Tite, Ademir, a história e as lições

Paulo Peixoto

A revelação do treinador da seleção masculina principal do Brasil, Tite, falando do atacante Ademir e elogiando a bola do rapaz foi uma dessas coisas inesperadas. Ninguém previa que ele estaria de olho no jogador do Galo. Ponto pro Ademir.

Eu gostei de o Tite ter falado isso. Afinal, Ademir vem precisando de estímulos para voltar a jogar com regularidade, como jogou no América. Penso que Ademir ainda será muito útil com Cuca de treinador. Oremos!

Muita gente torceu o nariz para a fala do Tite. 1) Porque não gosta do Ademir; e 2) porque não gosta / odeia / não tolera o Tite, depois da sua passagem pelo CAM.

Quanto ao ponto 1, é fato que Ademir teve boas chances com o Turco Mohamed e pouco aproveitou, embora tenha brilhado nos jogos contra o Flamengo no Mineirão. Ah, mas quem jogou bem e com regularidade neste ano no Galo? Nem o Hulk. Os gols que o Ademir perdeu, o Hulk também perdeu.

Ah, mas é claro que o Hulk tem um crédito danado e o Ademir não tem. Mas, cá pra nós, o Hulk já gastou todo o seu crédito. Ele e a Cia. inteira já estão em débito com o CAM. Todos precisam voltar a jogar bola com regularidade, e rápido.

O ponto 2 envolve uma questão que está no ar desde a segunda saída de Cuca do Galo, no final do ano passado. Trata-se de um contínuo tititi de que Tite pode voltar a treinar o Galo, qualquer dia após deixar a seleção brasileira.

Isso deixa alguns atleticanos com ar de revolta, porque Tite foi um dos treinadores naquele fatídico ano de 2005, quando caímos para a série B. Colocam na conta do Tite o rebaixamento. Treinador sempre leva a culpa, e deve ter, sim, a sua parcela de culpa. Mas, e o elenco que não jogou absolutamente nada naquele ano?

É bom lembrar que aquele ano do Galo começou no desastrado Campeonato Mineiro, sob o comando do experiente técnico Procópio Cardoso. Ficamos apenas em quarto lugar na fase de classificação e fomos eliminados pelo Cruzeiro na semifinal –que, por sua vez, perdeu o título para o Ipatinga.

Na fase de classificação, o que salvou foi a vitória de 2 a 0 sobre o Cruzeiro. O time daquele jogo foi: Danrlei, George Lucas, André Luiz, Henrique e Rubens Cardoso; Walker, Ataliba, Renato e Rodrigo Fabri; Euller e Quirino.

No primeiro jogo da semifinal, o time do Galo foi Diego Alves; George Lucas, André Luiz, Adriano e Rubens Cardoso; Ataliba, Amaral, Renato e Rodrigo Fabri; Edson Araújo e Fábio Jr.

No jogo da volta, mais mudanças: Henrique foi para a zaga no lugar de Adriano, Leandro Smith entrou no Lugar de Renato e, na frente, jogaram Prieto e Quirino. No decorrer do jogo entraram o volante Márcio Araújo e o atacante Marcelo Sá.

Com o fiasco, saiu Procópio e veio Tite, que pediu demissão duas vezes naquele ano. Na primeira, houve um pedido do novo diretor de futebol, Carlos Alberto Silva, para que ele reconsiderasse. Ele voltou, então, a comandar o time uma semana depois. Mas foi uma vez somente, no Mineirão, contra o Paysandu. O Galo só empatou, e a torcida cantou “Adeus, Tite”. Tite, então, se demitiu de vez, em agosto.

O time que Tite escalou naquele jogo contra o Paysandu foi Danrlei; Walker, Leandro Castan, Henrique e Rubens Cardoso; Zé Antônio, Rafael Miranda (Édson Araújo), Fábio Baiano e Rodrigo Fabri (Euller); Marques e Luís Mário (Renato).

Saiu Tite, com 25,5% de aproveitamento, em 17 jogos, e entrou Marco Aurélio, que teve 39,2% de aproveitamento, também em 17 jogos.

Marco Aurélio foi demitido após perder em casa para o Fortaleza, de virada. O time daquele jogo foi Diego; Rodrigo Dias (George), Cáceres, Marquinhos e Rubens Cardoso; Amaral, Vinícius (Catanha), Zé Antônio e Ramon (Rafael Miranda); Marques e Uéslei.

O último treinador do ano foi Lori Sandri, que teve 52,3% de aproveitamento em sete jogos.

Quando Lori assumiu, ele insistiu com o time anterior em três partidas. Obteve duas derrotas em casa e um empate fora. Na partida seguinte, a quarta, ele fez a mudança que muitos atleticanos esperavam que tivesse acontecido antes, que foi colocar para jogar os “meninos do Galo”.

Esse rótulo a equipe ganhou com a entrada de vários juniores nos últimos dias de campeonato. A garotada ficou invicta. Nas quatro partidas em que os garotos jogaram, eles ganharam três vezes e empataram uma.

O empate foi na partida derradeira, contra o Vasco de Romário, no Mineirão. Aquela partida decretou o rebaixamento. O time daquele jogo, no esquema 3-5-2, foi Bruno; Cáceres, Lima e Thiago Junio; Rodrigo Dias, Alicio, Rafael Miranda, Tchô (Rodrigo Silva) (Euller) e Rubens Cardoso; Renato e Pablito (Quirino).

O elenco de 2005 do Galo foi estranho demais. Marques já tinha 32 anos, e Euller, 34. E foi um entra e sai danado de jogadores. Tudo muito esquisito, mal planejado. Por isso sempre acho prudente refletir sobre o elenco antes de colocar apenas na conta de Tite o rebaixamento. E nunca podemos nos esquecer do papel da diretoria, claro.

Trago essa história à baila porque acho que o Galo de 2022 ensina um pouco sobre isso também. Se os jogadores não assumirem as suas responsabilidades, com confiança e entrega, a coisa pouco vai andar.

Mais de uma vez, Tite falou sobre uma espécie de dívida que ele sente ter com o Galo. Na semana passada, ele voltou a falar disso, quando soltou um “talvez” acerca de um eventual retorno.

Tite disse que a maturidade traz aprendizados, e é verdade. Isso deve valer para as duas partes, ou as três, se formos considerar os torcedores também.

Não estou aqui dizendo se o CAM deve ou não deve contratar Tite no futuro. O que estou dizendo é que o ocorrido em 2005 jamais deve ser usado como critério para contratar ou não contratar Tite. Os critérios de escolha devem ser outros.

Se fossemos levar a ferro e fogo, Cuca não teria retornado ao Galo em 2021 para se tornar o maior vencedor da história do CAM, já que parte da torcida o escorraçava pelos acontecimentos do final de 2013, na patacoada do mundial de clubes da Fifa.

Agora, o Galo segue aguardando as decisões de Cuca, ou da CBF, caso a instituição resolva convidar o treinador do Galo para substituir Tite na seleção. Em quatro meses é provável que tenhamos um desfecho sobre isso.

Até lá, o Galo de Cuca 3 precisa reagir forte para tentar buscar a vaga na Libertadores-2023. É o que nos resta esperar, acreditar e torcer. E, quem sabe, com Ademir comendo a bola depois dos elogios de Tite. Oremos!

Mas Cuca não pode perder de vista os meninos que o Galo têm atualmente e que estão pedindo passagem. Rubens é só um caso. Se os “medalhões” não estão entregando o que se espera deles, o banco de reservas pode ser uma boa terapia para alguns deles.

*Fotos: redes sociais do Atlético e Superesportes/DA (Tite)