Nicolas Cage lida com o peso de seu talento

Nicolas Cage sabe rir de si mesmo, isso ninguém pode negar. O ator é frequentemente criticado por fazer filmes demais, e muitos de baixíssima qualidade. A culpa seria de seu alto custo de vida, e ele é dado a excentricidades caríssimas. Cage resolveu abraçar tudo o que o senso comum diz dele e o resultado é O Peso do Talento (The Unbearable Weight of Massive Talent, 2022), longa que estreia essa semana nos cinemas disputando espaço com o recém chegado Doutor Estranho no Multiverso da Loucura. Coincidentemente, a Marvel ganha uma cutucada num diálogo. E ele propositalmente deixa de mencionar as terríveis aventuras do Motoqueiro Fantasma.

Chegando a lançar um absurdo de seis filmes em um mesmo ano, o que ele fez algumas vezes, Cage recentemente tem procurado mais qualidade em suas produções. Talvez por isso, viu com bons olhos a oportunidade de fazer graça com sua persona de astro do Cinema. É importante ressaltar que trata-se de uma obra de ficção. Partir da realidade não significa que nada daquilo seja verdade. Muito pelo contrário, o roteiro da dupla Tom Gormican e Kevin Etten (parceiros em Namoro ou Liberdade, 2014) segue pelo caminho da paródia, fazendo várias referências a filmes passados e famosos do ator.

A versão ficcional de Nick Cage está se divorciando, não consegue se comunicar com a filha adolescente e, para piorar, está devendo muito dinheiro. Todo trabalho que aparece é “um ótimo papel”, algo que vá representar a volta dele. Mesmo que ele não tenha ido a lugar nenhum. O agente dele, Fink (Neil Patrick Harris, de Matrix 4, 2021), traz então a mais recente oferta: ganhar um milhão de dólares para participar do aniversário de um grande fã espanhol, o empresário Javi (Pedro Pascal, de Mulher-Maravilha 1984, 2020). Cage titubeia, mas as contas estão batendo à porta.

A forma como o roteiro parece conversar com o público é bem interessante. Chega quase a ser um metarroteiro, por citar situações e logo em seguida usá-las em seu próprio andamento. Isso cria momentos inusitados, sempre brincando com a imagem de Cage. O cumprimento, com uma mão aberta e outra fechada, parece uma excentricidade tirada dos tatames de artes marciais. A forma como a amizade com Javi é desenvolvida flui muito bem e serve ainda para mostrar a solidão que uma estrela do quilate de Cage vive. Passado o jet lag, ele rapidamente se apega ao novo amigo e entra de cabeça nas empreitadas propostas.

O fato de Javi ser um grande fã de Cage possibilita uma pancada de citações a produções antigas dele, gerando mais piadas espirituosas. E a suposta mania de grandeza de Cage já começa no título original, que joga com um clássico da literatura, A Insustentável Leveza do Ser, e termina fazendo um autoelogio. Por incrível que pareça, ele nem menciona o Oscar de Melhor Ator que levou por Despedida em Las Vegas (Leaving Las Vegas, 1995). O que prova que ele não queria contar vantagem de verdade, era só faz de conta. Mas o talento é genuíno.

Nick Cage mostra, mais uma vez, que realmente tem muito talento

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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