Aventura à moda antiga leva o homem a Marte

por Marcelo Seabra

Apesar de ter criado diversos personagens e escrito inúmeras histórias, seja de ficção ou não, Edgar Rice Burroughs é sempre lembrado por seu livro mais famoso: Tarzan dos Macacos, publicado em 1912. Chegou a hora de um outro herói de Burroughs ganhar destaque e o aventureiro John Carter estreia nas telas em um longa caro, bem feito e divertido. O que todo arrasa-quarteirão deveria ser, nada mais que bom entretenimento.

Depois de ter passado pelas mãos de Robert Rodriguez, Kerry Conran e Jon Favreau, este projeto parecia destinado ao engavetamento. Quando a Paramount abriu mão dos direitos de adaptação para se dedicar ao reinício da franquia Star Trek, a Disney não perdeu tempo e garantiu o sinal verde, escalando o diretor Andrew Stanton. Depois de animações elogiadíssimas como Wall-E (2008) e Procurando Nemo, Stanton decidiu partir para o live-action – mesmo que usando o fundo verde e uma grande quantidade de efeitos especiais. Todos muito dignos, diga-se de passagem. O 3D não chega a fazer uma diferença gritante, mas enriquece algumas tomadas e não escurece a tela.

A projeção começa e somos apresentados a Marte, planeta conhecido por seus habitantes como Barsoom. Após termos uma amostra de como anda a situação política por lá, voltamos à Nova York de 1881, onde John Carter (Taylor Kitsch, o Gambit de Wolverine, de 2009) é seguido e tem que despistar seu desconhecido seguidor. O sobrinho de Carter, Edgar Rice Burroughs (Daryl Sabara, da franquia Pequenos Espiões, em uma homenagem ao escritor), é chamado para cuidar do espólio do falecido tio. No diário que ele recebe está a história completa do ex-capitão do exército dos confederados.

Carter é um veterano da Guerra Civil que busca ouro no velho oeste e se cansou de guerras. Enquanto luta contra oficiais norte-americanos e índios, ele descobre um artefato que magicamente o leva a Marte. Lá, por uma diferença na gravidade, ele precisa dominar o simples ato de caminhar, já que é capaz de pulos gigantescos. Em pouco tempo, Carter conhece três sociedades diferentes que precisam viver em harmonia para o bem do planeta, mas estão longe disso. Claro que, mesmo que ele não queira tomar partido, isso acaba acontecendo.

O roteiro, escrito por Stanton e pelo colega Mark Andrews e revisado pelo novelista Michael Chabon, não é a coisa mais original que já se viu. Ele se baseia basicamente no livro Uma Princesa de Marte, publicado originalmente numa revista pulp em seis fascículos mensais com o título Sob as Luas de Marte. A história é um pouco previsível e até piegas, com a batida figura do herói relutante que é obrigado a vencer seus traumas e lutar numa batalha honrada. Mas a forma como é contada é contagiante e acabamos perdoando alguns furos e o fato de não haver um vilão realmente interessante. Dominic West (de 300, 2006) e Mark Strong (de O Espião que Sabia Demais, 2011) ocupam esses papéis, mas não convencem. O elenco ainda conta com participações de James Purefoy, Ciáran Hinds e Bryan Cranston em formas humanas e Samantha Morton, Thomas Haden Church e Willem Dafoe como criaturas irreconhecíveis. A bela princesa de Marte é vivida por Lynn Collins (também de Wolverine) com a força necessária, nunca se relegando ao papel de mocinha em perigo.

O protagonista, Taylor Kitsch, foi descoberto na série de TV Friday Night Lights e vem tendo uma carreira tímida. Este é o seu primeiro papel de grande destaque e ele tem uma interessante combinação de sex appeal e humor que contribui bastante com o papel, além de não se levar tão a sério. Seu figurino lembra um pouco Charlton Heston em O Planeta dos Macacos (1968), e este é apenas um dos filmes que passam pela cabeça durante os 132 minutos de exibição. Entre os lançamentos mais recentes estão Cowboys & Aliens (2011) e Avatar (2009), mas não se trata de uma cópia, apenas de referências.

John Carter – Entre Dois Mundos não parece ter criado muita expectativa nos Estados Unidos, muito menos no Brasil. E o orçamento anunciado de algo em torno de US$ 250 milhões será difícil de cobrir, o que pode transformar o longa em um fracasso retumbante. As poucas críticas já disponíveis, publicadas após a permissão da Disney, estão bem divididas, indo desde elogios ao grande filme-pipoca do ano a críticas a um pastiche que agradará apenas o público infantil. Não vamos a extremos, não é onde o filme está. Apesar de ter um final que fura sua própria lógica, trata-se de uma boa aventura, à moda antiga, que vale a conferida.

O diretor Stanton dá instruções a Kitsch

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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