As Marvels, de maravilhoso, não tem nada

Muito tem se falado de uma tal fadiga dos filmes da Marvel: as pessoas estariam se cansando dos heróis desse universo tamanho o número de filmes e séries.  E tudo acaba se embolando, já que você precisa ver tudo para entender a próxima atração, quase como num esquema de pirâmide do entretenimento. A verdade é que o problema de As Marvels  (The Marvels, 2023) é o próprio filme: o roteiro é o mais genérico possível, as situações são descabidas, a lógica que o próprio filme cria é desrespeitada o tempo todo e a direção não tem um pingo de personalidade, parecendo apenas mais um produto Marvel padrão.

Não dá para entender porque contratar Nia DaCosta para a direção. Os estúdios Marvel sabem de onde estão saindo, para onde estão indo e como deve ser conduzida essa jornada. Uma diretora com personalidade, que tem chamado bastante a atenção e lançou recentemente o ótimo A Lenda de Candyman (Candyman, 2021) não seria a melhor escolha – para ela, principalmente, já que teria que obedecer ao invés de conduzir. Ela está entre as várias mãos que assinam o roteiro, mais do que as que foram creditadas, contando inclusive com o pessoal que anda participando das salas de roteiros das séries. Ou seja: pouco do que DaCosta havia planejado inicialmente chegou à versão final.

As três protagonistas da trama já são conhecidas do público, caso tenham assistido às obras anteriores, que as apresentaram. A Capitão Marvel, também chamada de Carol Danvers (vivida por Brie Larson), é a única que teve seu próprio filme de origem, além de ter feito outras participações especiais. A jovem Ms. Marvel, ou Kamala Khan (Iman Vellani), teve uma série com seu nome para contar sua história. Só Monica Rambeau (Teyonah Parris) entra em desvantagem: além de não ter uma alcunha de guerra, não teve seu passado muito explorado. A Marvel se contentou em colocá-la na série WandaVision, quando adquiriu seus poderes por ter tido contato com a Feiticeira Escarlate. Poderes esses que nunca ficam muito claros.

A semelhança entre os poderes das três faz com que elas troquem de lugar toda vez que o usam, o que nunca fica bem explicado ou mesmo possamos entender a regra. E esse é um dos grandes problemas desse As Marvels: ele não segue a lógica interna, tudo acontece por conveniência. Toda questão a ser resolvida é assustadoramente fraca, apresentando conflitos impensáveis até para novelas da Record. A vilã (Zawe Ashton, de Velvet Buzzsaw, 2019) não tem um pingo de expressão e se resume a fazer caretas. Ao final, a dúvida que fica é: por que mesmo esse filme foi feito?

Nada em As Marvels é memorável. Talvez um ponto a ser ressaltado seja a participação de Vellani, engraçada e carismática sem cair no ridículo. Sua família aparece de forma comedida, mesmo com seus costumes, sem o humor exagerado de Besouro Azul (Blue Beetle, 2023), que trazia mexicanos saídos de uma comédia do Leandro Hassum. Larson consegue mostrar mais simpatia que anteriormente, mas a serviço do pior roteiro da Marvel – talvez em empate técnico com Thor: Amor e Trovão (Thor: Love and Thunder, 2023).

O personagem que mais aparece em produções dos estúdios Marvel, Nick Fury, marca presença, mais uma vez vivido por Samuel L. Jackson, mas não tem muito o que fazer e não chega a lugar nenhum (como em Invasão Secreta). A cena no meio dos créditos acena para algo que todos esperamos e que deve levar ao futuro do Universo Cinematográfico Marvel. Talvez, com menos produções ao ano, voltemos a ter algo que preste dessa turma.

Dar-Benn conseguiu ser uma das mais inexpressivas vilãs do MCU

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

Recent Posts

Michael Keaton faz dose dupla de pais ausentes

Em um curto intervalo, Michael Keaton curiosamente estrelou dois longas sobre pais ausentes: Pacto de…

2 dias ago

Conheça a carreira do talentoso Ripley no Cinema

Muita gente que viu a série Ripley não conhecia bem o personagem e O Pipoqueiro…

6 dias ago

Oscar 2025 – Indicados e Previsões

Como acontece todos os anos, há mais de uma década, O Pipoqueiro traz os indicados…

2 semanas ago

Oscar 2025 – Um Completo Desconhecido

Outro indicado ao Oscar 2025, Um Completo Desconhecido apresenta um curto momento da vida de…

2 semanas ago

Oscar 2025 – O Brutalista

Com dez indicações ao Oscar 2025, O Brutalista é um dos destaques da temporada de…

2 semanas ago

Admirável Mundo Novo estreia outro Capitão América

Admirável Mundo Novo é a primeira aventura de Sam Wilson como o novo Capitão América…

4 semanas ago

Thank you for trying AMP!

We have no ad to show to you!