Quem serve para treinar o Galo?

Ricardo Galuppo

A perda da liderança  e, depois, a queda para a terceira posição na tabela da primeira divisão do Brasileirão deixaram a massa em estado de desânimo profundo. Todos queríamos e esperávamos mais nesta altura do campeonato! Houve até mesmo um momento em que chegamos a acreditar num campeonato tranquilo — disputado apenas para comprovar a superioridade do Galo sobre os outros. Mas com o Atlético nunca é assim e esse sonho, como diria Chico Buarque, não passou de “ilusão passageira, que a brisa primeira levou”. 

Se fica uma lição disso tudo é que o time precisa ser mais esperto e deixar de cometer descuidos bobos caso queira ter de volta as duas posições que perdeu na tabela… Até aí, tudo bem. A questão é que o confronto com a realidade provocou uma mudança súbita no humor da torcida e pouca gente hoje em dia acredita ser possível subir esses dois degraus. E assim, o mesmo time, que dias atrás era visto pelos mais exagerados como candidato ao título mundial, deu meia volta e passou a ser apontado como um amontoado de pernas de pau, muito pior do que agremiações que dariam tudo para estar no lugar dele neste momento. 

O momento do Galo é, sem dúvida, complicado. Mas não tanto quando na hora em que Riascos partiu para a bola no dia 30 de maio de 2013 e Victor mudou a história numa fração de segundo A missão atual é difícil, mas o time tem mais tempo para virar o jogo a seu favor do que tinha no dia 5 de novembro de 2014. Aos 34 minutos do primeiro tempo, Everton, do Flamengaço Classificadaço marcou o gol que obrigaria o Galo a fazer outros quatro caso quisesse prosseguir na Copa do Brasil. E prosseguiu. A situação atual é difícil, mas talvez não fosse tanto se dois ingredientes que sobraram naquelas oportunidades não estivessem em falta. O primeiro é atitude. O outro, postura de campeão. 

NOVA MUDANÇA

Com 12 partidas (e 36 pontos em disputa) pela frente, há muita água para escoar por esse bueiro. Os dias de treinamento proporcionados por mais de uma semana sem jogos devem ser aproveitados para  corrigir os defeitos, claro. Mas também para mostrar aos jogadores a importância que esse título tem para a torcida. Se eles entenderem isso eu diria, como o saudoso Belchior, que “você não sente nem vê, mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo, que uma nova mudança em breve vai acontecer”. 

Por que essa manifestação de otimismo num momento em que tudo aponta para direção oposta? Em primeiro lugar, porque eu acredito. Em segundo lugar porque a tabela nesta reta final parece mais favorável a nós do que aos adversários. E, finalmente, porque o desdém que outros fingem ter pelo Galo mal consegue esconder o medo de que o trabalho prossiga e renda os frutos que, mais cedo ou mais tarde, renderão os frutos que serão colhidos pela massa. 

Reconhecer que dias melhores virão não significa fechar os olhos para os problemas nem fingir que está tudo bem. Não está. Os altos e baixos justificam as críticas e dão razão ao desânimo que tomou conta de parte da torcida. Isso é uma coisa. Outra, muito diferente, é ignorar a mudança positiva que houve na maneira do Atlético lidar com o futebol.

Sampaoli é parte importante nesse processo e ainda tem muito a contribuir com o Galo. Sigo achando o argentino competente. Ele sabe o que está fazendo e, quando chegar a hora de ir embora (que ainda não é agora), deixará o Galo muito melhor do que encontrou. Talvez até com algumas conquistas que outros não foram capazes de proporcionar nos últimos anos. Quem sabe? 

QUIXERAMOBIM

É mais difícil defender o trabalho do gringo agora do que era no momento em que suas invenções davam certo em campo. Afirmo, porém, que nenhum treinador do mundo é capaz de passar pelo Galo sem ouvir cornetadas de parte da torcida. Se Pep Guardiola, do Mancester City, ou Zinédine Zidane, do Real Madrid, chegassem hoje para comandar o Galo, ia ter corneteiro dizendo que eles não de nada e que Fulano de Tal, que fez uma Copa do Nordeste brilhante pelo Quixeramobim, é muito mais qualificado. 

(Não vai aqui nenhum preconceito contra Quixeramobim. Até porque, torcedor de time que saiu da Copa do Brasil desde ano pelas mãos do Afogados, de Afogados da Ingazeira, não tem direito de desmerecer equipes do interior nordestino. Mas quem quis entender, entendeu: a crítica não é aos clubes, mas aos que reclamam até do que está certo.)

SALVADORES DA PÁTRIA

Há que se ter paciência com os mais exaltados e reconhecer que a síndrome de abstinência por títulos justifica as reações mais impacientes de atleticanos que, nas últimas décadas, viram títulos que pareciam ganhos escapar entre seus dedos. Mas daí a defender, como já andei escutando, que o treinador Lisca, que faz um bom trabalho à frente do América, é melhor do que o argentino, com todo respeito, só pode ser delírio! 

Lisca é um profissional adequado ao porte e às pretensões do clube que dirige — que se firma cada vez mais como a segunda força do futebol mineiro. Mas ainda a uma boa distância do Galo. Mas não é difícil imaginar o que teria acontecido com ele caso tivesse assumido o comando do Atlético depois da queda de Rafael Dudamel (que nunca deveria ter vindo treinar o Galo, mas, já que veio, felizmente ficou pouco tempo). 

Sampaoli tem mais estofo. Seu trabalho, porém, precisa apresentar resultados à altura das exigências que ele faz. Mesmo com toda oscilação, o saldo até aqui é positivo. A verdade, porém, é que o Atlético tem demonstrado, ao longo de sua história recente, uma certa incompatibilidade com o trabalho de técnicos consagrados. Muitos medalhões já chegaram ao clube com fama de salvadores da pátria, com um olhar de quem entende mais de futebol do que qualquer outro ser humano sobre a face da terra, e foram embora pelas portas dos fundos — deixando atrás de si um cenário mais devastado do que encontraram. 

Me lembro especialmente de Rubens Minelli. Treinador conceituado, com fama de bom comandante, havia sido um dos responsáveis por transformar em vinagre o chope que o atleticano havia reservado para comemorar títulos que estavam em suas mãos. Era ele que, já campeão brasileiro em 1975 pelo Internacional, estava no túnel do Beira Rio em 1976, quando seu clube derrotou o Galo na semifinal do brasileirão. No ano seguinte, 1977, comandou o São Paulo na campanha em que seu clube se sagrou campeão com 13 pontos a menos do que o Atlético, que foi o vice. 

Contratado em 1984, Minelli fez no Galo um trabalho tão medíocre que matou a torcida de raiva e foi embora antes de completar uma temporada. Não se trata de um caso isolado. Em sua história recente, o Atlético contratou uma penca de treinadores que até fizeram algum prestígio em outros clubes. Mas que, no comando do Galo, se revelaram “um pote até aqui” de mediocridade. 

SAI, AZAR!

Valdir Espinosa chegou em 1994, no natimorto projeto da tal de “Selegalo”, que reuniu no Atlético um bando de mercenários em fim de carreira. Não conseguiu e nem fez força para reproduzir as conquistas que obteve à frente de clubes que já havia treinado. Pelo túnel atleticano já passou gente como Abel Braga, o falecido Mário Sérgio e Vanderlei Luxemburgo — ótimos na hora de dar entrevistas elogiando o próprio trabalho, mas péssimos para montar uma equipe. Dá até medo pensar que Paulo Autuori e Oswaldo Oliveira foram outros que estiveram por lá… (Esconjuro, pé de pato, mangalô, três vezes… a simples menção aos nomes desses senhores já causa arrepio e urticária!)

Há casos, senão piores, tão ruins quanto esses. Causa asco lembrar que por lá também passou um enganador do quilate de Carlos Alberto Parreira, a prova viva de que um sujeito inepto pode triunfar no mundo do futebol. Também não é bom lembrar de outro enganador ainda mais bem acabado do que ele: o embusteiro Tite. Esse aí se expressa com a falsa erudição dos que tentam esconder atrás de palavras bonitas a incapacidade de escalar e treinar um time minimamente competitivo. Mas tem quem goste. Fazer o que?

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Às terças-feiras, os textos do escritor Ricardo Galuppo estarão disponíveis às 06:30 e 13:13h. Sendo o segundo complementar ao matutino.