado com a filha de um coronel. Chegando em Fortaleza, ele se alista no exército e segue paralelamente desenvolvendo o talento aprendido com o pai, o experiente músico e artesão Januário. Após dar baixa, ele vai parar no Rio de Janeiro, onde forma uma dupla com o violonista Xavier Pinheiro e tenta ganhar a vida tocando para o baixo meretrício da região.
Os anos vão passando e acompanhamos Gonzagão em sua escalada rumo ao sucesso, conhecemos aquela que viria a ser sua esposa e mãe do seu filho, Odaléia Guedes, e passamos também pelos momentos difíceis, que não foram poucos. O longa procura não fazer juízo de valor quanto a seus personagens, deixando para o público formar uma opinião. Não há maniqueísmo, ninguém é taxado de vilão ou herói. O próprio Gonzagão, a exemplo de Francisco (pai de Zezé e Luciano), é durão, às vezes frio e até injusto, mas nunca um sujeito desalmado ou odioso. É apenas uma pessoa que não tem respostas para todas as situações por que passa. Até Gonzaguinha é mostrado como um cara difícil, marcado por uma sensação de abandono que o torna arredio.
Assim como em Dois Filhos de Francisco, Silveira misturou atores profissionais com gente que nunca havia atuado. O resultado, com muito trabalho dos preparadores de elenco, traz autenticidade ao longa. Para viver Gonzaga pai em três faixas etárias diferentes, foram chamados o ator Land Vieira, o músico Chambinho do Acordeon e o guia do Museu Luiz Gonzaga Adélio Lima (ao lado, esq.), todos muito competentes. O único porém é a maquiagem, que não acompanha o passar dos anos, já que cada ator permanece no papel por muitos anos e não envelhece proporcionalmente. Para Gonzaguinha, escalou-se Giancarlo Di Tommaso, descoberto por testes, Alison Santos, que já havia sido testado para À Beira do Caminho, e Júlio Andrade (acima, dir.), que se apresentou e lutou pelo papel devido à admiração que nutria pelo músico, além da grande semelhança física.
Complementando o elenco, há alguns rostos reconhecidos do mundo das novelas. Nanda Costa, estrela na nova Salve Jorge, vive Odaléia, e aparecem também Sílvia Buarque, Cláudio Jaborandy, Luciano Quirino, Cyria Coentro, entre outros. Alguns nomes mais famosos fazem participações especiais, como João Miguel, Zezé Motta e Domingos Montagner. Foram mais de 200 atores e 600 figurantes, todos devidamente caracterizados com grande fidelidade ao local e época que retratavam. Este belo trabalho em equipe faz com que Gonzaga – De Pai para Filho não seja apenas uma homenagem aos dois biografados, mas uma boa experiência para fãs do cinema nacional.
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