por Marcelo Seabra
O Príncipe do Deserto (Black Gold, 2011) teve sua primeira exibição em um festival no Qatar em outubro de 2011 e só agora chega aos cinemas brasileiros. O diretor Jean-Jaques Annaud (de A Guerra do Fogo e O Nome da Rosa) decidiu filmar um épico no deserto e, para isso, escolheu um livro publicado em 1957 (The Great Thirst, do piloto e escritor sueco Hans Ruesch) sobre o começo da exploração do petróleo no Oriente Médio, ou “em algum lugar da Arábia”.
Um longa com personagens árabes estrelado pelo espanhol Antonio Banderas e pelo inglês Mark Strong já começa com um público desconfiado. A magia do cinema já fez Banderas passar por coisa parecida em O 13º Guerreiro (The 13th Warrior, 1999), e Strong já nasceu em vários países na ficção – até em outros planetas, caso dos recentes Lanterna Verde e John Carter. Os demais nomes do elenco são mais convincentes, apesar de Freida Pinto (de Imortais, 2011) ser indiana e Tahar Rahim (de O Profeta, 2009) ser francês (de ascendência argelina). Estão mais próximos que os dois veteranos, ao menos.
A história começa na resolução de um impasse: na década de 20, o progressista Nesib (Banderas) e o conservador Amar (Strong), sultões de regiões vizinhas, brigavam por uma terra de ninguém que fica entre eles, a Faixa Amarela. O acordo seria de nenhum dos dois tomar posse e o lugar continuar sem dono. Numa espécie de tradição árabe da época, um deveria ficar com os filhos do outro para garantir o pacto de não agressão. Por isso, os dois filhos de Amar passam mais de uma década vivendo na cidade e com a família de Nesib.
A paz é ameaçada quando um americano, examinando a região, encontra petróleo na tal faixa. Nesib vê aí uma oportunidade de usar o dinheiro gerado para desenvolver sua cidadela e seu povo, construindo hospitais, escolas e o que mais for necessário. Amar não concorda, julgando os estrangeiros infiéis e procurando manter as tradições. Começa então a estratégia de Nesib para tentar forçar Amar a aceitar a exploração do ouro negro. Os dois príncipes, já não tão jovens, entram no meio e caberá a um deles decidir a questão. Muita luta vai acontecer até que se chegue ao final.
O primeiro ponto positivo em O Príncipe do Deserto é a personalidade dos dois mandatários, que não vão a nenhum extremo de bondade ou maldade. Eles não são heróis ou vilões, cada um age de acordo com seus princípios e seus interesses. E o outro fator interessante é a jornada do príncipe Auda (Rahim – ao lado), cujo destino acaba lembrando (um pouco) Michael Corleone. Afinal, eles tinham outros destinos, mas acabaram tomando caminhos diferentes do esperado e mostrando características até então ocultas. O infeliz título nacional muda o foco e já entrega alguma coisa da trama. As paisagens no deserto, as cenas envolvendo inúmeros figurantes e a trilha também devem ser apontados como méritos da produção.
É verdade que o filme poderia ser mais enxuto, já que tem momentos cansativos em seus quase 130 minutos de exibição. E o roteiro parece simplificar as questões que envolvem o petróleo do Oriente Médio, apesar de ter uma conclusão satisfatória. Não há nenhuma polêmica e não se pode esperar a profundidade de um Sangue Negro (There Will Be Blood, 2009), que também aborda o assunto da ambição em torno do combustível – a “grande sede” que dá título ao livro que serviu como base. Perto de um clássico como Lawrence da Arábia (1962), ele sai chamuscado, mas merece uma conferida se o espectador for ao cinema sem expectativas, como foi o meu caso.