Um rapaz calado e inteligente, de origem humilde, em meio a colegas abastados, se aproxima do sujeito popular e simpático buscando uma entrada na turma e eles acabam ficando amigos e frequentando a alta roda juntos. Enquanto um amigo do riquinho desconfia do recém-chegado, os pais do rapaz o recebem de braços abertos. Eu poderia estar falando de Tom Ripley, personagem de Patricia Highsmith vivido por Matt Damon (em O Talentoso Ripley, 1999) e Alain Delon (em O Sol Por Testemunha, 1966), entre outros, mas trata-se de Oliver, o protagonista de Saltburn (2023), longa disponível no Amazon Prime Video.
Cabia à diretora e roteirista Emerald Fennell a difícil missão de seguir sua premiada estreia, Bela Vingança (Promising Young Woman, 2020), pelo qual ela levou o Oscar de Melhor Roteiro Original e indicações a Melhor Filme e Melhor Direção. Buscando tratar de um tipo de gente difícil de gostar, como disse em entrevistas, Fennell queria que o público se afeiçoasse a eles, mostrando-os como privilegiados, mas tirando o glamour daquela vida tranquila em uma mansão no campo.
A escolha pelo ator principal era a chave para o sucesso do filme, e se mostrou bem acertada: Barry Keoghan (de Os Banshees de Inisherin, 2022) passa muita segurança em todos os momentos, abraçando as nuances de seu personagem e as esquisitices do roteiro. Dando suporte, temos Jacob Elordi (de Euphoria e os três A Barraca do Beijo), ótimo como o jovem mimado que em nenhum momento fica estereotipado. Pelo contrário, ele é exatamente o cara que todos na faculdade gostam, agradável e agregador, mesmo tendo tudo o que quer à mão.
Os pais milionários de Felix são a cereja do bolo: pessoas absolutamente detestáveis, que se cobrem com uma aura de beneficentes e refinados para esconder todos os preconceitos e julgamentos que fazem constantemente, tratando todos como inferiores e indignos. Richard E. Grant, visto recentemente em Loki, é o típico aristocrata inglês que parece viver em outro planeta, cuja principal preocupação é o cultivo de orquídeas. Rosamund Pike (de Eu Me Importo, 2020), a mãe, é o bibelô do marido, mais nova, linda e fútil, que leva pessoas para casa para cuidar delas e posar de salvadora, mas logo se cansa e as dispensa.
Entrando nesse universo, Oliver vira a atração. Mesmo mais erudito ou esperto que os demais, ele não se veste da maneira “certa” e é visto quase como um animal de estimação. Quando todos em volta são falantes e gostam de se gabar, Oliver é discreto e observador. Mede suas palavras, se mostrando bem calculista, o outro lado da mesma moeda. Com essa fauna, Fennell faz suas críticas à elite, que tem quadros valiosíssimos na parede e nem se importa – num fantástico trabalho de design de produção e com um figurino que ressalta os aspectos da primeira década dos anos 2000. E a trilha sonora combina bem, seja com as composições originais ou com sucessos como Rent, dos Pet Shop Boys, ou Mr. Brightside, de The Killers.
Muito melhor que um Triângulo da Tristeza (Triangle of Sadness, 2022), por exemplo, só para citar uma sensação do ano passado que fazia críticas similares, Saltburn tem suas estranhezas, mas funciona satisfatoriamente. Um bom elenco e diálogos bem escritos entregam a mensagem. Depois da grande vitória no Oscar de Parasita (Gisaengchung, 2019), também sobre luta de classes, laureado como Melhor Filme, Direção, Roteiro Original e Filme Internacional, é de se esperar que esse longa tenha uma boa carreira nas premiações dessa temporada.
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Eu gostei bastante de Bela Vingança.
Acho que verei esse, gosto de histórias assim.