Brats revisita a geração de atores oitentistas

Resolver um trauma de grupo quase 40 anos depois. Essa parece ser a razão de Andrew McCarthy ter se aventurado na direção de um longa-metragem depois de ter comandado episódios de diversas séries de televisão. Brats (2024), documentário do Hulu disponível no Disney+, revisita uma turma famosa dos anos 80 para conferir como cada um lidou com o apelido atribuído.

Em 1985, o jornalista David Blum ia escrever para a revista New York um perfil do ator em ascensão Emilio Estevez, visto como um dos grandes talentos da época. Estevez o convidou para sair com uns amigos, Rob Lowe e Judd Nelson, e Blum acabou tendo a ideia de transformar a matéria num panorama de toda aquela geração de atores. Numa referência à turma de Frank Sinatra, o Rat Pack, o jornalista apelidou a turma de Brat Pack – logo no título. E a alcunha negativa pegou, colocando um grupo totalmente heterogêneo sob uma sombra de irresponsáveis e festeiros. Teria o apelido arruinado carreiras?

Essa é uma pergunta que McCarthy, um dos “brats“, busca responder. 1985 foi o ano do lançamento de dois filmes considerados emblemáticos para aquela geração: O Primeiro Ano do Resto de Nossas Vidas (St. Elmo’s Fire) e O Clube dos Cinco (The Breakfast Club). Estevez, Nelson e Ally Sheedy estão no elenco de ambos, e vários outros atores estão envolvidos em ao menos um deles. Uma amizade começou a se formar entre eles e era comum que contracenassem em outras produções.

O Primeiro Ano do Resto de Nossas Vidas, dirigido por um Joel Schumacher em início de carreira, traz Estevez, Nelson, Sheedy, McCarthy, Lowe, Demi Moore e Mare Whinningham como um grupo de amigos da escola que busca seu caminho na vida adulta. Incrivelmente chato, com uma trilha sonora genérica e estrelado por personagens canalhas e antipáticos, o filme foi um sucesso de bilheteria, muito devido ao carisma de seu elenco.

Com O Clube dos Cinco, a conversa é diferente: considerado um dos melhores filmes dos anos 80, ele faturou alto nas bilheterias e teve boas críticas. Além do bom elenco, que traz Estevez, Nelson, Sheedy, Anthony Michael Hall e Molly Ringwald, o longa tem a assinatura do produtor, roteirista e diretor John Hughes, o Midas das comédias da época – lembra de Ferris Bueller? Alguém?

Em Brats, McCarthy faz um roteiro simples que simplesmente costura encontros com os ex-colegas. Em vários casos, os atores não se veem há décadas, desmistificando a ideia que o público pode ter de que são todos amigos. Em grande parte, isso se deve à matéria de Blum: eles passaram a se evitar para tentar fugir da fama negativa recém adquirida. Sheedy, num momento sincero e triste, conta que havia começado a se sentir parte de uma família, e tudo aquilo acabou.

Com uma montagem ágil, que não se demora por onde passa, o documentário faz uma investigação ao mesmo tempo em que leva o diretor a revisitar lugares e pessoas queridas, mesmo que por um curto período do passado. É possível perceber o carinho que essas pessoas têm umas pelas outras (com poucas exceções) e é no mínimo nostálgico acompanhar McCarthy nessas viagens. São vários rostos que foram muito famosos, mas não devem ser facilmente reconhecíveis pelos jovens de hoje.

É importante mencionar, a título de curiosidade, que os membros desse “grupo” variam de acordo com o ponto de vista de quem analisa, já que isso é tudo informal. Vários atores dividem a cena em diversas produções com os nomes citados e podem ser incluídos na lista. Até Tom Cruise, de filmes como Toque de Recolher (1981) e Vidas Sem Rumo (1983), pode aparecer nessa história, tendo atuado com outros brats. Para quem se interessar pelo Brat Pack, ficam outras recomendações, além dos já citados:

– Uma Questão de Classe (Class, 1983): McCarthy é o aluno novo, meio bobão, que é empurrado pelo colega descolado (Lowe) para se enturmar com as mulheres, tendo uma consequência engraçada;

– Gatinhas e Gatões (Sixteen Candles, 1984): estreia na direção do então roteirista John Hughes, o filme acompanha a adolescente Samantha (Ringwald) descobrindo o amor, ou ao menos a paixão, quando se interessa por um veterano bonitão (Michael Schoeffling) ao mesmo tempo em que é o alvo das investidas de um calouro nerd (Anthony Michael Hall);

– Uma Aventura em Oxford (Oxford Blues, 1984): Lowe é o americano que quer ir para a Inglaterra atrás da mulher de seus sonhos e, para conquistá-la, precisa se destacar na equipe de remo da universidade;

– Mulher Nota Mil (Weird Science, 1985): dois amigos nerds rejeitados na escola (Hall e Ilan Mitchell-Smith) se unem para criar uma mulher perfeita no computador, dando vida à sobrenatural Kelly LeBrock;

– A Garota de Rosa-Shocking (Pretty in Pink, 1986): Andie (Ringwald) segue feliz na sua vidinha simples, com os amigos da loja de discos e o pai protetor (Harry Dean Stanton), até que se apaixona pelo riquinho da escola (McCarthy) e precisa enfrentar uma luta de classes;

– Abaixo de Zero (Less Than Zero, 1987): Clay (McCarthy) saiu da cidade para ir para a faculdade e volta no Natal, reencontrando a ex-namorada (Jami Gertz) e o amigo (Robert Downey, Jr.), ambos drogados e decadentes.

PS: caso você esteja tentando se lembrar de onde conhece Andrew McCarthy, vou ajudar: Um Morto Muito Louco (Weekend at Bernie’s, 1989), comédia maluca em que dois funcionários são convidados pra um final de semana na casa de praia do chefe e encontram o sujeito morto. Bobo e divertido na mesma medida.

Outra recomendação, fugindo um pouco da turma, é Young Guns – Jovens Pistoleiros, encabeçado por Estevez

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

Recent Posts

Celebre a carreira de John Williams com documentário

O Disney+ lançou Music by John Williams, documentário que O Pipoqueiro já conferiu e comenta…

6 dias ago

Halloween Especial 2024

O Pipoqueiro preparou um pacote de filmes de terror ou suspense para este Halloween e…

3 semanas ago

Agatha e Pinguim representam disputa Marvel X DC

Confira o resultado de uma hipotética disputa entre DC e Marvel, já que ambas as…

2 meses ago

Shyamalan parte II: o plot twist

Confira a segunda parte do especial do Pipoqueiro para M. Night Shyamalan, com um punhado…

2 meses ago

M. Night Shyamalan: sua Armadilha e sua carreira

Armadilha, mais recente longa de M. Night Shyamalan, chegou aos cinemas há pouco e O…

2 meses ago

Tirando o atraso dos blockbusters

O Pipoqueiro traz comentários rápidos sobre cinco arrasa-quarteirões que chegaram aos cinemas recentemente, ressaltando o…

3 meses ago

Thank you for trying AMP!

We have no ad to show to you!