Shyamalan estraga férias familiares em Tempo

O diretor e roteirista M. Night Shyamalan é famoso por seus roteiros intricados e finais surpreendentes. O problema é que essa surpresa não necessariamente é boa. Ao mesmo tempo em que nos deixou de boca aberta com O Sexto Sentido (The Sixth Sense, 1999), fez muita gente passar raiva com Fim dos Tempos (The Happening, 2008), para ficar nos exemplos mais extremos. Tempo (Old, 2021) é a mais nova produção do cineasta e não deve fugir à regra: muitos vão amar, outros tantos vão odiar.

Desde o conceito, Tempo é intrigante: o trailer e o cartaz deixam claro que se trata de uma história passada numa praia onde se envelhece mais rápido. Duas famílias chegam nesse lugar, indicado pelo gerente do resort onde passam férias, e começam a observar o fenômeno da passagem de tempo acelerada. Qual pai ou mãe, numa determinada situação, nunca imaginou como seria se seus pequenos fossem maiores? Pois Shyamalan faz isso acontecer.

Como de costume quando se envolve o nome do diretor, quanto menos se contar sobre a trama, melhor. Em alguns filmes, ele se importa em dar uma explicação, por mais fantástica que seja. Em outros, apenas deixa tudo no ar, mais preocupado com o desenrolar do que com os porquês. Às vezes, não é preciso explicar, basta um salto de fé, como em Corpo Fechado (Unbreakable, 2000), que acabou dando início a uma trilogia (muito boa, por sinal!).

Uma especialidade de Shyamalan é pegar algo corriqueiro, do dia a dia, e tirar terror da situação. Como em férias num lugar paradisíaco. Em Tempo, ele não parte de um conceito original, mas da graphic novel Sandcastle (ou Castelo de Areia), de Frederik Peeters e Pierre-Oscar Lévy. Ele a adapta e a expande, criando o antes e o depois, além de mexer em alguns personagens. Pode-se gostar ou não dos rumos tomados, mas não dá para negar que o sujeito é criativo. Quanto menos expectativa o público criar, melhor, já que isso costuma ser um problema. Não gostar de uma obra por ela não ter sido o que se imaginou não é justo com ela. E nem com o artista por trás dela.

Por todas as razões listadas, o nome de Shyamalan no cartaz costuma chamar bastante atenção. Mas temos ainda outras figuras interessantes que merecem nota. Em uma das famílias, temos à frente Gael García Bernal (de Wasp Network, 2019) e Vicky Krieps (de Trama Fantasma, 2017), dois atores muito competentes que se passam bem por pessoas comuns, sem uma aura de astros. E Rufus Sewell (de Meu Pai, 2020) consegue construir um personagem rico, mesmo com pouco tempo de cena. O elenco funciona bem, fazendo com que nos importemos com eles. O que aumenta a nossa aflição.

Como de costume, o cineasta faz uma participação: ele é o motorista

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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